Economia

Se eleito, Lula deve ser rápido para ganhar confiança do mercado

"Se eleito, vou nomear a melhor equipe econômica que o Brasil pode ter." Foi assim que o candidato Luiz Inácio Lula da Silva encerrou seu discurso para uma platéia de empresários e representantes do setor financeiro no último sábado (19/10), em São Paulo. Quem estava lá - como a Jack Correa, vice-presidente da Coca-Cola, Roberto […]

EXAME.com (EXAME.com)

EXAME.com (EXAME.com)

DR

Da Redação

Publicado em 9 de outubro de 2008 às 11h05.

"Se eleito, vou nomear a melhor equipe econômica que o Brasil pode ter." Foi assim que o candidato Luiz Inácio Lula da Silva encerrou seu discurso para uma platéia de empresários e representantes do setor financeiro no último sábado (19/10), em São Paulo. Quem estava lá - como a Jack Correa, vice-presidente da Coca-Cola, Roberto Setubal, presidente do Banco Itaú e Mauro Bernardini, vice-presidente da Federação das Indústrias de São Paulo (Fiesp) - aplaudiu. Mas é bom que o PT não se engane: se vencer no próximo domingo, terá de ganhar a confiança do mercado logo nas primeiras 24 horas do novo mandato. A estabilidade do mercado durante a transição do governo vai depender profundamente dos nomes anunciados para a próxima equipe econômica.

"O mercado não dará o benefício da dúvida ao novo presidente", afirma um economista de um importante banco estrangeiro. "Se a equipe anunciada não agradar ou se os novos nomes não aparecerem logo no dia seguinte ao das eleições, as coisas podem ficar feias. O mercado irá reagir pesado se os nomes do PT não transmitirem confiança aos investidores." Para ele, não há espaço para compaixão no período de transição entre duas equipes econômicas. Tanto o atual governo quanto a futura equipe precisam trabalhar em sintonia para que o mercado acredite que as principais metas econômicas - inflação e superávit primário - serão mantidas. "Caso contrário, o mercado não terá piedade", diz ele.

Durante a semana passada e até a próxima sexta-feira (25/10) o mercado, que já comprou a idéia da vitória de Lula, buscará nos discursos de integrantes da campanha pistas sobre o período da transição. Na quinta-feira (17/10) passada, por exemplo, Antonio Palocci, coordenador do plano de governo do PT, afirmou que Lula, se eleito, cumprirá o superávit primário que for necessário. A declaração ajudou a reverter a tendência de alta do dólar instantaneamente. "Não houve qualquer declaração nos últimos meses que se chocasse com o que o mercado considera positivo. Ao contrário", afirmam os analistas do Lloyds TSB. Além disso, fala-se na rápida adoção de propostas para reduzir o déficit da previdência pública, em prioridade para a reforma tributária e na autonomia do Banco Central. Iniciativas para mercado desconfiado nenhum botar defeito. "O reflexo no preço dos ativos, porém, só será concretizado favoravelmente conforme tais medidas forem confirmadas e bem sucedidas", diz o banco.

O anúncio da nova equipe econômica - ou pelo menos dos nomes que irão assumir o Banco Central, o Ministério da Fazenda e o Ministério do Desenvolvimento, Indústria e Comércio - é tão importante porque mostrará até que ponto o mercado tinha razão em duvidar do discurso light do PT. "É fundamental para o futuro que o novo governo do Brasil ganhe credibilidade logo nos primeiros dias", afirmou Bryan ONeill, chefe do banco de investimentos J.P. Morgan Chase para América Latina, ao americano Wall Street Journal. "O que o mercado precisa saber logo é quem ocupará os postos mais altos da economia do país." Os nomes indicados darão uma idéia do que esperar da política econômica do novo governante.

O jornal americano cita alguns nomes do mercado que têm sido cogitados para compor a equipe econômica de um eventual governo Lula. São eles: João Sayad, Henri Philippe Reichstul, Henrique Meirelles. Mas qualquer tentativa de especulação não tem tido ressonância no mercado brasileiro. É esperar para ver.

A transição no BC e na CVM

Pedro Parente, ministro-chefe da Casa Civil, é quem está coordenando a transição do governo Fernando Henrique Cardoso. Também para ele, o mais importante para garantir uma transição tranqüila é a declaração do presidente eleito. "A nossa parte é colocar em prática um processo de transição construtivo, transparente e apartidário. A parte do novo presidente é vir a público logo após sua eleição e, com a responsabilidade de um presidente, e não mais de um candidato, dizer o que pensa para o futuro do nosso país", afirmou Parente durante um evento em São Paulo na última segunda-feira (21/10). Parente afirmou que um dos candidatos ao governo não recebeu bem a proposta do governo de manter, pelo menos durante a transição, o atual quadro do BC. Assim, enquanto não receber os nomes dos novos integrantes, a transição no BC não avança. "Depois de conhecida a equipe, começaremos a acertar a transição do banco com a mesma preocupação de torná-la suave", disse Parente.

Já em relação ao órgão regulador do mercado de capitais, a Comissão de Valores Imobiliários (CVM), o próximo presidente terá de conviver com um comando formado por nomes escolhidos por Fernando Henrique Cardoso. Segundo informa a Agência Reuters, o presidente da instituição, Luiz Leonardo Cantidiano, disse assim que for concluído o segundo turno das eleições, solicitará a Fernando Henrique que encaminhe ao Congresso os nomes de quatro diretores da CVM para serem sabatinados. Com isso, Cantidiano garante o mandato fixo com prazo escalonado de um a cinco anos para esses diretores.

"Enquanto for presidente não vou concordar que terceiros ponham diretores com quem eu não queira trabalhar", disse Cantidiano a jornalistas durante um seminário no Rio de Janeiro. Cantidiano, que fica no cargo até 2007, é o primeiro presidente da autarquia com mandato fixo, devido à mudança feita na Lei das Sociedades Anônimas, no ano passado.

O objetivo da mudança - apoiada pelo PT nas votações do Congresso - foi garantir a autonomia da autarquia. "A diretoria da CVM é um time técnico, não pode seguir a política. Por isso se mudou a lei e se deu mais autonomia à CVM", explicou Cantidiano, advogado de mercado que foi indicado pelo atual ministro da Fazenda, Pedro Malan, para substituir José Luiz Osório em julho deste ano. Ainda que tenha se demonstrado determinado a indicar a vaga remanescente na diretoria e a solicitar a sabatina no final do mandato do presidente Fernando Henrique Cardoso, Cantidiano disse que conversará com a equipe de transição nomeada pelo futuro governo antes de entregar os nomes à sabatina. "Como eu vou ficar no futuro governo, acho elegante discutir com a equipe de transição esses nomes, não quero que pareça que é uma coisa à revelia", disse.

Cantidiano elogiou o programa para o mercado de capitais de Lula e destacou a utilização de recursos do Fundo de Amparo do Trabalhador (FAT) e do Fundo de Garantia por Tempo de Serviço (FGTS) para a compra de ações como um ponto forte do programa. "Essa idéia é bem interessante porque visa o longo prazo, cria uma cultura de mercado de capitais e atrai investidores, pode ser uma virada no mercado", afirmou.

O legado FHC

A equipe econômica anunciada pelo próximo governo terá de lidar com um legado do atual que tem pontos positivos e negativos. Alguns deles:

  • Dívida pública de 260 bilhões de dólares;
  • Meta de superávit primário acordada com o Fundo Monetário Internacional (FMI) de 3,88% em 2003;
  • Meta de inflação de 4,5% para 2003;
  • Desvalorização do real frente ao dólar de cerca de 38%;
  • Risco-Brasil beirando os 2 000 pontos;
  • Déficit externo que deve chegar a 13 bilhões em 2002 (estimativa de mercado);
  • O crescimento da economia foi pífio. De 1995 a 2001, o PIB cresceu, em média, apenas 2,4%;
  • Estabilização da moeda. A inflação média, de 1995 a 2001, foi de 8,8% ao ano, segundo o IBGE.
  • A taxa de juro continua teimosamente estacionada na casa de 18% ao mês, a maior do mundo;
  • O déficit global da previdência foi de 47,6 bilhões de reais no ano passado. Os privilégios permanecem. A massa de 20 milhões de beneficiários do INSS consome 75,3 bilhões de reais contra os 56,4 bilhões de reais destinados a apenas 3 milhões de inativos e pensionistas da administração pública;
  • Consolidação da abertura comercial e conseqüente desenvolvimento de uma cultura empresarial com foco na produtividade e na competitividade;
  • Encolhimento do Estado. Foram privatizadas 36 empresas estatais nos últimos sete anos;
  • Implementação da Lei de Responsabilidade Fiscal. Hoje, 94% dos municípios cumprem o limite de gastos com folha de pagamento imposto por lei (60% das receitas correntes líquidas). Dos 27 estados, apenas dois estão fora do limite.
  • A porcentagem de crianças fora da escola caiu de 18,2% para 3% entre 1992 e 2000. No mesmo período, a taxa de analfabetismo baixou de 18,3% para 10,2%.
  • A mortalidade infantil diminuiu de 47,8 por 1 000 nascimentos, em 1990, para 29,6 por 1 000, em 2000.
  • Os programas de transferência de renda do governo federal -- como o Bolsa-Escola -- vão distribuir cerca de 29,5 bilhões de reais em 2002 (quantia próxima do total que a União arrecada com o imposto de renda). O principal desafio do futuro presidente será enfrentar a síndrome do não-crescimento
  • Apesar da melhora em muitos indicadores sociais, o Brasil permanece entre os campeões mundiais de má distribuição de riqueza. Tomando como parâmetro o Índice de Desenvolvimento Humano (IDH), da ONU, o país só está melhor que nações miseráveis como Serra Leoa e Suazilândia.

    Como se vê, a tarefa do próximo governo não será fácil. Seja lá quem vencer as eleições do próximo dia 27 de outubro.

  • Acompanhe tudo sobre:[]

    Mais de Economia

    Lula sanciona projeto de desoneração da folha de pagamento de 17 setores da economia

    Haddad vê descompasso nas expectativas sobre decisões dos Bancos Centrais globais em torno dos juros

    Cartão de crédito para MEIs: Banco do Brasil lança produto sem cobrança de anuidade para clientes

    Fim do Saque-aniversário do FGTS? Ministro vai enviar projeto ao Congresso para encerrar modalidade