Jogador Denis Cheryshev marca o segundo gol da Seleção Russa (Christian Hartmann/Reuters)
Camila Pati
Publicado em 19 de junho de 2018 às 13h18.
Última atualização em 19 de junho de 2018 às 13h22.
Em 1944, o jornalista Mário Filho redigiu uma frase histórica: "A perna que não chutava dava uma impressão desagradável de coisa postiça. Para o homem da arquibancada, era de pau."
Pela criatividade vocabular, advinda do importante processo metafórico na criação textual, Mário Filho cunhou uma das palavras mais usadas no Futebol brasileiro: perna de pau.
Justamente por ser uma palavra composta, não deveria, pois, essa expressão ser registrada com hífen? Vejamos o que traz o texto do Novo Acordo Ortográfico:
III – Quanto ao hífen:
A – Em compostos
2) Não se emprega o hífen nos compostos por justaposição com termo de ligação, como pé de moleque, tomara que caia, quarto e sala, exceto nos compostos que designam espécies botânicas e zoológicas, como ipê-do-cerrado, bem-te-vi, porco-da -índia, etc.
Eis aqui uma enorme curiosidade: a nossa Língua registra oficialmente "perna de pau" e "perna-de-pau", com sentidos distintos.
Sem o uso de hífen, a expressão "perna de pau" corresponde a "pessoa que não tem uma perna ou tem uma delas defeituosa; perneta; jogador de má qualidade; pessoa desajeitada ou medíocre em sua atividade ou profissão."
Já com o uso de hífen, "perna-de-pau" corresponde a "pernilongo". Por ser termo que designa espécie zoológica, o hífen deve existir.
Quanto à variação, há uma semelhança entre as duas expressões: o plural está na primeira palavra, devido ao termo de ligação: "pernas de pau", "pernas-de-pau".
Nesse citado caso, o hífen tem importantíssima função: pode ser - a depender da sentença - o único sinal a determinar o real sentido vocabular. Vejamos:
"No campo, não se incomodava com os pernas de pau."
(aqui, o termo "campo" deve ser o gramado; pernas de pau são os jogadores ruins.)
"No campo, não se incomodava com os pernas-de-pau."
(aqui, pernas-de-pau são necessariamente os pernilongos).
Em suma, a escrita depende muito do conhecimento ortográfico; com o estudo da norma e dos motivos dela, o escritor terá ferramentas diversas, a fim de alterar o comportamento do leitor e informar com clareza.
Um grande abraço, até a próxima e inscreva-se no meu canal!
Diogo Arrais
@diogoarrais
YouTube: MesmaLíngua
Professor de Língua Portuguesa
Autor Gramatical pela Editora Saraiva