Cena do filme "O show de Truman" (Reprodução/Reprodução)
EFE
Publicado em 3 de junho de 2018 às 11h24.
Quando o filme "O Show de Truman - O Show da Vida" estreou há 20 anos, os espectadores não podiam acreditar que o personagem de Jim Carrey pudesse ser algo mais que ficção. Hoje, aquela incrível história se transformou em algo terrivelmente cotidiano.
O filme, dirigido pelo australiano Peter Weir, foi recebido como um dos melhores de 1998 tanto pela surpreendente interpretação de Carrey - até então só conhecido pelos seus trejeitos - como pela história que contava, que parecia totalmente disparatada.
Carrey era Truman Burbank, um feliz agente de seguros com uma vida perfeita. Tinha uma esposa encantadora (Laura Lynney), um amigo fiel (Noah Emmerich) e uma bonita casa branca na paradisíaca ilha de Seahaven.
Mas todo esse mundo desmorona quando Truman descobre que sua vida está sendo vigiada, que nada do que existe ao seu redor é real e que nasceu para ser o protagonista do primeiro reality show transmitido pela televisão. Embora naquela época nem sequer se sabia o que era um reality...
Faltava um ano para que estreasse a primeira edição do "Big Brother" na Holanda e quase não havia alguns dos projetos iniciais do que depois seriam as redes sociais.
Talvez por isso o filme de Weir - um diretor que já tinha realizado títulos como "A Testemunha" (1985) e "Sociedade dos Poetas Mortos" (1989) - fosse tratado mais como uma comédia que como o retrato de uma aterrorizante realidade.
As comparações com o mundo retratado por George Orwell em "1984" foram inevitáveis. Em ambos os casos os movimentos dos seres humanos eram monitorados e seu comportamento condicionado por quem controlava as câmeras.
Da mesma forma que no caso de Orwell, se considerou que a imaginação de Andrew Niccol, o roteirista de "O Show de Truman", tinha ido muito além do que o mundo real poderia degenerar algum dia.
E nem sequer Peter Weir estava totalmente consciente do retrato do futuro que seu filme mostrava.
"Acho que a vida é escandalosa e o filme reflete isso", disse o cineasta em entrevista, mas sua leitura era mais filosófica e mais metafórica do que real.
Assim, quando lhe perguntavam se esse mundo de Truman poderia se tornar realidade, falava de um único e estranho caso, o de uma moça que postava fotos do seu quarto a cada dois minutos na internet.
E dizia isso tão surpreendido como os espectadores que foram ver seu filme e que não imaginavam que essa vida televisionada de Truman seria uma realidade apenas duas décadas depois.
Considerada uma alegoria religiosa por alguns, uma metáfora sobre a liberdade por outros e uma reflexão sobre a perda de realidade pelo próprio diretor, com a distância do tempo o que fica claro é que foi um filme visionário.
Misturando a ideia de George Orwell e o que mostrava o filme, da Holanda surgiu um inovador formato televisivo, o "Big Brother", que muitos rejeitaram pelo que representava como intromissão na intimidade de pessoas anônimas, mas que hoje em dia continua funcionando em muitos países.
O programa inaugurou o gênero dos reality shows - tinha havido alguns projetos anteriores, mas não com o mesmo sucesso -, que continuou com todo o tipo de variantes, de musicais à sobrevivência, passando por religiões, tribos e donas de casa.
Tudo vale para um formato que foi crescendo ao mesmo tempo em que a realidade se transformava em um grande estúdio que, no lugar da televisão, usa a internet como canal de transmissão.
A multiplicação de redes sociais e a exposição voluntária da vida privada se transformaram não só em um costume, mas em um meio de vida para as legiões de "bloggers" e "influencers" que perambulam por esse mundo paralelo.
Um mundo antecipado em "O Show de Truman", em uma maravilhosa fábula orquestrada por um Ed Harris que interpretava o criador dessa ficção, o instigador de um mundo que saltou da tela para a realidade.