Asheesh Advani, presidente da JA: "os jovens se lembrarão para sempre sobre como usamos a crise para mudar o mundo" (Divulgação/Divulgação)
Felipe Giacomelli
Publicado em 10 de junho de 2020 às 10h52.
O papel dos jovens será cada vez mais o de criar, e não o de procurar empregos. Essa é uma das principais lições que a pandemia do coronavírus vai deixar segundo avaliação da Junior Achievement, maior ONG global de apoio ao empreendedorismo jovem. Asheesh Advani, presidente da global da instituição, falou com a Exame em meados de maio sobre como a crise afeta a juventude, e sobre como deve moldar o futuro.
A instituição completou 100 anos em 2019 e está presente em mais de 100 países. Seus programas de intercâmbio e seus cursos focam em escolas de ensino básico e médio, e também em universidades. A JA, como é conhecida, prioriza o desenvolvimento de habilidades em empreendedorismo, futuro do trabalho e finanças. “O que nos distingue é que nossos programas são de experiência. O jovem não só aprende em um livro, mas sente o empreendedorismo na prática”, diz Advani.
Nos últimos anos, os projetos da instituição vinham ampliando o escopo de habilidades (como orçamento) para o de comportamentos. Agora, na crise, esse lado ganha especial relevância. “Os jovens podem, por exemplo, ajudar os pais que estão em aperto financeiro”, diz Advani. Outra mudança que vinha em curso e que agora se mostrou valiosa é a transformação digital. Nos últimos três anos a JA criou modelos online, que agora ganharam relevância.
No Brasil a instituição tem dois programas online: o estudante pode ter autonomia total dentro da plataforma, ou utilizar voluntários como mentores. Um projeto permite, por exemplo, criar uma startup em cinco semanas. O curso presencial era de oito semanas e o primeiro módulo online, com 100 estudantes, teve 98% de aceitação. O futuro do trabalho, como foco nas habilidades de futuro, é outra prioridade para a digitalização da JA. “Transformamos o voluntariado ‘face to face’ em online”, diz Bety Tichauer, diretora superintendente da JA no Brasil. Um desafio é trabalhar com jovens e crianças que não têm boa conexão com internet.
Mais de 10 milhões de crianças por ano participam de programas da instituição. Em 2019 foram 12,4 milhões, em 116 países. No brasil são 350.000 estudantes por ano – desde que chegou ao Brasil, em 1983, foram mais de 5 milhões de jovens. Um desses milhões é Pedro Englert, fundador da escola de negócios Startse, que participou de projetos com a JA entre 1995 e 1996. Hoje, ele é o primeiro ex-aluno conselheiro da instituição no Brasil. “O conhecimento hoje é muito mais acessível, está na palma da mão. Com um modelo mental e ferramentas voltadas ao empreendedorismo, os horizontes se ampliam como nunca”, diz.
Um ponto de especial atenção para a instituição é o impacto que a pandemia terá na forma como os jovens veem o mundo. “Sempre observamos uma resiliência muito grande dos jovens. Eles superam dificuldades. Agora, essa experiência vai marcar eles para sempre – eles vão lembrar para sempre não por como vivemos a crise, mas como usamos a crise para mudar o mundo”, diz Advani.
Entre as mudanças previstas estão a forma de abordar a sustentabilidade em todas as ações. Os jovens da JA nos últimos anos já criavam cada vez mais negócios focados não só em dinheiro, mas em ajudar o mundo, diz Advani. A importância do empreendedorismo de impacto deve crescer, na visão da instituição, com a eliminação de até 350 milhões de empregos durante a pandemia. “Mais do que nunca jovens pensarão em criar empregos, e não só em procurar empregos”, diz
Do lado negativo, porém, a crise pode abalar a globalização, reduzindo o respeito por outras culturas e fazendo com que as pessoas se voltem mais para dentro. A JA tem um papel de garantir que os valores globais continuem importantes, diz seu presidente global. “Espero que as crianças e os jovens sigam viajando, mas passem a dar mais valor a suas comunidades e apreciem o que tem. Vamos ter um mundo mais multipolar, e não necessariamente global”, diz.