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A tecnologia está derrubando preços, e isso nem sempre é bom

Suécia mostra que a deflação tecnológica é um fenômeno real e que deve ser levado a sério pelos bancos centrais, diz relatório do HSBC Global Research

Data center do Facebook em Lulea, na Suécia: país mostra como o futuro pode ser (Simon Dawson/Bloomberg)

João Pedro Caleiro

Publicado em 3 de fevereiro de 2016 às 12h39.

São Paulo - Você já ouviu falar em deflação tecnológica?

Ela está longe de ser uma ameaça no Brasil (onde a inflação bateu dois dígitos e continua muito acima da meta ), mas é um tema de sério debate no mundo desenvolvido.

O melhor exemplo é a Suécia, onde o PIB cresce 3,9%, os salários crescem 2,2% e o crédito cresce 7,3% enquanto a inflação segue em parcos 0,1%.

Inflação baixa demais ou deflação podem virar riscos na medida que os consumidores adiam o consumo, esperando queda de preços, o que pode levar a um círculo vicioso.

Do outro lado da fronteira, temos a situação contrária: uma Noruega em desaceleração, mas com inflação anual batendo 2,5%.

Isso coloca estes bancos centrais em um dilema, já que uma parte dos números pede por aperto monetário - para evitar bolhas e riscos financeiros - enquanto os preços pedem por relaxamento e juros mais baixos.

Vários fatores atuam nessa dinâmica, entre eles a queda do preço do petróleo. Na importadora Suécia, isso ajudou a derrubar custos, enquanto na exportadora Noruega, levou a uma desvalorização forte da moeda, pressionando a inflação. Mas isso é só parte da história.

De acordo com um relatório recente do HSBC Global Research, a inflação baixa na Suécia pode ser explicada em parte pela competição estrangeira, já que sua economia é bastante aberta, e em parte pelo avanço tecnológico.

"O impacto da tecnologia na inflação não pode ser subestimado, especialmente em países ricos e altamente dependentes da tecnologia como a Suécia. Vemos o impacto por vários canais, mais notavelmente pela noção de que os consumidores são melhor informados sobre preços, o que significa que a competição aumenta de forma aguda. Isso antes mesmo de considerarmos os custos mais baixos associados com venda online e as subsequentes pressões deflacionárias", diz o texto assinado por James Pomeroy.

95% dos suecos usam a internet regularmente e quase metade da população do país está em empregos intensivos em conhecimento. Para o HSBC, o banco central do país deve ver esta nova força deflacionária como algo já estrutural.

Mas o debate vai bem além do curto prazo. Para alguns autores, a economia mundial está saindo da "escassez" em direção à "abundância" já que está cada vez mais baseada na informação, que no limite não custa nada para ser reproduzida.

E escassez sempre foi a força número um para qualquer aumento de preço.

"Robôs e softwares baratos e poderosos permitem a companhias depender menos dos insumos tradicionais de trabalhadores, prédios e equipamento pesado, construindo operações enxutas que geram grandes margens. Em todas estas formas (e certamente outras), o progresso tecnológico tem o efeito de diminuir preços e salários", diz um artigo do Financial Times escrito por Andrew McAfee, do centro do MIT para negócios digitais e autor de livro sobre a nova revolução digital.

Empresas como WhatsApp geram receita e valor de mercado com muito menos necessidade de investimento e de funcionários do que as grandes empresas do passado.

Isso significa que a tecnologia pode ser um dos grandes fatores por trás do curioso cenário econômico dos países desenvolvidos, onde juros historicamente baixos e programas de expansão monetária são incapazes de levar a inflação para perto da meta.

São Paulo - Desde 2001, o Fórum Econômico Mundial divulga um relatório mostrando o que os países tem feito para se preparar para um futuro digital. No ranking de 2015, Singapura passou a Finlândia , mas os primeiros lugares continuam parecidos, com destaque para países europeus e asiáticos. Para o Brasil, uma má notícia: queda de 15 posições em um ano e de 19 posições desde 2012, o que nos deixou atrás de nações como Ucrânia, El Salvador e Ruanda. O Brasil não entrou no top 50 em nenhum dos 10 pilares divididos entre ambiente (regulatório/político e de negócios/ inovação ), prontidão tecnológica (infraestrutura, preços e competências), uso (por governos, indivíduos e empresas) e impactos (econômicos e sociais). 143 países foram analisados. Veja a seguir o top 12 e alguns destaques e pontos de atenção em cada um:
  • 2. 1. Singapura

    2 /15(Getty Images)

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    Singapura passou a Finlândia e lidera o ranking em 2015. O país tem o melhor ambiente do mundo para negócios e inovação e mais da metade da população está em empregos intensivos em conhecimento (atrás apenas de Luxemburgo). O país lidera em penetração de assinaturas de banda larga móvel per capita, mas curiosamente, "apenas" 75% da população faz uso regular da internet, abaixo dos líderes Islândia, Noruega e Suíça.
  • 3. 2. Finlândia

    3 /15(Maasaak/Wikimedia Commons)

  • Após dois anos no topo, a Finlândia perdeu a liderança no ranking do Fórum graças principalmente a uma piora na entrega de serviços online pelo governo. A notícia vem no mesmo dia em que sua empresa mais valiosa, a Nokia , anunciou a compra da rival americana Alcatel-Lucent por US$ 16 bilhões. A Finlândia é primeiro lugar mundial em habilidades dos seus trabalhadores e passou o Japão como o país com maior número de patentes per capita.
  • 4. 3. Suécia

    4 /15(Simon Dawson/Bloomberg)

    "O ambiente político e de negócios da Suécia continua um dos melhores do mundo, apesar de um pequeno declínio", diz o relatório do Fórum. 95% dos suecos usam a internet regularmente e quase metade da população do país está em empregos intensivos em conhecimento. Uma excelente infraestrutura tecnológica e um acesso relativamente barato também contam a favor.
  • 5. 4. Holanda

    5 /15(Matthew Lloyd/Bloomberg)

    A Holanda manteve a 4ª posição graças a fatores como um bom ambiente regulatório e alto uso de internet no contato entre negócios e entre negócios e consumidores. Um ponto fraco do país é o preço de acesso: nesse quesito, o país amarga a 72ª posição mundial, o que leva a um número relativamente baixo de assinaturas de banda larga mobile.
  • 6. 5. Noruega

    6 /15(JRF/Flickr/Creative Commons)

    A Noruega tem a melhor infraestrutura digital do planeta e a coloca para bom uso. O país é 6º lugar mundial em uso efetivo destes recursos para acesso a serviços básicos e 3º lugar no uso do digital na educação. O país só perde para a Islândia em acesso a internet (95%, empatado com a Suécia) e metade dos seus empregos são intensivos em conhecimento.
  • 7. 6. Suíça

    7 /15(Fabrice Coffrini/AFP)

    A Suíça é "uma das usinas de inovação mais prolíficas do mundo", de acordo com o relatório, o que pode ser visto no destaque mundial de empresas do país em setores muito diferentes. Alguns exemplos: Nestlé (alimentício), Novartis (farmacêutico) e Credit Suisse (financeiro). Líder mundial em assinaturas de banda larga fixa per capita, a Suíça só fica para trás no quesito "serviços digitais do governo", onde tem a pior nota de todas as economias desenvolvidas.
  • 8. 7. Estados Unidos

    8 /15(Divulgação)

    O berço de Microsoft, Google e Facebook tem uma das melhores infraestruturas digitais do mundo (4º lugar mundial) e o uso das tecnologias de informação é generalizado entre governo, população e empresas. Apesar de alguns problemas, como custo de acesso, os Estados Unidos são um melhores exemplos de como "uma economia grande e avançada pode investir para alavancar a promessa da tecnologia da informação", diz o relatório.
  • 9. 8. Reino Unido

    9 /15(Toby Melville/Reuters)

    O Reino Unido subiu um degrau em 2015 e tomou o lugar de Hong Kong, que caiu 6 posições. Contam a favor dos britânicos uma excelente infraestrutura, um custo razoável de acesso e o alto uso pela população. O relatório destaca que as empresas do país estão "mostrando o caminho" com a liderança mundial na interação digital entre negócios e consumidores.
  • 10. 9. Luxemburgo

    10 /15(Benh Lieu Song/Wikimedia Commons)

    A pequena nação de apenas meio milhão de habitantes é mais conhecida como paraíso fiscal, mas tem se esforçado para se destacar também como pólo tecnológico. Não é por acaso que o país subiu 12 posições no ranking em 3 anos - um feito nada desprezível tão perto do topo. Nenhum país tem uma proporção tão grande de empregos intensivos em conhecimento (60%) como Luxemburgo , mas o custo de acesso ainda é alto demais e há espaço para melhorar coisas como os serviços online do governo.
  • 11. 10. Japão

    11 /15(Divulgação/ RIKEN)

    O Japão subiu 6 posições em apenas um ano e aparece pela primeira vez no top 10 do ranking. A vantagem do país é que a população gosta de tecnologia: " 9 em 10 usam a internet regularmente, quase todo celular é smartphone e o número de assinaturas de banda larga móvel per capita é terceiro lugar mundial", diz o relatório. A desvantagem: isso não tem causado o impacto esperado na economia. A chave para entender este fenômeno pode estar na cultura, relativamente mais hierárquica, patriarcal e avessa ao risco.
  • 12. 11. Canadá

    12 /15(Getty Images)

    Outro que subiu no ranking foi o Canadá , da 17ª para a 11ª posição. O destaque fica para o ótimo ambiente político e de negócios, a infraestrutura digital, uma alta expressiva nas patentes registradas e uma população muito bem preparada (9º lugar mundial). São ponto de atenção a baixa penetração da banda larga móvel e a lentidão do sistema judiciário na garantia de contratos.
  • 13. 12. Coreia do Sul

    13 /15(Woohae Cho/Iht/Nyt/Latinstock)

    "A internet ultra-rápida é onipresente na Coreia do Sul ", diz o relatório. Houve pouca mudança substantiva de um ano para o outro, e a queda de 2 posições é resultado mais de mérito de outros países do que de problemas coreanos. A população do país é uma das mais conectadas do mundo e o "efeito transformador das tecnologias de informação é significativo", resultado em parte da liderança do governo em adotá-las.
  • 14. 84. Brasil

    14 /15(Germano Lüders / EXAME)

    O Brasil teve uma das maiores quedas da edição 2015 do relatório: 15 posições, do 69º para o 84º lugar, logo atrás de Tunísia, Jamaica e Ruanda. Entre os BRICS, só a Índia está pior, no 89º lugar. A China ficou em 62º e a Rússia em 42º. Na América Latina, estamos atrás de Chile (38º) e Uruguai (46º) e na frente de Peru (90º) e Argentina (91º). Contra o país contam itens como o número de dias e procedimentos necessários para garantir um contrato ou começar um negócio, além de impostos altos e a baixa qualidade do sistema educacional. "O governo falhou em fazer das tecnologias de informação uma força central na sua estratégia de desenvolvimento (106º lugar nesse quesito). Consequentemente, os benefícios econômicos e sociais das tecnologias de informação continuam muito limitados (76º neste ranking)", diz o relatório. Como pontos positivos, é possivel destacar a melhora de 14 posições no ambiente de negócios e de inovação (agora no 121º lugar mundial) e o número relativamente alto de assinaturas de celular e de pessoas usando a internet e redes sociais.
  • 15 /15(SXC.Hu)

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