Economia

Luta contra impeachment põe ajuste em 2º plano

Enquanto Dilma Rousseff e Eduardo Cunha concentram seus esforços na defesa dos seus respectivos mandatos, a deterioração fiscal segue seu curso


	Dilma Rousseff: com as medidas de ajuste fora da pauta do Congresso, o governo evitando cortes maiores de gastos e a recessão afetando as receitas, o déficit público deve bater novos recordes este ano
 (REUTERS)

Dilma Rousseff: com as medidas de ajuste fora da pauta do Congresso, o governo evitando cortes maiores de gastos e a recessão afetando as receitas, o déficit público deve bater novos recordes este ano (REUTERS)

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Da Redação

Publicado em 15 de outubro de 2015 às 18h42.

Enquanto Dilma Rousseff e Eduardo Cunha concentram seus esforços na defesa dos seus respectivos mandatos, a deterioração fiscal segue seu curso e já custou um segundo rebaixamento do rating brasileiro.

Com as medidas de ajuste fora da pauta do Congresso, o governo evitando cortes maiores de gastos e a recessão afetando as receitas, o déficit público deve bater novos recordes este ano.

O déficit primário do governo central, que não inclui as contas de estados e municípios nem os pagamentos de juros, deve superar R$ 25 bilhões este ano, segundo uma fonte da equipe econômica. Será o pior resultado da história, superando o até então inédito déficit de R$ 17,2 bilhões de 2014.

O déficit nominal, que incorpora a conta de juros e é considerado internacionalmente a principal métrica de política fiscal, pode atingir 7,5% do PIB este ano, segundo expectativa mediana dos economistas consultados pela Bloomberg.

O número deve superar o déficit de 6,7% de 2014, quando o governo gastou R$ 344 bilhões a mais do que arrecadou, um recorde.

O rebaixamento da nota brasileira pela Fitch segue decisão da S&P de 9 de setembro.

A decisão havia sido telegrafada momentos antes por comentário de Rafael Guedes, diretor da Fitch, de que o Brasil poderia ser cortado se não houvesse ajustes e a dívida seguisse crescendo.

O Goldman Sachs disse em relatório que o aumento da dívida eleva o risco de novo rebaixamento do rating. Para o banco, a dívida bruta deve passar de 70% do PIB em 2016.

O ministro da Fazenda, Joaquim Levy, tenta “vender” a ideia do ajuste fiscal comparando o momento atual com os ciclos de 1999-2000 e, em menor grau, 2003-2004, quando o governo contou com o atual ministro no comando do Tesouro. Nos dois casos, o governo fez um forte ajuste fiscal e o resultado foi, no ano seguinte, uma retomada vigorosa da economia.

O problema é que a situação fiscal hoje é mais difícil do que em ajustes anteriores, diz o especialista em contas públicas Fábio Giambiagi, que recentemente lançou o livro “Capitalismo: Modo de usar”.

Em 1999, quando houve mudança do regime cambial, o ajuste ocorreu em meio à perspectiva de recuperação da atividade; o mesmo ocorreu no ajuste de 2003.

Outra diferença é a confiança. FHC, presidente em 1999, enfrentou crises, mas não um problema de credibilidade junto aos investidores.

Lula enfrentou o problema em 2002, antes de se eleger, mas conquistou a confiança em 2003 ao colocar Antonio Palocci na Fazenda e Henrique Meirelles no Banco Central, dando a eles uma autonomia para elevar o superávit primário e a taxa de juros jamais vista no governo Dilma.

Dilma começou o segundo mandato nomeando Levy para a Fazenda. Foi um sinal positivo aos investidores, mas que até aqui não foi concretizado em cortes de gastos na medida necessária para melhorar o resultado fiscal em um cenário de receitas em baixa.

Sem os cortes, a opinião pública rejeita aumentos de impostos, o que acaba ecoando no Congresso.

O governo conta com a aprovação da CPMF para evitar o déficit em 2016, mas a maioria dos analistas considera difícil sua aprovação. Com Dilma batendo recorde de impopularidade e ainda sob a ameaça de impeachment, apesar do alívio dado pelo STF, conseguir 2/3 dos votos dos parlamentares para aprovar qualquer medida parece tudo menos realista.

Cunha já chegou a dizer enfaticamente que o imposto do cheque não passa. Sem a CPMF, vai ser muito difícil cumprir a meta de superávit primário de 0,7% em 2016, diz Giambiagi.

Na verdade, segundo o economista, vai ser difícil evitar um novo déficit, que seria o terceiro ano consecutivo no vermelho. Para Levy, a CPMF seria uma “ponte provisória” entre o ajuste e a volta do crescimento.

Na conta das despesas, a maior preocupação é com a Previdência, cujo déficit cresce com o aumento do desemprego, que reduz as contribuições, e tende a acelerar nos próximos anos com a fórmula 85/95, que reduz a eficácia do fator previdenciário.

Analistas do mercado são praticamente unânimes na defesa de uma reforma profunda, que institua idade mínima para aposentadorias.

O fato de Miguel Rossetto ter assumido o ministério da Previdência, contudo, foi visto como um sinal negativo para a reforma.

O ministro é identificado com alas mais à esquerda do PT, que geralmente se opõem a qualquer alteração que torne mais rígidas as regras de obtenção de aposentadorias.

A tese de Levy, de que um ajuste consistente é necessário para recolocar a economia em crescimento, não parece encontrar respaldo no PT.

Até mesmo o ex-presidente Lula, embora tenha feito o que Levy prega hoje quando assumiu a presidência em 2003, agora quer o governo menos focado no ajuste e mais no crescimento.

Submetido a pressões, Levy vem demonstrando insegurança com sua permanência na Fazenda, diz um interlocutor do ministro no Senado.

A ideia do ministro seria permanecer apenas até a aprovação do orçamento de 2016 e do ajuste fiscal, disse o parlamentar sob a condição de anonimato.

Reduzir o déficit na atual circunstância política é uma tarefa inglória, diz Giambiagi, para quem há divergência entre o que a Fazenda prega e as ações concretas do governo.

“O Levy e o PT são duas retas paralelas que não se cruzam nem no infinito”.

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