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Escala de produção: o fator esquecido na transição energética

Como viabilizar economicamente soluções “verdes” para enfrentar a crise climática?

O verdadeiro desafio é tornar essas alternativas competitivas com os combustíveis fósseis. (visootu2/envato)

O verdadeiro desafio é tornar essas alternativas competitivas com os combustíveis fósseis. (visootu2/envato)

Publicado em 9 de agosto de 2024 às 15h00.

Quase diariamente aparece uma notícia sobre alguma inovação que permitiria substituir combustíveis fósseis por alternativas “verdes”. No entanto, o grande obstáculo para a adoção destas alternativas não é técnico, mas seu sobrecusto comparado com a opção econômica fóssil. Um dos principais objetivos das políticas de transição energética é minimizar este sobrecusto ou prêmio verde. Mostraremos a seguir que a escala de produção é um fator fundamental, por vezes esquecido, para reduzir o prêmio verde.

Nosso exemplo é a substituição do bunker, um óleo pesado usado no transporte marítimo. A Organização Marítima Internacional (IMO) se comprometeu a reduzir significativamente o seu uso por ser um grande emissor de CO2 e partículas nocivas à saúde. Um candidato para substituí-lo é o metanol. No entanto, o principal insumo para a produção do metanol é o gás natural, que também emite CO2. Esta limitação motivou o interesse pelo uso do “biometano” como insumo para a produção de metanol, ao invés do gás natural.

O biometano é produzido a partir de matéria vegetal, por exemplo bagaço de cana. Embora seja, do ponto de vista químico, praticamente igual ao gás natural, ele é renovável porque a matéria vegetal é composta de CO2 retirado do ar pela fotossíntese. Isto significa que, quando o biometano é queimado, não acrescenta CO2 à atmosfera; ele só “devolve” o que tinha sido capturado antes pela matéria vegetal. Esta é a mesma razão para o etanol da cana de açúcar ser um combustível “limpo”. A Maersk, uma das maiores empresas de navegação do mundo, por exemplo,  compra biometanol (nome do metanol feito com biometano) da empresa OCI para abastecer um navio de sua frota especialmente projetado para usar esse combustível.

É neste ponto que aparece a importância da escala de produção. No Brasil, o custo do biometano (insumo para o biometanol) a partir de resíduos da cana é quase igual ao do gás natural (insumo para o metanol). No entanto, o custo do biometanol é cerca de 40% maior do que o do metanol. A explicação para este paradoxo aparente é que as instalações de produção de biometanol são muito menores do que as do metanol: uma consome milhões de metros cúbicos de insumo por ano, enquanto a outra consome os mesmos milhões de metros cúbicos por dia.

A próxima questão é: seria possível aumentar a escala de produção do biometanol para diminuir seu custo? A resposta é: felizmente, sim. O “pulo do gato” é que, como mencionado, a molécula de metano do biometano é idêntica à do gás natural. A diferença está na origem da molécula. Portanto, é possível misturar os insumos de biometano e gás natural se tivermos uma maneira de certificar sua origem durante todo o processo.

As etapas do procedimento seriam:

1 - Certificar o biometano para diferenciá-lo do gás natural

2 - Injetar o biometano na rede de gasodutos

3 - A planta de metanol compraria os certificados de biometano no mesmo volume consumido, que não poderiam ser vendidos a mais ninguém.

Assim, seria possível utilizar a planta de metanol atual, com escala, sem nenhuma modificação, e vender um biometanol garantido pelos certificados de biometano.

Finalmente, é importante observar que o procedimento acima não é teórico; a transação envolvendo Maersk e a OCI, mencionada anteriormente, seguiu exatamente essa lógica. O Brasil poderia replicar essa experiência e vender biometanol a preço premium que cobriria o custo da compra de biometano certificado de usinas canavieiras. Estas usinas expandiriam seu leque de produtos ofertados – usualmente açúcar, etanol e eletricidade – para incluir biometano e biometanol.

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