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Um brasileiro no grid da F1: Gil de Ferran

Campeão da Indy e das 500 Milhas, brasileiro coordena trabalho da McLaren na F1 e é o “coach” de Fernando Alonso na busca da tríplice coroa em 2019

Gil de Ferran, diretor esportivo da McLaren, em Xangai, China: ex-piloto brasileiro quer ajudar Fernando Alonso (Mark Thompson/Getty Images)

Gil de Ferran, diretor esportivo da McLaren, em Xangai, China: ex-piloto brasileiro quer ajudar Fernando Alonso (Mark Thompson/Getty Images)

Guilherme Dearo

Guilherme Dearo

Publicado em 18 de maio de 2019 às 06h00.

Última atualização em 18 de maio de 2019 às 06h00.

O Brasil não conta com representantes no grid da Fórmula 1 desde o ano passado, mas isso não impede que o talento brasileiro seja bem representado na principal competição de esporte a motor do mundo. Conhecido por suas vitórias na Indy, incluindo a famosa 500 Milhas de Indianápolis, Gil de Ferran é o diretor esportivo da McLaren, equipe célebre pelos três títulos de Ayrton Senna (1988, 1990 e 1991) e também pela vitoriosa campanha de Emerson Fittipaldi em 1974.

Além de comandar o time da F1, o brasileiro ainda tem como importante missão em 2019 ajudar o bicampeão mundial Fernando Alonso a conquistar a tríplice coroa do automobilismo nas 500 Milhas deste ano, que serão disputadas daqui duas semanas, em Indianápolis.

Caso vença a prova disputada no oval mais famoso do mundo, o espanhol se iguala a Graham Hill, até hoje o único homem do planeta a ter vencido o GP de Mônaco da F1, a Indy-500 e as 24 Horas de Le Mans. Alonso estreou em Indianápolis em 2017, mas agora volta à pista com a chance de fazer história e terá como estrutura uma equipe própria da McLaren.

EXAME conversou com exclusividade com Gil de Ferran, que será o “coach” de Alonso nesta jornada. O brasileiro falou da presença brasileira na McLaren, que inclui o piloto de testes Sergio Sette Câmara e a parceria com a Petrobras, e também sobre os desafios do time em 2019 tanto na Indy quanto na F1.

Confira:

EXAME - É uma memória muito grande para os brasileiros essa ligação entre a McLaren e Ayrton Senna. E você teve também a oportunidade de ganhar as 500 Milhas e representar o Brasil. Como era para você ver o Ayrton ganhando e também ter a possibilidade de ver ele nas pistas?

Gil de Ferran - Olha, eu acho que para a grande maioria dos pilotos - não só brasileiros e, de certa maneira, para jovens também – eu acho que o Ayrton foi uma grande inspiração. Não só pelos grandes resultados que ele teve nas pistas, mas por ser quem ele era. Pela atitude que ele tinha, como ele vivia a vida dele, como ele enfrentava os desafios da vida, no trabalho. Ele realmente nos inspirou muito, principalmente pelo lado da dedicação e do trabalho. Ele me inspirou muito nesse sentido.

Você foi campeão de Fórmula 3 Inglesa, um titulo que ele também conquistou antes de ir para a Fórmula 1. Como é que, na época, foi para você atingir esse mesmo recorde que ele?

Foi fantástico. Na época, principalmente, o título da F-3 era de muito prestígio. Para te falar a verdade, foi uma das coisas mais importantes que aconteceu na minha carreira, que ajudou a lançar minha carreira de piloto no cenário internacional. Foi um momento muito importante na minha vida.

Falei com alguns pilotos contemporâneos seus, como o Rubens Barrichello e o Christian Fittipaldi, e eles têm várias histórias do Ayrton. Agora, você, nós sabemos que você é um cara mais reservado. Que história que você lembra que você possa contar? Ou mesmo de admiração que você possa contar?

Olha, vou te contar uma história. Eu, no começo da minha carreira, conheci ele antes de eu ir para a Europa. Aí tive a oportunidade de conversar com ele algumas vezes e com o pai dele também, que é uma pessoa fantástica. Eu me lembro de falar uma coisa que ficou gravada na minha cabeça. Eu tinha uns 19 anos de idade ou 18 anos. Ele falou: “Olha, você tem que procurar uma equipe que colo responsabilidade nos seus ombros”. Talvez seja difícil para as pessoas entenderem isso, mas eu entendi bem aquilo na época. Ou seja, se coloque numa posição onde o resultado depende mais de você do que de qualquer outra coisa. Seja o que estiver acontecendo com o carro ou com a equipe, você como piloto ainda tem uma responsabilidade muito grande sobre a performance do final de semana.

E como é que você hoje, como diretor esportivo, traz isso para a McLaren?

Esse senso de responsabilidade pessoal sobre seus atos, sobre a performance, é uma coisa que cresceu comigo e faz parte do meu dia a dia e de como eu penso sobre as coisas. A disciplina, o trabalho e de tentar fazer o melhor possível dia a dia.

Como é que o Ayrton ainda inspira as pessoas da McLaren? Você encontra pessoas que trabalharam com o Ayrton, que viveram essa história?

Encontra e eu acho que o Ayrton foi uma das figuras que fez a McLaren o que ela é hoje. Acho que várias grandes pessoas e personalidades contribuíram para a história da McLaren.

Como o Ayrton emociona ainda as pessoas que trabalham na McLaren mesmo 25 anos depois?

Ele realmente é uma das pessoas que ajudou a construir a história da McLaren e sua história está sempre presente no MTC (McLaren Technology Centre). Todo dia que eu chego lá, no Boulevard, os carros dele estão lá e passo por eles antes de ir para o meu escritório. Agora tem até uma estátua lá que foi feita para ele. Além de muitas fotografias e memórias da carreira dele. Ele sempre estará presente. Para aqueles da minha geração, eu me lembro como se fosse ontem do Senna correndo. Lembro dele fazendo testes em Silverstone com a McLaren em 1988, eu ainda era menino. Fui andando até chegar na pista porque eu não tinha carro na época. É muito fácil você se emocionar com a história do Ayrton.

Essa herança brasileira está presente em você, na Petrobras e no Sérgio Sette Câmara. Como é essa participação brasileira na McLaren?

Para mim é uma honra estar na posição que eu estou dentro da McLaren. É um trabalho que eu adoro e tem muito a ver com a minha experiência dentro do automobilismo e meus interesses pessoais e intelectuais. E eu estou me divertindo e estar com a Petrobras no carro, uma empresa brasileira de peso global, e ter uma marca como esta em nosso carro, é fantástico. O Sérgio é um piloto jovem com bastante talento. Ele está despontando como um piloto promissor: estamos tentando dar o melhor suporte possível para ele. Ele está embarcando em mais uma temporada de Fórmula 2 e estamos na torcida por ele.

O que é mais difícil: pilotar ou gerenciar uma equipe?

Tem similaridades e diferenças. Quando você está dentro do cocpkit, existem algumas diferenças. Dentro do cockpit é o seu mundo, você está controlando o carro e muitas coisas. Mas o trabalho fora do cockpit tem muita similaridade, ainda como piloto, com o que eu faço hoje. Quando você é piloto, você também tem uma responsabilidade de liderar a equipe, de acertar o foco do time e ser agregador de pessoas. É muito do que eu faço hoje no meu dia a dia. Eu ajudo a determinar prioridades e preciso sempre entender a dinâmica das pessoas. Mesmo quando eu era piloto, eu sempre fui atento com organização e com todos esses processos. Você rapidamente entende que sozinho você não vai conseguir nada. Com o foco certo, engajada e motivada, a equipe será competitiva. E o piloto tem um certo papel a cumprir nessa fonte.

Você vê o Fernando Alonso com esse perfil para ele buscar a Tríplice Coroa?

Eu adoro o Alonso. Eu gosto dele como pessoa, tenho um respeito muito grande por ele como piloto. Estamos aí embarcando em mais uma aventura. Toda vez que você coloca o Alonso em um cockpit, com um volante na frente e quatro rodas, sempre tem possibilidade de vitória. Eu acho ele um dos melhores pilotos da história. Ele é um cara espetacular e fora de série. Partindo desse princípio, sempre temos chances. Mas é a primeira vez que vamos participar das 500 Milhas de Indianápolis com o nome da McLaren. Então temos que ter calma e humildade. Se eu te mostrar o número de emails e coisas que preciso resolver que estão acontecendo, todo o trabalho por trás, realmente é um esforço enorme que faremos.

Você teve a experiência de ganhar as 500 Milhas. Como piloto, você acredita que foi o auge da sua carreira?

Como piloto eu dou mais valor para os campeonatos do que para as 500 Milhas, embora o título das 500 Milhas tenha muito mais prestígio no mundo do automobilismo. Eu fui duas vezes campeão da Indy, então de certa maneira eu ponho mais peso nisso. Nas 500 Milhas, muita coisa pode acontecer, é uma corrida única. No campeonato, você é o melhor dentro de um período muito grande.

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