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O som ao redor de “Django Livre”

As polêmicas, a violência e o humor do mais novo filme de Quentin Tarantino

Cena do longa Django Livre de Tarantino: poucos diretores se dedicam tanto a tornar suas trilhas tão definitivas quanto seus planos com a câmera na mão (Divulgação)
DR

Da Redação

Publicado em 21 de janeiro de 2013 às 10h04.

São Paulo - My skin is black/My arms are long/My hair is woolly/My back is strong/Strong enough to take the pain. Nina Simone nunca saberá, mas Broomhilda (Kerry Washington), esposa do vingativo escravo Django (Jamie Foxx), encarna todas as personalidades descritas em sua canção Four Women no mais novo petardo de Quentin Tarantino, que estréia nos cinemas brasileiros nesta sexta-feira (18). Django Livre, você sabe, segue a linha de Bastardos Inglórios, com o diretor reconstruindo a história a partir da sua cabeça em eterno estado de ebulição.

Poucos se dedicam tanto a tornar suas trilhas tão definitivas quanto seus planos com a câmera na mão. Vale tudo para chegar à sonoridade ideal. Até mesmo criar uma parceria entre o funk de James Brown e o gangsta rap de 2Pac em Unchained (The Payback/Untouchable). Acrescente aí quatro faixas de Ennio Morricone, o compositor definitivo dos chamados spaghetti western. Há ainda colaborações de John Legend (Who Did That to You?), Rick Ross (100 Coffins, produzida e interpretada pelo protagonista Jamie Foxx) e a bela Freedom, de Hamilton e Elayna Boynton, primeira música original para um filme de Tarantino.

Mas o som – justo ele – também está na berlinda. É que a ferocidade da palavra nigger tem causado rebuliço ainda maior que o estalo das chibatas. Aos ouvidos de Spike Lee, conhecido tanto pela militância pelos direitos dos negros quanto por seus filmes, a tal the n word soa suja demais. Lee também não viu graça nenhuma na escravidão se tornar um sangrento faroeste nas mãos do companheiro de profissão.

Há discordâncias, claro. Samuel L. Jackson, que encarna magistralmente um escravo doméstico dedicado a seu senhor branco (Calvin Candie, interpretado por um inspirado Leonardo DiCaprio) e cruel com seus pares de origem africana, enxerga a questão de forma diferente. Stephen, o personagem de Jackson, está entre os que mais empregam a palavra maldita no filme – se não for o recordista nas mais de duras de longa. Em entrevista que antecedeu o lançamento oficial do título, o ator ficou irado com a tentativa de ser polido do jornalista que o interpelava. Aos gritos, cobrou que o entrevistador dissesse nigger com todas as letras. Não conseguiu.


Como o sangue que jorra sem dó inúmeras vezes, a metralhadora giratória de cineasta que sacode os Estados Unidos a cada novo trabalho não polpa ninguém de seu sarcasmo infernal. A aristocracia vira alvo quando Django, recém liberto, decide se vestir como um barão europeu. É nas mãos de Tarantino também que o Ku Klux Klan vira troça na hilária sequência em que o fazendeiro branco Spencer ‘Big Daddy’ Bennett (Don Johnson) tenta eliminar Dr. King Schultz (Christoph Waltz, favorito a mais um Oscar com ator coadjuvante) e seu sócio negro na busca por recompensas. Aliás, essa talvez seja a melhor sessão de humor que o autor de Kill Bill e Pulp Fiction filmou até hoje.

Querendo ou não, a ousadia em jogar o racismo, a segregação e a escravidão de volta no colo da sociedade americana quando tudo parece correr tão bem (Barack Obama foi reeleito, não é mesmo?) rendeu frutos. A mistura entre as linguagens criadas por mestres italianos como Sergio Leone e Sergio Corbucci com o cinema alternativo e de baixo custo da blaxploitation dos anos 1970 já faturou dois Globos de Ouro (melhor roteiro original e melhor ator coadjuvante) e ainda concorre a cinco estatuetas do Oscar, incluindo melhor filme, roteiro e edição de som (olha ele aí…).

A verdade é que a imensa quantidade de ruídos paralelos antes mesmo da estreia da película foi capaz de tirar o diretor do sério. Em entrevista para um canal inglês de televisão, um Tarantino irritado se recusou a responder sobre o uso da violência em Django. Eu não sou seu escravo e você não é meu mestre. Você não pode me obrigar a dançar no seu ritmo, afirmou rispidamente. É que o autor, assim como seu improvável e apaixonado herói negro, está mais livre do que nunca. E pensando em Hollywood, isso deve ser comemorado.

https://youtube.com/watch?v=B5sks1-EGfw

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São Paulo - My skin is black/My arms are long/My hair is woolly/My back is strong/Strong enough to take the pain. Nina Simone nunca saberá, mas Broomhilda (Kerry Washington), esposa do vingativo escravo Django (Jamie Foxx), encarna todas as personalidades descritas em sua canção Four Women no mais novo petardo de Quentin Tarantino, que estréia nos cinemas brasileiros nesta sexta-feira (18). Django Livre, você sabe, segue a linha de Bastardos Inglórios, com o diretor reconstruindo a história a partir da sua cabeça em eterno estado de ebulição.

Poucos se dedicam tanto a tornar suas trilhas tão definitivas quanto seus planos com a câmera na mão. Vale tudo para chegar à sonoridade ideal. Até mesmo criar uma parceria entre o funk de James Brown e o gangsta rap de 2Pac em Unchained (The Payback/Untouchable). Acrescente aí quatro faixas de Ennio Morricone, o compositor definitivo dos chamados spaghetti western. Há ainda colaborações de John Legend (Who Did That to You?), Rick Ross (100 Coffins, produzida e interpretada pelo protagonista Jamie Foxx) e a bela Freedom, de Hamilton e Elayna Boynton, primeira música original para um filme de Tarantino.

Mas o som – justo ele – também está na berlinda. É que a ferocidade da palavra nigger tem causado rebuliço ainda maior que o estalo das chibatas. Aos ouvidos de Spike Lee, conhecido tanto pela militância pelos direitos dos negros quanto por seus filmes, a tal the n word soa suja demais. Lee também não viu graça nenhuma na escravidão se tornar um sangrento faroeste nas mãos do companheiro de profissão.

Há discordâncias, claro. Samuel L. Jackson, que encarna magistralmente um escravo doméstico dedicado a seu senhor branco (Calvin Candie, interpretado por um inspirado Leonardo DiCaprio) e cruel com seus pares de origem africana, enxerga a questão de forma diferente. Stephen, o personagem de Jackson, está entre os que mais empregam a palavra maldita no filme – se não for o recordista nas mais de duras de longa. Em entrevista que antecedeu o lançamento oficial do título, o ator ficou irado com a tentativa de ser polido do jornalista que o interpelava. Aos gritos, cobrou que o entrevistador dissesse nigger com todas as letras. Não conseguiu.


Como o sangue que jorra sem dó inúmeras vezes, a metralhadora giratória de cineasta que sacode os Estados Unidos a cada novo trabalho não polpa ninguém de seu sarcasmo infernal. A aristocracia vira alvo quando Django, recém liberto, decide se vestir como um barão europeu. É nas mãos de Tarantino também que o Ku Klux Klan vira troça na hilária sequência em que o fazendeiro branco Spencer ‘Big Daddy’ Bennett (Don Johnson) tenta eliminar Dr. King Schultz (Christoph Waltz, favorito a mais um Oscar com ator coadjuvante) e seu sócio negro na busca por recompensas. Aliás, essa talvez seja a melhor sessão de humor que o autor de Kill Bill e Pulp Fiction filmou até hoje.

Querendo ou não, a ousadia em jogar o racismo, a segregação e a escravidão de volta no colo da sociedade americana quando tudo parece correr tão bem (Barack Obama foi reeleito, não é mesmo?) rendeu frutos. A mistura entre as linguagens criadas por mestres italianos como Sergio Leone e Sergio Corbucci com o cinema alternativo e de baixo custo da blaxploitation dos anos 1970 já faturou dois Globos de Ouro (melhor roteiro original e melhor ator coadjuvante) e ainda concorre a cinco estatuetas do Oscar, incluindo melhor filme, roteiro e edição de som (olha ele aí…).

A verdade é que a imensa quantidade de ruídos paralelos antes mesmo da estreia da película foi capaz de tirar o diretor do sério. Em entrevista para um canal inglês de televisão, um Tarantino irritado se recusou a responder sobre o uso da violência em Django. Eu não sou seu escravo e você não é meu mestre. Você não pode me obrigar a dançar no seu ritmo, afirmou rispidamente. É que o autor, assim como seu improvável e apaixonado herói negro, está mais livre do que nunca. E pensando em Hollywood, isso deve ser comemorado.

https://youtube.com/watch?v=B5sks1-EGfw

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