Tesouro estuda emissão de títulos públicos com 'selo ESG'
Aderir à agenda sustentável irá aproximar o Brasil dos objetivos da ONU e atrair investidoresem busca de mais transparência
Estadão Conteúdo
Publicado em 2 de fevereiro de 2021 às 13h19.
Última atualização em 2 de fevereiro de 2021 às 13h33.
O Tesouro Nacional deu o pontapé inicial para colocar o Brasil no mapa das emissões de títulos públicos com atestado de boas práticas nas áreas ambiental, social e de governança (conhecidas pela sigla ESG).
Os três temas têm sido cada vez mais foco de atenção globalmente. Por isso, o governo brasileiro começou a mapear despesas do Orçamento que se enquadram nesses tópicos para atrair os investidores estrangeiros, que nos últimos anos reduziram drasticamente suas posições em mercados emergentes, incluindo o Brasil.
O ingresso nesse mercado é considerado estratégico porque o mundo vive um momento de grande oferta de recursos, ao mesmo tempo que investidores têm cobrado cada vez mais um compromisso firme com a pauta ESG - já existem fundos que aplicam seus recursos exclusivamente nesse tipo de ação. Até agora, 22 países fizeram emissões de títulos públicos ligados ao "selo", número que tende a crescer rapidamente nos próximos meses. Se o Brasil demorar a aderir a essa agenda, pode perder o bonde.
Outra vantagem é que esses papéis costumam ter custo menor para o emissor, já que o investidor se dispõe a receber menos juros em troca de financiar ações sociais, ambientais ou para melhorar a governança de um país.
A decisão do Tesouro de iniciar a construção de um arcabouço para emitir títulos ligados à temática ESG foi anunciada na quinta-feira. Em entrevista ao Estadão/Broadcast, o subsecretário da Dívida Pública do Tesouro Nacional, José Franco de Morais, afirmou que ainda há um longo caminho a ser percorrido. Há chance de uma primeira emissão de bônus soberano relacionada à pauta ESG ocorrer ainda em 2021, mas não há garantia sobre isso. "A construção do arcabouço não é um processo de curto prazo."
Amazônia
O anúncio vem num momento em que o mau desempenho brasileiro em ações contra queimadas e o desmatamento na Amazônia entrou na mira de investidores internacionais e governos de outros países. Dados do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe) divulgados no início de 2021 mostram que os alertas de desmatamento na Amazônia nos dois primeiros anos do governo Jair Bolsonaro foram, em média, 82% superiores à média do registrado nos três anos anteriores.
Para Franco, o compromisso do governo brasileiro com a temática ESG vai servir a três frentes: mostrar o que o País tem de positivo, ser transparente em relação ao que há de negativo e ajudar a cumprir os objetivos de desenvolvimento sustentável estabelecidos pela Organização das Nações Unidas (ONU) por meio da Agenda 2030.
"O Brasil tem muitas coisas boas para mostrar. A matriz energética brasileira é majoritariamente energia limpa. É um exemplo. Agora, realmente, a reputação pode melhorar muito. Os investidores sentem falta de informações", afirma o subsecretário. "Nosso papel é juntar todos esses argumentos para levar aos investidores, aumentando a transparência. Quando a notícia não é boa, explicar o que o País está fazendo para melhorar determinado indicador."
Segundo Franco, a equipe da dívida pública já atua hoje como um "facilitador" de conversas entre investidores ou agências de classificação de risco e outras áreas do governo, mas a adesão à pauta ESG tende a ampliar esse papel. O coordenador-geral de Planejamento Estratégico da Dívida Pública, Luiz Fernando Alves, diz que os investidores passarão a olhar o Tesouro como um "ponto focal" para essas temáticas. "Muitas vezes não teremos as respostas, mas nosso papel é buscar aquela área dentro do governo e trazer a informação."
O órgão dedicou um capítulo de seu Plano Anual de Financiamento (PAF), documento que mostra a estratégia do Tesouro para a dívida pública, à apresentação de suas intenções em aderir à agenda sustentável. As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.