Carreira

Você tem um plano C para sua vida?

Não se trata do seu plano B, aquela atividade que garante uma renda extra ou vai substituir o trabalho que você não aguenta mais. Falamos de fazer algo que dá prazer e traz realização

Maurizio Mancioli, consultor da BSP, dentro de sua instalação: arte como atividade paralela   (Raul Junior/EXAME.com)

Maurizio Mancioli, consultor da BSP, dentro de sua instalação: arte como atividade paralela (Raul Junior/EXAME.com)

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Da Redação

Publicado em 31 de maio de 2013 às 20h13.

São Paulo - Desde cedo, o ítalo-suíço Maurizio Mancioli, de 40 anos, soube que tinha duas grandes vocações: as artes plásticas e a fotografia. No entanto, optou na juventude por trilhar uma carreira mais tradicional e que garantisse uma renda mais estável.

Graduou-se em administração de empresas pela Business School de Lausanne, na Suíça, onde conheceu Heitor Penteado, seu futuro sócio na Business School São Paulo (BSP), negócio que o levou a se mudar para o Brasil.

Em paralelo à carreira de gestor, Maurizio transformou a arte em atividade permanente. Em 2001, começou a fazer exposições individuais em galerias e museus no Brasil e no exterior. Atualmente trabalhando como consultor da BSP Career, unidade de transição de carreira da escola de negócios paulista, Maurizio acredita que manter duas atividades distintas é uma coisa importante para a sua vida.

“O lado executivo me faz crescer profissionalmente e oferece estabilidade, e a arte estimula o processo criativo e o autoconhecimento”, afirma, ressaltando que com a arte aprendeu a ter um novo olhar sobre as coisas, além de desenvolver senso crítico e intuitivo.

Hoje, Maurizio já consegue obter como artista um retorno financeiro maior do que como consultor. Embora seja crescente o número de profissionais que se dedicam a atividades paralelas à carreira principal, ainda existe uma certa resistência, principalmente entre os executivos.

O professor Antônio Carvalho Neto, coordenador do programa de pós-graduação em administração da PUC Minas Gerais, vem estudando o assunto há seis anos e explica que poucos são aqueles que encontram algum tipo de prazer em coisas que não estejam relacionadas ao ambiente de trabalho.

“Pesquisamos mais de 1 400 executivos ao longo desse tempo e constatamos que apenas 10% têm outras atividades, sendo que todos fazem por obrigação”, afirma. Essa realidade começa a mudar. 

Muita gente passou a despertar para os benefícios de viver outras dimensões que não só as de carreira. São pessoas que descobriram o prazer de deixar as habilidades pessoais falarem mais alto fora do escritório, o que se torna uma fonte poderosa de realização e motivação.

Não se trata de buscar uma renda secundária ou de desenvolver um trabalho que substituirá a carreira atual num futuro próximo, algo como um plano B. Trata-se de uma atividade que expande os horizontes, amplia o conhecimento, combate frustrações e energiza a pessoa. Se, de quebra, a atividade se transformar em uma segunda fonte de remuneração, mesmo que pouco significativa, ótimo. Mas estamos falando de um tipo de atividade que não tem o objetivo estrito de gerar renda.


“Esse tipo de experiência é valiosa porque abre a cabeça do profissional, que passa a ter uma visão holística”, afirma Marcus Ronsoni, consultor sênior da Produtive, firma de recolocação profissional.Buscar a multiplicidade é essencial para melhorar a capacidade de aprender, defende o headhunter Alfredo Assumpção, diretor-geral da empresa de seleção de executivos Fesa, que tem uma longa carreira como músico de blues, jazz e rock, além de se arriscar como escritor — lança em setembro seu nono livro, o primeiro de ficção.

“As pessoas precisam sair de sua casta”, afirma Alfredo, que diz que a sensação de realização é importante para o crescimento pessoal. “Ela só aparece quando não se fica restrito apenas a uma atividade.”

Quebrar a rotina e promover pequenas rupturas é crucial para quem não quer se tornar refém da prisão que a modernidade trouxe aos homens. Na visão de Mario Sergio Cortella, filósofo, consultor e professor da PUC São Paulo, a extensa jornada de trabalho faz o profissional ficar restrito ao seu próprio universo, o que leva à limitação mental e ao sofrimento.

Cortella lembra que a expressão “bitolado” tem origem no significado literal da palavra “bitola”, a largura padrão que separa os trilhos em uma linha de trem. “A pessoa vai com segurança no trilho, mas é incapaz de sair dele”, diz Cortella. “Se de um lado a bitola garante a estabilidade, de outro provoca uma limitação brutal.”

Segunda carreira

Há cerca de dez anos, o gaúcho Marcelo Montenegro Jobim, de 43 anos, descobriu sua paixão por vinhos. Enquanto exercia a função de executivo de negócios da operadora Brasil Telecom (incorporada à Oi), nutria nas horas vagas seu interesse pela bebida, curiosidade que foi aumentando após participar de algumas degustações.

Um dia, matriculou-se num curso de sommelier na Universidade de Caxias do Sul. Continuou se aprofundando e passou a promover degustações para grupos de amigos. “Fazia algo de que gostava muito e ainda ampliava meu networking”, diz Marcelo.

Ao mesmo tempo, extraía o máximo de experiências que se refletiam no trabalho. “Com a segunda atividade, passei a enxergar as questões de maneira mais ampla, avaliando variáveis até então descartadas ou ignoradas”, afirma.

Num determinado momento, quando a venda da Brasil Telecom para a Oi começou a se concretizar, Marcelo passou a ver na enologia uma alternativa de carreira. Ele ficou na empresa alguns anos após a fusão até ser demitido em março do ano passado.


Juntou uma reserva de dinheiro e está finalizando os trâmites legais para abrir uma firma de representação de vinhos na cidade de Porto Alegre. “Não fiquei angustiado porque de certa forma a atividade extra me preparou para essa transição”, diz Marcelo. Para Karin Parodi, diretora da consultoria Career Center, de São Paulo, vivenciar novas possibilidades é saudável, sobretudo por acrescentar elementos externos à rotina.

Uma das vantagens, diz ela, é construir uma rede de relacionamentos rica ao mesclar interesses distintos que fogem da esfera dos negócios, como esporte, cultura ou música. “Atividades que dão prazer estimulam outras competências”, diz Karin. “Elas podem até se tornar uma segunda carreira no futuro, uma espécie de plano B”, diz.

Novo olhar

Outra função da atividade paralela é suprir a vida de um conhecimento e de satisfação que a carreira nem sempre proporciona. Há quem encontre isso no trabalho voluntário. Desde a juventude, quando colaborava com creches, o paulistano Dimas Moura, de 53 anos, gerente de marketing da Unisys para a América Latina, se identifica com projetos sociais voltados para os jovens. O voluntariado foi tomando um escopo cada vez maior em sua vida.

Quando trabalhou na HP, Dimas ingressou num programa mundial de mentoring social da empresa. Foi aos Estados Unidos conhecer o projeto de orientação a jovens de baixa renda. Ao voltar, montou um comitê no Brasil e passou a dar palestras sobre empreendedorismo em comunidades mais carentes, atividade que ainda realiza.

Nessas oportunidades, o gerente ensina maneiras de transformar atividades informais em renda e em outras ocasiões faz trabalho de coaching com jovens carentes.

“Com o trabalho social aprendi a ouvir mais antes de tomar qualquer decisão, além de ter melhorado minha habilidade de comunicação”, ressalta. Aspectos que resultaram no plano futuro de aposentadoria de Dimas. “Já defini que, ao concluir a carreira executiva, usarei metade do tempo para me dedicar ao coaching profissional e o restante para orientação de carreira gratuita a jovens das classes C e D”, revela o executivo.

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