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Alex Atala surpreende com pratos 'à moda de Pollock'

Na cozinha, território de sua arte, o chef brinca com os ingredientes como o pintor norte-americano manejava a tinta

Composições em seus pratos são de rigor estético indiscutível (Agliberto Lima/Veja SP)

Composições em seus pratos são de rigor estético indiscutível (Agliberto Lima/Veja SP)

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Da Redação

Publicado em 15 de junho de 2012 às 09h57.

São Paulo - Alex Atala se debruça sobre um prato que acaba de chegar à bancada. Ao centro, estão enrolados os fios do fettuccine de palmito pupunha que o braço direito Geovane Carneiro moldou cuidadosamente em um garfo e soltou na louça branca de forma que continuassem empilhados mesmo sem a presença do talher.

Atala então analisa a peça: gira-a 45 graus para a direita, 45 graus para a esquerda, com ritmo, em uma coreografia bem marcada, mas que ele hoje abre para improvisos. Pega então um recipiente de plástico com um molho de manteiga e sálvia, ajusta os óculos para hipermetropia no rosto e vai desenhando traços com o caldo sobre as lascas de palmito.

“Parecem mesmo uma massa, não?”, pergunta Atala entre a provocação e o riso. Não são. Ele batizou assim a receita para justamente ressaltar esse jogo de ilusão. Durante a conversa, um fio de seu fettuccine sai do lugar.

Do bolso no lado esquerdo do uniforme de chef, tira uma pinça e conserta a pilha. Chega a vez da farofa de pipoca. Quando começou a cozinhar, Atala a colocava em um aro de alumínio para que ficasse com o formato redondo certinho na composição. Tinha um estilo mais clássico, digamos assim.

Renascentista, talvez. Atualmente, à maneira de um expressionista abstrato – Jackson Pollock? – valoriza o gesto. Como Pollock, que manejava os pincéis e tubos de tinta para deixar seu movimento evidente na tela, Atala, com a colher cheia, vira o punho e a farofa fica do jeito que cai sobre o prato.

Por sua disposição, é quase possível refazer mentalmente o gesto rápido de seu braço. Atala afasta então os dois pés da bancada. Com um pedaço de papel toalha, limpa as lentes embaçadas dos óculos pelo calor da cozinha. Gira de novo a louça: 45 graus para a direita, 45 graus para a esquerda. Tudo no lugar.

Debruçado novamente sobre o prato, com outra folha de papel toalha na mão, limpa suas bordas. E então o libera para o salão do D.O.M., o restaurante paulistano que neste ano ocupa o sétimo lugar entre os melhores do mundo na lista da cultuada revista britânica Restaurant.

Alex Atala, o número um no Brasil, personifica tudo o que caracteriza um chef-artista. Está sempre repensando seu trabalho. Está sempre em busca de novos sabores, principalmente os da Região Norte do Brasil, ou de formas originais para apresentar ingredientes conhecidos.

Naquela segunda-feira de outubro, na hora do almoço, enquanto ele finalizava o fettuccine de palmito pupunha na bancada envidraçada, na frente dos clientes, um cozinheiro de sua equipe cortava rabanetes em um canto mais escondido da cozinha: “Vamos testar um jeito de servi-los meio congelados, como se fossem cristais.


Talvez dê certo”. Atala alia a mais sofisticada técnica, que diz ser muito fundamentada no ensaio O Cru e o Cozido, escrito pelo filósofo francês Claude Lévi-Strauss em 1964, ao mais puro instinto criativo. E, com composições de rigor estético indiscutível, aproxima-se do universo da arte, algo de que ele também gosta.

Ramone e Hello Kitty

Abandonar a maneira certinha de arrumar a farofa no prato talvez tenha a ver com esse seu lado. O chef paulistano conta que admira cada vez mais a produção contemporânea na área de artes visuais. Logo à entrada do D.O.M., está uma escultura de madeira preta, cheia de ângulos, assinada por Emanoel Araújo.

E a fotografia em preto-e-branco de Fausto Chermont, com o gráfico caminho de palmeiras do Jardim Botânico carioca. Na mesa redonda ao centro do restaurante, vê-se ainda um livro sobre Portinari. Atala, como não poderia deixar de ser, gosta também de arte popular.

Espalham-se pelo D.O.M. cocares indígenas enquadrados, animais esculpidos em madeira, mas o que mais chama a atenção são os quatro bugres enfileirados em uma prateleira na cozinha: “São da dona Conceição dos Bugres, uma senhora autodidata. O contemporâneo e o popular são minhas referências”.

Todas as obras do restaurante foram escolhidas pelo chef. A exceção é as que estão na bancada da cozinha: um boneco do cantor Joey Ramone – “Meu filho que me deu” –, um da Hello Kitty – “Esse foi minha filha” –, estátuas de são Jorge e santa Marta, olho grego, mão de Hamesh, alguns do próprio Atala e outros presentes de amigos.

Organizado pelo dono, no entanto, o altar sincretista exibe um equilíbrio estético impecável. Como as tatuagens que tem pelo corpo. Ele arregaça as mangas do uniforme: “Você diria que são 40, 50? Perdi a conta”.

Sobre a pele, fez desenhos de um cristal, uma cruz, um peixe, eternizou as letras do D.O.M. Tudo combina. E não é essa a sensação que se tem diante de um de seus pratos? O fettuccine de palmito pupunha, por exemplo?

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