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A dura vida da alta cozinha

Tom Cardoso  Eles lideram, por anos, as listas dos melhores restaurantes do país por causa da excelência gastronômica, raramente contestada. A despeito do sucesso, porém, muitos desses restaurantes estrelados não conseguem sobreviver em períodos de crise, fechando as portas definitivamente ou passando o ponto. Um dos casos mais emblemáticos ocorreu com o La Brasserie, o […]

ANTIQUARIUS: aberto em 1977, o restaurante perdeu 35% do movimento por causa da crise econômica  / Veja Rio

ANTIQUARIUS: aberto em 1977, o restaurante perdeu 35% do movimento por causa da crise econômica / Veja Rio

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Da Redação

Publicado em 15 de agosto de 2016 às 14h48.

Última atualização em 22 de junho de 2017 às 18h16.

Tom Cardoso 

Eles lideram, por anos, as listas dos melhores restaurantes do país por causa da excelência gastronômica, raramente contestada. A despeito do sucesso, porém, muitos desses restaurantes estrelados não conseguem sobreviver em períodos de crise, fechando as portas definitivamente ou passando o ponto. Um dos casos mais emblemáticos ocorreu com o La Brasserie, o premiado restaurante francês comandado por Érick Jacquin, que, depois de acumular dívidas de mais de 1 milhão de reais – entre falta de pagamentos a fornecedores e ações de ex-funcionários na Justiça –, deixou de funcionar em 2013.

Quem está na berlinda agora é a família Perico, proprietária do Antiquarius, o mais tradicional restaurante português do Brasil, aberto em 1977 por Carlos Perico, morto em junho, aos 81 anos. Seu herdeiro, Carlos Perico Filho, assumiu o restaurante em meio à atual crise econômica: o movimento caiu mais de 35% e não há perspectiva de melhora no curto prazo. A família estuda duas saídas: passar o ponto para um novo proprietário, já interessado, ou expandir os negócios, comercializando produtos próprios para driblar a crise — algo até então impensável para o badalado português do Leblon, sempre lotado.

Para Perico Filho, ele tem de lidar com o maior dos problemas: restaurantes com o perfil do Antiquarius não podem se sujeitar a grandes alterações conceituais. Baixar o preço no cardápio, por exemplo, significaria uma automática mudança na qualidade dos pratos, seu grande diferencial. Ele também não tem como conquistar novos clientes. “Quem está ganhando novos clientes — os meus — são os restaurantes que baixaram de preço”, diz Perico. “A pessoa deixa de comer no Antiquarius, no Fasano, para comer num restaurante mais em conta. Na crise, quem escolheria o caminho contrário?”

Diante do impasse, Perico Filho deve optar por uma saída que nunca agradou ao pai: vender o Antiquarius — já existe uma proposta na mesa. A alternativa seria comercializar produtos (como o queijo fabricado no próprio restaurante, por exemplo), criando a marca Antiquarius, também em sociedade com um investidor. “Estamos estudando as duas propostas. Não há nada resolvido ainda. Quem sabe a economia não começa a melhor um pouco e continuamos do jeito que está”, diz Perico Filho.

O Brasil não é um país onde os restaurantes costumam ter vida longa. Não existe um levantamento preciso sobre a média de sobrevivência, mas, segundo Percival Maricato, presidente da Associação Brasileira de Bares e Restaurantes (Abrasel) e um dos grandes especialistas no tema — é autor do livro Como Montar e Administrar Bares e Restaurantes (Editora Senac), na nona edição —, a taxa de mortalidade é alta, sobretudo quando comparada à de outros países. “Se um restaurante aqui durar dez anos, já poderá ser considerado um sucesso. Só em casos raríssimos eles duram mais de 20”, afirma Maricato.

Ex-proprietário de bares e restaurantes (comandou, durante muitos anos, o já extinto Avenida, bar na região de Pinheiros, em São Paulo, que foi sucesso nos anos 90), Maricato diz que é praticamente impossível apontar um culpado por essa baixa taxa de sobrevivência dos restaurantes brasileiros. Para ele, é preciso levar em conta vários fatores, dos velhos problemas de sempre, que não atingem só donos de restaurantes, mas empresários em geral — como o custo Brasil, a insegurança jurídica e as leis onerosas e restritivas —, às dificuldades típicas do setor.

“É um segmento que depende muito de modismos, de tendências, que às vezes nem estão ligadas diretamente à gastronomia”, afirma Maricato. Não foi o caso do La Brasserie, de Érick Jacquin, que em sua fase final funcionou na região do Itaim, uma das mais valorizadas da cidade. Nunca lhe faltou cliente. Para o chef francês, até o mais bem-sucedido dos restaurantes está fadado ao fracasso no Brasil. “Se você é bom, faz sucesso, vão dar um jeito de cobrar um aluguel cada vez maior de você. O cliente quer levar o vinho de casa para gastar menos. O funcionário quer dar um jeito de ser demitido para ganhar uma grana. E o que sobra para o dono? Imposto em cima de imposto”, diz Jacquin, que hoje só aceita ser consultor. E olhe lá. “No Brasil, ser dono de restaurante é o pior negócio do mundo, uma fábrica de problemas.”

O consultor Enzo Dona, da ECD, especializada em food service, concorda que o Brasil não é um dos países mais atraentes para quem decide abrir um restaurante, mas diz que os empreendedores também têm sua parcela de culpa. “Não existe na indústria de restaurante no Brasil, sobretudo nos chamados ‘independentes’, que não estão ligados a grandes redes e são, em sua maioria, administrados por uma família, uma cultura de gestão”, afirma Dona. Para o consultor, as dificuldades do setor são conhecidas. A margem de lucro é uma das menores. E, justamente por esse histórico, todo dono de restaurante deveria, obrigatoriamente, fazer um curso de gestão. “O que acaba acontecendo é o contrário: ele acumula tantas funções que não consegue dar conta de nada direito. O primeiro culpado que ele aponta é o ‘custo Brasil’, sem perceber que ele mesmo não fez sua parte.”

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