Nassim Taleb, professor de engenharia de riscos da Faculdade Politécnica da Universidade de Nova York. (foto de arquivo: 24 de maio de 2020). (Valery SharifulinTASS/Getty Images)
Ligia Tuon
Publicado em 20 de julho de 2020 às 15h44.
Última atualização em 20 de julho de 2020 às 18h31.
Desde o início do ano, alguns economistas, agentes de mercado e formadores de opinião têm definido a pandemia de covid-19 como o "cisne negro" de 2020.
O termo ficou famoso após o economista libanês, Nassim Taleb, usá-lo para descrever eventos imprevisíveis e de grandes consequências econômicas — como o ataque de 11 de setembro nos Estados Unidos — em seu livro The Black Swan: The Impact of the Highly Improbable ("Cisne Negro: o impacto do altamente improvável", numa tradução livre), publicado em 2007.
O especialista em análise de riscos vem afirmando, no entanto, que a pandemia não pode ser chamada de “cisne negro”, porque era um evento previsível pois já em janeiro havia sinais claros de que a doença poderia se alastrar, repetiu Taleb em evento para investidores promovido pela XP, na semana passada.
O economista cita outros surtos passados, como o da sars, um tipo de coronavírus, que preocupou o mundo em 2003, e destaca que a forma como os países estão integrados atualmente nunca foi tão favorável para a disseminação de vírus.
Nessa linha, Taleb disse em evento que a crise atual foi intensificada pela “incompetência” de autoridades e citou a atuação inicial lenta da Organização Mundial da Saúde (OMS) e equivocada do Centro de Prevenção e Controles de Doenças dos Estados Unidos, que chegou a decretar o fechamento das fronteiras americanas para a China, enquanto deixou aberta a outros países.
Apesar da polêmica, a mensagem que instituições quiseram passar ao usar o termo em suas análises de cenário foi clara, e o fato de Taleb desautorizar o uso publicamente também é um tipo de recado.
"A insistência do Taleb vem na forma de crítica para dizer que a pandemia não era algo totalmente fora do radar, pelo contrário, era uma vulnerabilidade já apontada por diversos especialistas. A gente não se preparou porque não quis", diz Joel Pinheiro, economista e mestre em filosofia pela USP.
Não importa muito, segundo Pinheiro, porém, se estamos usando o termo na definição exata que o criador deu a ele, porque a língua é viva e vai se transformando: "Hoje em dia, black swan virou um evento difícil de prever ou improvável, que causa danos na economia mundial, algo que estava fora do controle, como foi justamente o início da pandemia”, completa.
Em relatório publicado em fevereiro, o Société Générale alertou, em nota de rodapé, em meio a suas perspectivas sobre o mercado de capitais que, embora os indicadores parecessem positivos, todos deviam ficar atentos a um possível ‘cisne negro’, a partir do “caso do vírus de Wuhan”, que tem o potencial de rapidamente atrapalhar a dinâmica do mercado.”
O banco tinha o costume de publicar trimestralmente uma lista de possíveis "cisnes negros" para a economia mundial. Dessa lista já fizeram parte o Brexit, em 2016, e o risco de os Estados Unidos não aprovarem no Congresso cortes de impostos desejados por Donald Trump, em 2017.
A Sequoia Capital, uma das maiores empresas de capital de risco do mundo, fez o mesmo ao enviar e-mail a empreendedores em abril alertando sobre os riscos de o coronavírus provocar uma desaceleração econômica global prolongada. O título do memorando era Coronavírus: The Black Swan of 2020 ("Coronavírus: o cisne negro de 2020").
Resultado: quem decidiu levar em consideração estes alertas em suas decisões de investimento se deu melhor do que os demais.