ESG

Apoio:

logo_unipar_500x313
logo_espro_500x313
Logo Lwart

Parceiro institucional:

logo_pacto-global_100x50

Gás, renováveis e nuclear: quem perde mais na guerra da energia?

Conflito na Ucrânia tem como pano de fundo a dependência europeia do gás russo. Ainda que isso seja um fato, o plano de Putin pode sair pela culatra

Usina nuclear da EDF em Belleville-sur-Loire, na França. (Benoit Tessier/Reuters)

Usina nuclear da EDF em Belleville-sur-Loire, na França. (Benoit Tessier/Reuters)

RC

Rodrigo Caetano

Publicado em 2 de março de 2022 às 17h42.

A guerra é a continuação da política por outros meios, disse o militar prussiano e teórico da guerra Carl Von Clausewitz (1790-1831). Na guerra da Ucrânia, há diversas nuances geopolíticas em jogo, que envolvem praticamente os grandes players internacionais, dos Estados Unidos à China. Entre elas, está o fornecimento de gás natural à Europa pela Rússia, uma relação de dependência mútua que ocupa um lugar central na mesa de negociação, com potencial de impacto global.

Vladimir Putin, o mandatário russo, parece ter boas cartas nas mãos. Antes mesmo de ordenar a invasão do vizinho, ele vinha fechando a torneira de seus gasodutos, que passam, justamente, pela Ucrânia. Isso fez disparar o preço do gás e gerou uma crise energética na Europa -- a Rússia é responsável por um terço do gás utilizado pelos europeus. A Alemanha foi especialmente afetada. Com o poder de, literalmente, congelar seus vizinhos, Putin demonstrou a autoestima de um tirano e lançou sua campanha destrutiva contra os ucranianos.   O risco, para o russo, é apostar demais.

Ainda que a interrupção do fornecimento de gás colocaria o velho continente em maus lençóis, para a Rússia, seria desastroso. Mais de dois terços da receita proveniente da venda de gás natural do país vem da Europa, de acordo com dados da Bloomberg. Geograficamente, ainda há uma carta na manga para os europeus: a possibilidade de diversificar o fornecimento transformando suas penínsulas no Atlântico em portos preparados para receber gás liquefeito, uma alternativa logística para o gasoduto, embora mais cara.

Antes do conflito, havia pouco interesse em investir nesse tipo de infraestrutura, uma vez que o fornecimento russo parecia confiável. Agora, o cenário mudou.

Segurança energética e usinas nucleares

A ordem na Europa passou a ser a da segurança energética. “A maioria dos países irá buscar, ao máximo, a autossuficiência”, afirma Luiz Barroso, CEO da PSR, uma das mais prestigiadas consultorias de energia do mundo. “Claro que, para muitos, será impossível. Mas a propensão é por reduzir a dependência de um só fornecedor, seja ele a Rússia, os Estados Unidos ou a Arábia Saudita.”

Uma resolução recente da Comissão Europeia promete acelerar o plano europeu de autossuficiência energética. A energia nuclear foi incluída no Green Deal, plano de descarbonização da economia da Europa que prevê investimentos de quase 1 trilhão de dólares na transição energética. A fonte foi considerada limpa (não emissora), ainda que não renovável. O presidente da França, Emmanuel Macron, já anunciou investimentos de 50 bilhões de euros para reativar o programa nuclear francês.

Na Alemanha, a dificuldade de retomar os planos nucleares são maiores politicamente. Os alemães desligaram todas as suas usinas após o acidente de Fukushima, muito em função da pressão exercida pelo Partido Verde, que hoje está no poder. Porém, o que parecia impensável há uma semana, se tornou realidade pela ação intempestiva de Putin.

O novo chanceler alemão, Olaf Scholz, anunciou uma injeção de 100 bilhões de euros nas forças armadas. Em um discurso de 30 minutos, Scholz inverteu uma lógica de defesa que persistia no país desde o fim da Segunda Guerra Mundial. A medida é ilustrativa do que a Alemanha pode fazer para reduzir seus laços comerciais com a Rússia, incluindo o fornecimento de gás. Paralelamente ao investimento nos militares, o governo alemão disponibilizou recursos para ampliar a capacidade de receber gás liquefeito.

Como a guerra na Ucrânia impacta as energias renováveis

Nesse embate geopolítico, as energias renováveis devem desempenhar um papel importante. Antes da pandemia, a lógica que imperava no setor era a de que o volume de investimentos dependia do preço do petróleo. Se estivesse lá em cima, havia incentivos para investir em renováveis, do contrário, o volume de recursos caía. Com a interrupção de toda a atividade econômica global gerada pelo coronavírus, o que se viu foi a derrubada do preço do barril de petróleo, que chegou na casa dos 20 dólares, porém, sem a consequente redução dos investimentos em renováveis, que subiram. A lógica parece ter perdido o sentido.

Com a guerra na Ucrânia, o barril de petróleo é negociado na casa dos 110 dólares. De qualquer maneira, o futuro das renováveis parece depender menos desse indicador e mais dos planos de descarbonização europeus. A meta da União Europeia é cortar em 55% suas emissões até 2030. Dados da Agência Internacional de Energia apontam que isso reduzirá a demanda por gás natural, um combustível fóssil, de 392 bilhões de metros cúbicos para 315 bilhões – esse corte e os investimentos em gás liquefeito têm potencial para reduzir as compras de gás da Rússia em 93%, de acordo com a Bloomberg.

O Reino Unido, inclusive, irá investir 5,3 bilhões de euros para descarbonizar o aquecimento doméstico e promete desligar, até 2035, todos os boilers abastecidos com combustível fóssil. Já eletrificar as indústrias que dependem de altas temperaturas, como a siderurgia, será mais difícil. É aí que entra o hidrogênio verde.

A tecnologia ainda é inviável comercialmente – segundo Barroso, da PSR, o preço precisa cair por volta de 60% para a fonte se tornar competitiva. Ele explica que o processo de eletrólise necessário para obter o hidrogênio demanda muita energia. Em países com matriz energética predominantemente fóssil, como a maioria dos europeus, não faz muito sentido do ponto de vista de emissões.

No Brasil, a história é outra. Por aqui, a matriz é limpa e a queda no preço das renováveis pode dar competitividade ao hidrogênio brasileiro. “Pode ser uma alternativa para descarbonizar setores que não podem ser facilmente eletrificados”, diz Barroso. Quem tem investido pesado na economia do hidrogênio é a Alemanha, a mais dependente do gás russo.

Na guerra, não há vencedores, mas há quem sofra mais ou menos. No caso da Ucrânia, ao que parece, quem tem mais a perder é, justamente, quem iniciou o conflito.

Acompanhe tudo sobre:EnergiaEnergia renovávelPetróleoRússiaUcrânia

Mais de ESG

Suzano conquista certificações sustentáveis inéditas para linhas de lignina e celulose

Japão propõe redução de emissões em 60% até 2035, mas meta é vista como insuficiente

40% dos tutores já perderam pet por conta dos fogos de artifício, segundo pesquisa

Escassez de água pode forçar migração de 32 milhões até 2050