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Ilha britânica tem a corrida mais perigosa do mundo

A morte de um competidor em junho eleva o número de mortes no evento de motociclismo para 144 desde seu início em 1907

Isle of Man Tourist Trophy: reta de chegada com o cemitério dos motociclistas ao fundo (Ian Walton/Getty Images)

Isle of Man Tourist Trophy: reta de chegada com o cemitério dos motociclistas ao fundo (Ian Walton/Getty Images)

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Da Redação

Publicado em 24 de junho de 2017 às 09h32.

Última atualização em 26 de junho de 2017 às 19h07.

Douglas, Ilha de Man – Aos 48 anos, Davey Lambert, de Gateshead, Inglaterra, morreu no começo de junho ao sofrer um acidente no Isle of Man Tourist Trophy, um evento anual de motociclismo. Quatro competidores morreram nas corridas do ano passado, outro morreu em 2015, e mais dois morreram no ano anterior.

Essas fatalidades elevaram o número de mortes no evento, conhecido como TT, para 144 desde seu início em 1907. Se incluirmos os acidentes fatais ocorridos durante o Manx Grand Prix, as corridas amadoras realizadas durante o verão na mesma pista, a Snaefell Mountain Course, o número de mortes chega a 250.

Por essas e outras razões a TT tem poucos paralelos no mundo dos esportes. A ideia de mortalidade está na base do evento. É ela que dá prestígio à corrida, torna-a tão emocionante, aterrorizante e, naturalmente, alvo de críticas. E é ela que coloca a ilha no mapa.

Essa também é a razão para que, por duas semanas todos os anos, esse rocha sonolenta no meio do Mar da Irlanda (com população de 88 mil pessoas) se transforme em um empolgante festival. Os organizadores convertem 60 quilômetros de vias públicas em uma enorme pista sinuosa, atraindo 40 mil visitantes, muitos trazendo suas motocicletas para se juntar aos fãs durante uma semana de treinos e outra de competições. Tudo culmina com a Senior TT, realizada este ano na sexta-feira, 9 de junho, feriado na Ilha de Man. (As escolas ficam sem aulas durante toda a semana de corridas.)

Durante as competições, as velocidades passam dos 320 quilômetros por hora. Todos os anos ocorrem acidentes. Quase todos os anos alguém morre.

Para os pilotos, a TT – certamente a corrida mais perigosa do mundo – representa o desafio máximo. Ainda assim, muitos dos melhores profissionais nunca chegam a colocar os pneus no asfalto da ilha. Eles saber que o menor erro pode ser fatal.

“Se Roger Federer perder uma jogada, ele só perde um ponto. Se eu perder uma curva, também perco minha vida”, afirmou Richard Quayle, que já venceu a TT.

Conor Cummins esperou alguns meses para assistir ao vídeo, e prefere nem assistir outra vez.

Filmado do alto, ele aparece ondulando pela Verandah, uma passagem de quatro curvas na montanha a 240 quilômetros por hora. À medida que se inclina para uma curva à direita, ele perde o controle e a moto escapa, deixando-o com as costas no chão, escorregando como se o asfalto fosse gelo.

Sem nada para desacelerar, ele sai da estrada, caindo violentamente pela encosta da montanha. Seu corpo se choca contra o chão e dá voltas no ar, como uma lata jogada pela janela de um carro em alta velocidade, finalmente parando em meio aos pedaços de sua motocicleta, muito longe de onde perdeu o controle.

Por mais terrível que seja, o vídeo do acidente ocorrido em 2010 já foi assistido milhões de vezes na internet. O pior momento da cidade de Cummins agora é um vídeo viral.

“Se eu recebesse uma libra a cada vez que esse vídeo fosse assistido, acho que estaria bem rico”, afirmou Cummins, de 30 anos, nativo da Ilha de Man, com quatro pódios no TT.

“É muito sádico. O que eu vivi foi um verdadeiro drama, não é? E acho que tem gente que gosta desse drama. Mas é verdade que foi uma batida espetacular. Isso eu não posso negar.”

Ele passou dois meses no hospital.

Ainda assim, no ano seguinte estava na TT, montado em sua moto, zunindo por Verandah.

Hilary Musson: ela estava vendo a corrida quando, após um acidente na pista, foi atingida por uma moto (Foto: Andrew Testa/ The New York Times)

Hilary Musson lembra-se de se vestir e subir as montanhas com a moto até chegar ao posto 26, onde era oficial de corrida uma década atrás. A próxima coisa da qual ela se lembra é acordar em um leito de hospital. Seu marido, John, contou que seis semanas haviam se passado desde que ela abriu os olhos pela última vez. Ela conta que olhou para a perna esquerda e não a encontrou.

“Há muitos acidentes durante as corridas, mas raramente envolvendo espectadores, oficiais e outros membros do público. Mas tinha que ser comigo”, afirmou Musson, de 70 anos, suspirando em sua mesa de jantar.

Musson conhecia os riscos. Em 1978, depois de anos competindo nas corridas locais, ela se tornou a segundo mulher a completar a TT, pondo fim a 16 anos de proibição de mulheres na competição. Chegou em 15° lugar, uma posição atrás do marido.

No dia do acidente – 7 de junho de 2007 – um piloto que passava em alta velocidade pela montanha bateu em um poste e morreu na hora. Sua motocicleta, um míssil de 180 quilos, ziguezagueou pelo asfalto em direção aos espectadores. Duas pessoas morreram e dois oficiais, incluindo Musson, ficaram gravemente feridos.

O colete que ela estava usando naquela manhã, que guarda até hoje, tem uma marca de pneu nas costas.

“As pequenas empresas da cidade contam com a TT e, sem dúvida, é a corrida que permite que muitas empresas continuem abertas o ano todo”, afirmou Steve Christie, de 46 anos, um dos gerentes do Creg-Ny-Baa, um pub famoso no percurso.

Nos anos 1960 e 70, os turistas enchiam os hotéis, restaurantes e lojas da Ilha de Man e por algumas semanas todos os anos, a ilha se lembra de seu passado glorioso. No ano passado, o governo registrou mais de 42 mil pessoas de mais de 40 países na ilha durante a TT de 2016. Os turistas gastaram cerca de US$40 milhões lá.

Christie conta que o Creg faz cerca de um terço de suas vendas anuais durante as semanas de corrida. Além de uma festa animada, o pub oferece uma vista de tirar o fôlego. Os pilotos descem pela montanha saindo de Kate’s Cottage, perto do posto 34, a 240 quilômetros por hora, entram com as motos na curva a 130 quilômetros por hora e depois vão para uma reta que muitos consideram a mais rápida do circuito.

A TT se tornou ainda mais competitiva na última década, mas neste momento dois pilotos se destacam do resto: Ian Hutchinson, que venceu três corridas no ano passado, e Michael Dunlop, que venceu duas. Os dois terminaram a competição do ano passado com um bate boca que aumentou ainda mais a empolgação por sua participação na corrida deste ano.

“Tenho certeza de que os dois se respeitam, mas não gostam muito um do outro”, afirmou John Watterson, editor esportivo do Isle of Man Newspapers. “Eles vão até o limite. Só espero que não se machuquem”.

Aos 37 anos, Hutchinson, de West Yorkshire, Inglaterra, ganhou a corrida Superbike no dia 6 de junho, levando a 15 seu total de vitórias na TT.

Dunlop, de 28 anos, natural Ballymoney, na Irlanda do Norte, venceu 13 corridas na TT. Ele é descendente de uma família de corredores, com uma história de orgulho e tragédia: é filho de Robert Dunlop (com cinco vitórias na TT) e sobrinho de Joey (o mais condecorado dos pilotos da TT, com 26 vitórias), ambos mortos em acidentes na pista. Michael Dunlop competiu dois dias após a morte do pai em 2008 – e venceu.

“Ele é um campeão. Pilota esse troço como louco – está no controle, embora nem sempre esteja no lugar onde deveria estar. Mas ele é bom pra caramba”, afirmou Roy Moore, comentarista da TT veterano na rádio local.

No ano passado, Dunlop bateu o recorde da volta, com 16 minutos, 53,929 segundos, com média de impressionantes 215,7 quilômetros por hora. “Você acha que já sabe tudo, mas sempre é possível ir mais rápido”, afirmou Dunlop.

Andrew Keh © 2017 New York Times News Service

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