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Amazônia não deve ser vista como negócio, defende líder indígena

Representante da comunidade Ashaninka e coordenador da Organização dos Povos Indígenas do Rio Juruá, Francisco Piyãko disse à EXAME que ninguém é dono da natureza e é ela quem rege como devemos viver

 Francisco Piyãko, líder indígena: “Entendemos que a terra, as águas, e tudo que está neste planeta não pode ser vendido, pois não somos donos de nada“

Francisco Piyãko, líder indígena: “Entendemos que a terra, as águas, e tudo que está neste planeta não pode ser vendido, pois não somos donos de nada“

Sofia Schuck
Sofia Schuck

Repórter de ESG

Publicado em 1 de dezembro de 2024 às 20h55.

Última atualização em 1 de dezembro de 2024 às 23h54.

Se por um lado muito se fala sobre a necessidade de provar que o verdadeiro valor está na floresta de pé, Francisco Piyãko, líder da comunidade Ashaninka e coordenador da Organização dos Povos Indígenas do Rio Juruá, não é adepto da ideia de entender a preservação da natureza para gerar lucro.

Natural do Acre, o indígena esteve presente no TEDxAmazônia neste fim de semana em Manaus, e compartilhou suas ideias 'para adiar o fim do mundo' a partir das vivências e práticas ancestrais. 

Em entrevista à EXAME, Francisco disse ter uma certeza na vida: a forma de sustentar o planeta e garantir o futuro da humanidade é como seu povo sempre fez. E na contramão do que muitos podem pensar, ele deixa bem claro que a solução passa por entender que a Amazônia e os recursos naturais da Terra não são um negócio. 

"É a natureza que diz como temos que viver. Entendemos que a terra, as águas, e tudo que está neste planeta não pode ser vendido, pois não somos donos de nada disso", disse. 

Para o líder indígena, é preciso mudar a lógica de ocupação de terras e lutar por um espaço onde os seres possam viver e prosperar. E isto também permeia a ideia do coletivo: "Não podemos pegar uma fruta que está na floresta, coletar e vender. Isso está contra a nossa regra. Você tem que pegar, trazer e dar para o outro, então ele fará o mesmo por você. É menos sobre explorar, e mais sobre cuidar para ser cuidado", destacou. 

Na comunidade Ashaninka, seu povo vive isolado e só vai até lá quem tem um negócio, conta Francisco. Segundo ele, as maiores ameaças são a chegada de empresas madeireiras ou de mineração, e as obras de infraestrutura, como as rodovias que cruzam suas terras. Assim como em outras regiões do Brasil, recentemente também foram assolados pelas queimadas e sofreram com a qualidade de ar insalubre.

"Estamos passando por problemas seríssimos enquanto humanidade, pois a floresta está chegando no seu limite. Ela tem uma capacidade para se sustentar e precisa ser vista e entendida como um todo, e não como um negócio", repetiu. Isto porque ao pensar em explorá-la visando o lucro, se quebra toda uma cadeia e se esgotam os recursos, lembrou.

Ainda segundo ele, também não podemos esquecer que a natureza é viva e ela se movimenta, trazendo uma série de consequencias para todo o planeta. 

Mercado de carbono

Na Conferência do Clima da ONU (COP29) em Baku, no Azerbaijão, o maior avanço celebrado foi a regulamentação do mercado de carbono global -- contemplado pelo artigo 6 do Acordo de Paris. Dias após, o Senado brasileiro também aprovou um Projeto de Lei voltado a comercialização de créditos de carbono no país.

Questionado sobre sua visão sobre este mercado, Francisco frisou que existem dois lados da moeda. "Se for para proteger a floresta é uma coisa, mas se for para enriquecer alguém, podemos acabar colocando tudo em risco e acelerar mais uma vez o processo de exploração da Amazônia".

Este mercado também tem levantado dúvidas de alguns ambientalistas, preocupados com a lógica da 'compensação' pelos setores altamente emissores -- em vez da mitigação dos gases de efeito estufa, vilões do aquecimento global.

Em sua palestra, Francisco também alertou sobre 'esta nova onda de sustentabilidade' e reforçou que a Amazônia pode acabar perdendo sua essência ao ser transformada em dinheiro. Em outra direção, ele acredita na urgência de respeitar os valores e os saberes da floresta e seus povos. 

"Os negócios não se interessam só em proteger. E as pessoas querem tirar algo para si. A lógica capitalista está muito ligada a este entendimento de que você tem que ter algo para ser sua garantia e se transformar em papel", concluiu à EXAME.

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