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Primeira noite de desfiles no Rio foi do inferno ao paraíso

A noite começou com um acidente grave e raro com um carro alegórico do Paraíso do Tuiuti, que deixou 20 feridas

Desfile da Salgueiro: a Grande Rio entrou na avenida ainda sob o impacto do acidente, mencionado por seu presidente ao microfone, Milton Perácio (v/Reuters)
EC

Estadão Conteúdo

Publicado em 27 de fevereiro de 2017 às 09h33.

Rio - A primeira noite de desfiles do Grupo Especial do Rio teve momentos de genialidade carnavalesca e de tristeza e revolta.

Tal qual cantou o Salgueiro, um dos destaques da noite, graças ao enredo original e bem desenvolvido do casal de criadores Marcia e Renato Lage, a Sapucaí foi do inferno ao paraíso.

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A noite começou com um acidente grave e raro com um carro alegórico do Paraíso do Tuiuti, que imprensou contra a grade do setor 1 pessoas que estavam na pista, deixando 20 feridas, uma delas com risco de amputação de uma das pernas, e terminou com a bela apresentação da Beija-Flor, com sua visão poética do romance entre a índia Iracema e o português Martim Soares.

O insólito acidente foi causado por uma manobra equivocada do motorista do sexto e último carro do Tuiuti, que estava apressado, uma vez que a escola corria contra o tempo para fechar sua apresentação nos 75 minutos regulamentares (esse ano, o tempo de cada agremiação foi encurtado em sete minutos, para dinamizar o espetáculo).

Ele entrou torto na avenida, o carro se desgovernou e foi para cima de jornalistas que cobriam o desfile no setor 1 e outros profissionais de serviço.

O público do setor 1, por trás das grades, se apavorou, e começou a subir as arquibancadas, com medo de ser ferido.

"Todo mundo ficou gritando, desesperado, achando que o carro ia invadir. Mas o som estava alto e ninguém nos ouvia", relatou, ainda sob susto e revolta, o estudante Júlio Araújo, de 21 anos.

Ato contínuo, o motorista tentou reverter o erro e acabou acelerando na direção do setor 2, machucando também quem estava lá.

-(Ricardo Moraes/Reuters)

Já houve casos de carros sem controle na pista, mas, em 33 anos de sambódromo, nunca um acidente deixou feridos como dessa vez.

A fotógrafa Cacau Fernandes, de 48 anos, estava fotografando o carro de frente, e teve uma distensão do ligamento dos ombros.

"Eu achei que fosse morrer, não posso descrever a sensação. O pessoal do carro começou a se estapear para ver de quem tinha sido o erro e nós, feridos", ela contou, por telefone, depois de ter alta do Hospital Miguel Couto, no Leblon.

Uma outra jornalista, Lucia Melo, foi operada, e corria o risco de ter a perna esquerda amputada.

Um outro ferido, o médico Marcos Antônio Nachef, afirmou que iria buscar na Justiça indenização por seus ferimentos no quadril, esmagado contra a grade.

A Grande Rio entrou na avenida ainda sob o impacto do acidente, mencionado por seu presidente ao microfone, Milton Perácio.

-(Ricardo Moraes)

A escola homenageou a cantora Ivete Sangalo, que conquistou o público em suas duas aparições: ela saiu com bailarinos já na comissão de frente, que representava de sua infância, na cidade Juazeiro, à glória, como uma das cantoras mais populares do País, e também no último carro alegórico, um símbolo do encontro dela com a Grande Rio.

"Foi muita emoção, uma oportunidade única", disse Ivete, depois do desfile.

"Fui cercada de amor desde o momento em que fui convidada para fazer parte desta escola, e quis sair na comissão para me envolver. A gente ensaiou com muito amor."

Ivete "levantou poeira" no sambódromo, mas a Grande Rio ficou para trás quando surgiram a Imperatriz, o Salgueiro e a Beija-Flor.

A Imperatriz levou o enredo "Xingu, o clamor da festa", de exaltação à cultura indígena e clamor pela preservação da natureza, e mostrou que era infundado o temor que o setor do agronegócio demonstrou no pré-carnaval - entidades do estado do Mato Grosso se manifestaram contra a escola, alegando que o enredo traria informações que "manchariam a imagem" desta atividade econômica.

-(Sergio Moraes)

Na sequência, desfilou a Vila Isabel, com o enredo "O Som da Cor". A Azul e Branca cantou a influência dos negros na música das Américas.

O belo samba contagiou as arquibancadas, mas a escola pecou em fantasias e alegorias - o acabamento ruim era visível no último carro, em que Martinho da Vila veio de rei.

A apoteose viria com os dois últimos desfiles, o do Salgueiro e o da Beija-Flor. A Vermelha e Branca fez uma apresentação memorável, apoiada no samba, um dos melhores do ano, e na força de seu enredo.

"A divina comédia do carnaval" foi baseado na obra de Dante Alighieri e, como prometido em seu hino, tingiu a avenida de vermelho e branco. As cores salgueirenses simbolizavam o inferno, cheio de seres endiabrados e tomados pela luxúria, e o céu, de flores e divindades africanas. Três carnavalescos que integram o olimpo do carnaval carioca, Arlindo Rodrigues, Fernando Pamplona e Joãosinho Trinta, foram representados no último carro, "O orum de todos os deuses".

-(Pilar Olivares)

A plateia da Sapucaí, independentemente da bandeira de preferência, fez ecoar o verso-chave, "essa paixão que encanta o mundo inteiro / só entende quem é Salgueiro".

A Beija-Flor se esmerou nas fantasias e carros alegóricos, como de costume, e o samba foi cantado em bom som pelos componentes.

-(Ricardo Moraes)

Os carnavalescos, por conta da crise econômica e do enredo indígena, usaram materiais menos luxuosos do que de costume, como a palha, a cestaria e a madeira, com bom gosto e cuidado nos detalhes - caso das perucas negras usadas por quase todos os componentes fantasiados de índios e das peças de artesanato com referência ao Ceará, a terra de José de Alencar e de sua Iracema.

A novidade das alas com fantasias diferentes para os desfilantes, como se fossem tribos, teve efeito visual interessante. O senão foi a repetição de índios e mais índios e animais da floresta. Para quem já havia visto os da Imperatriz e resistia ao cansaço e ao dia claro, ficou repetitivo.

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