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Após primeiro mandato polêmico, especialistas debatem o que podemos esperar da atuação ESG do próximo governo de Donald Trump (Logan Cyrus/AFP)
Repórter de ESG
Publicado em 6 de novembro de 2024 às 17h40.
Última atualização em 7 de novembro de 2024 às 13h10.
A vitória do candidato Donald Trump às eleições presidenciais nos Estados Unidos, após conquistar os 270 votos eleitorais necessários, tem estimulado discussões entre especialistas em meio ambiente, diversidade e inclusão.
Depois de um primeiro mandato polêmico - marcado por reviravoltas no histórico ambiental do governo anterior, de Barack Obama -, o setor tem buscado compreender como o segundo mandato do republicano vai orientar a atuação ESG dos Estados Unidos.
Dentre as promessas de Trump, focadas sobretudo na melhoria econômica e na contenção da inflação, estão a redução no preços de energia e eletricidade pela metade, motivada pelo uso de combustíveis fósseis. No entanto, um estudo da consultoria ambiental Carbon Brief aponta que a vitória de Donald Trump e o seu incentivo a economia tradicional poderiam acarretar um aumento de 4 bilhões de toneladas de emissões de CO2 nos EUA até 2030.
Kamila Camilo, fundadora do Instituto Oyá e conselheira dos institutos Igarapé e Talanoa, conta que a expectativa é o fortalecimento de indústrias intensivas em carbono a partir do suporte do presidente eleito às companhias óleo, gás e petrolíferas, apesar da alta de energias renováveis durante seu último mandato.
A crença de que o novo governo adote majoritariamente práticas sustentáveis é baixa, mas, segundo Camilo, depende principalmente de outro fator: o dinheiro. “O Trump é muito orientado pelo mercado e pelo lucro. Se conseguirmos fechar a conta da sustentabilidade e do ESG, ele vai pender para onde é mais lucrativo”, disse.
No setor corporativo, Camilo vê uma possibilidade de retrocesso na atuação criada pelas empresas nos últimos anos, como as práticas ESG atreladas aos resultados financeiros. “Algumas dessas decisões, entendo que são irreversíveis. Outras podem ser atrasadas, desaceleradas ou perder investimentos”, conta.
Para a especialista, o movimento negacionista que tomou conta do Senado americano tem grandes chances de se reverberar ao Congresso também. Isso pode dificultar avanços para os direitos humanos, como os direitos reprodutivos. “Isso reverbera para outras culturas, que seguem as tendências estadunidenses”, explica.
Maurício Pestana, jornalista especializado em diversidade e fundador da Revista Raça, acredita que o cenário de inclusão de mulheres, pessoas negras e a população LGBTQIAP+ pode sofrer um retrocesso, baseado no primeiro mandato do presidente eleito.
No entanto, a base de votos diversos de Trump pode mudar a atuação do partido republicano em busca de maior representatividade. “Grande parte do eleitorado que poderia sofrer por políticas de repressão votou pelo Trump. Por isso, o Partido Republicano pode se comprometer em reconhecer esse eleitorado”, explica.
Apesar da campanha do presidente eleito ainda contar com políticas anti-imigração, a presença e o eleitorado latinos podem influenciar nas decisões do presidente.
Para Yuri Rugai Marinho, diretor da ECCON Soluções Ambientais e advogado especializado em direito ambiental, no curto prazo, é possível que alguns setores da economia sejam aquecidos pela política trumpista, com benefícios especialmente para empresas americanas.
“As promessas de reduzir tributação de empresas, não aumentar salários, reduzir taxas de empréstimos, aumentar taxação de importações da China e cortar gastos do governo pode aquecer o mercado”, explica.
Já no longo prazo, áreas econômicas podem ser prejudicadas tanto pelos efeitos do clima quanto pelo impacto de sua reputação ambiental, já que, para o especialista, soluções climáticas devem ser desaceleradas. “O agronegócio, provavelmente, será um dos mais impactados, já que depende de uma regularidade no clima”, disse.
Em 2019, a pedido de Trump, os Estados Unidos anunciaram a saída do Acordo de Paris, principal tratado internacional sobre o enfrentamento às mudanças climáticas. Assinado em 2015, o acordo oficializado por 195 países buscou estabelecer o comprometimento das nações com a redução das emissões de carbono até 2050.
Na época, o presidente afirmou que os termos do Acordo de Paris eram “injustos” para a economia americana, uma das maiores responsáveis por emissões no mundo. A saída foi oficializada em novembro de 2020, mas a decisão foi revertida em janeiro de 2021, quando Joe Biden assumiu a presidência.
Anteriormente, em 2017, Donald Trump assinou uma ordem executiva que anulava a Lei Nacional de Política Ambiental, uma política americana que exige a aprovação de agentes federais antes da implementação de projetos que podem gerar impactos climáticos, como a instalação de rodovias e óleodutos.
A justificativa foi que a lei atrasava o desenvolvimento de setores importantes para economia americana, como a mineração e engenharia urbana.
A chamada Lei das Espécies Ameaçadas, que garantia o status de proteção para espécies em risco de extinção, também foi impactada durante a gestão. Os efeitos das mudanças climáticas também deixaram de ser considerados na avaliação da biodiversidade. Animais como os lobos-cinzentos e os carcajus, que viviam uma redução significativa na sua população, deixaram de ser incluídos na lista de espécies ameaçadas.
Na área social, um dos principais marcos do governo Trump foi a construção do muro entre os Estados Unidos e o México. O objetivo foi limitar a entrada de imigrantes ilegais no país a partir da fronteira. Entre as barricadas de metal, cercas, estacas de concreto e aço, foram construídos ou reformados mais de 700 quilômetros de obras – cerca de 22% dos 3.142 quilômetros de extensão dividida entre EUA e México.
O governo Biden seguiu com a instalação de mais 32 quilômetros, uma vez que a verba para a instalação já havia sido aprovada pelo Congresso Americano. Por lei, a gestão Biden precisava usar o dinheiro para a construção.