Ciência

CoronaVac: por que é importante tomar as duas doses da vacina

Para virologistas brasileiros, a aplicação de somente uma dose das vacinas pode não gerar a proteção esperada contra a covid-19 e ainda gerar desperdício

Funcionário segura frasco de CoronaVac: testes para detectar eficiência  (Amanda Perobelli/Reuters)

Funcionário segura frasco de CoronaVac: testes para detectar eficiência (Amanda Perobelli/Reuters)

RL

Rodrigo Loureiro

Publicado em 14 de janeiro de 2021 às 17h22.

Última atualização em 20 de janeiro de 2021 às 13h12.

A possibilidade da falta de doses de vacinas para a proteção contra o novo coronavírus levantou um questionamento entre virologistas de todo o planeta: a eficácia da aplicação de apenas uma dose da vacina que necessita de duas ou mais aplicações. Para especialistas brasileiros, a aplicação de somente uma dose pode até gerar uma certa segurança, mas ineficiente para garantir a proteção ideal contra o vírus SARS-CoV-2.

Os recentes questionamentos surgiram após preocupações de que pessoas podem não receber a segunda dose da vacina contra a covid-19 dentro do prazo estipulado para a vacinação ter o maior potencial de ser efetiva no combate contra o vírus. Vale lembrar que os índices de 94,1%, 95% e 50,4% das vacinas da Pfizer, Moderna e da CoronaVac, respectivamente, consideram a aplicação de duas doses feitas em intervalos corretos.

De acordo com Marco Antonio Stephano, professor da Faculdade de Ciências Farmacêuticas da Universidade de São Paulo, 23% das pessoas que receberem somente a primeira dose da vacina podem não estar protegidas contra a covid-19. “Este é um percentual da população que já não responde bem à aplicação de qualquer vacina por uma característica genética. Sem a segunda dose, essas pessoas ficam mais suscetíveis à infecção”, afirma.

Stephano ainda estima que os outros 77% que aplicarem somente uma das doses dos imunizantes podem continuar a transmitir o vírus ou a desenvolver a doença na condição de necessidade de atendimento hospitalar, o que comprometeria de forma grave o plano de imunidade e rebanho.

“Se o indivíduo toma a primeira dose da vacina, mas não toma a segunda, ele corre o risco de não desenvolver uma resposta imunológica contra aquele agente agressor”, diz Raphael Rangel, virologista e coordenador do curso de biomedicina do Instituto Brasileiro de Medicina e Reabilitação. “A primeira dose prepara o sistema imunológico e a segunda aumenta o potencial imunológico para a defesa contra aquele agente agressor."

Rangel explica que ao não tomar a segunda dose da vacina o indivíduo poderá não atingir o que os profissionais chamam de “imunidade duradoura”. “Além de ter uma resposta imunológica ineficiente, você pode ter um tempo de imunidade menor e ficar suscetível a uma reinfecção pela doença”, afirma. “A vacinação funciona como se fosse uma escola. Se você não passa em todas as matérias, você não termina o curso. Se você não tomar todas as doses, não ensina seu sistema imunológico a se defender.”

O relato dos especialistas vai em direção contrária ao posicionamento do ministro da Saúde, Eduardo Pazuello, que afirmou no começo desta semana que o governo pretende iniciar a vacinação contra a covid-19 com a aplicação de uma única dose do imunizante da AstraZeneca produzido em parceria com a Universidade de Oxford. Segundo o ministro, a aplicação de uma única dose permitiria a proteção de 71% e de duas doses acima de 90%.

“Isso não pode ser feito”, afirma Stephano. “Uma campanha de vacinação é iniciada após estudos clínicos e com base no que foi analisado e autorizado pela Anvisa. Se o estudo indica a eficácia com duas doses, não faz sentido que seja permitida a vacinação com apenas uma dose”, afirma o pesquisador que está envolvido no desenvolvimento de uma vacina contra a covid-19 aplicada por spray nasal.

“O governo precisa garantir a segunda dose assim que as pessoas receberem a primeira dose”, diz Rangel. Caso o governo não tenha a segunda dose, o virologista explica que o Ministério da Saúde e a Anvisa precisam informar a população sobre o prazo final da aplicação da segunda dose do imunizante e, caso necessário, para uma nova aplicação da primeira dose da vacina como forma de “reativar” o sistema imunológico e prepará-lo novamente para a segunda aplicação.

Stephano ainda diz que, com base na falta de evidências de que a aplicação de somente uma das doses do imunizante possa garantir a eficácia na proteção e na possibilidade de impedir a transmissão do vírus, a imunização feita somente com uma das doses da vacina pode gerar um desperdício. “Não se sabe qual a eficácia com a aplicação de somente uma dose, não há estudos”, diz.

A possibilidade de problemas pela falta de doses de vacinas não é exclusiva do Brasil. No começo do ano, o governo do Reino Unido iniciou uma discussão com o objetivo de aumentar o intervalo de aplicação entre as doses da vacina da Pfizer com a BioNTech para até 12 semanas (84 dias). A Organização Mundial da Saúde recomenda que o imunizante tenha sua segunda dose aplicada em até seis semanas após a primeira (42 dias).

 

De 0 a 10 quanto você recomendaria Exame para um amigo ou parente?

 

Clicando em um dos números acima e finalizando sua avaliação você nos ajudará a melhorar ainda mais.

 

Acompanhe tudo sobre:AstraZenecaCoronavírusMinistério da SaúdePfizerSinovac/CoronavacUniversidade de Oxfordvacina contra coronavírusVacinas

Mais de Ciência

Cientistas constatam 'tempo negativo' em experimentos quânticos

Missões para a Lua, Marte e Mercúrio: veja destaques na exploração espacial em 2024

Cientistas revelam o mapa mais detalhado já feito do fundo do mar; veja a imagem

Superexplosões solares podem ocorrer a cada século – e a próxima pode ser devastadora