Carreira

Romance corporativo

O recente caso do Walmart, que foi condenado a pagar 30 000 reais por ter demitido um casal de funcionários, traz à tona uma questão polêmica: até que ponto a companhia pode interferir na vida amorosa de seus profissionais?

Walmart (Daniel Aguilar/Getty Images)

Walmart (Daniel Aguilar/Getty Images)

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Da Redação

Publicado em 18 de dezembro de 2014 às 17h32.

São Paulo - Em julho deste ano, o Walmart no Brasil foi condenado a pagar uma indenização de 30 000 reais por danos morais a um funcionário que havia sido demitido por namorar uma profissional da companhia. A rede de supermercados alegou possuir um código de conduta que proíbe o time de segurança de se relacionar com qualquer contratado.

Por isso, ao descobrir o romance entre um deles e uma empregada, dispensou ambos. O caso foi parar na Justiça e o júri da Segunda Turma do Tribunal Superior do Trabalho considerou o desligamento abusivo.

O tribunal levou em conta o artigo 5o, inciso X, da Constituição Federal, que garante a indenização pelo dano material ou moral decorrente da violação à “intimidade, à vida privada, à honra e à imagem das pessoas”.

A decisão pode vir a ser seguida em outras situações semelhantes, aumentando o volume de condenações sobre o assunto. Ao analisar o número de empresas que seguem a cartilha do Walmart, a rede americana de supermercados deve ter companhia nos tribunais.

Segundo uma pesquisa da multinacional de recrutamento e seleção Trabalhando.com, 56% das corporações ainda proíbem esse tipo de relacionamento. A pesquisa ouviu 300 profissionais de 30 empresas e gera a dúvida: até que ponto o empregador pode interferir na vida particular das pessoas?

Para Mihoko Sirley Kiura, sócia da área trabalhista do TozziniFreire Advogados, a companhia pode estabelecer “políticas internas referentes ao padrão de comportamento”, mas deve se atentar aos limites estabelecidos pela lei e ao princípio constitucional de que “todo cidadão tem direito à vida privada”.

A especialista reforça que não existe lei ou medida que proíba a relação entre dois colegas. A CLT aponta apenas trechos que tratam da demonstração de afeto no escritório e das punições estabelecidas. “Entre as faltas graves, que constituem demissão por justa causa, está a ‘incontinência de conduta’, ou seja, atos que ferem os bons costumes”, afirma Mihoko.

Em uma situação como essa, a advogada trabalhista Daniela Yuassa, do escritório Stocche Forbes, aconselha o gestor de recursos humanos a chamar o casal para conversar e, dependendo do caso, aplicar uma advertência por escrito. “O que deve ficar claro é que essa advertência não se refere ao namoro, e sim ao comportamento indevido”, diz Daniela.

Conhecer um par no emprego é comum. Segundo a pesquisa do site da consultoria americana Vault.com, dos 1 864 entrevistados em 2014, 56% afirmaram já ter namorado um colega de trabalho. “Considerando que passamos grande parte da vida dentro da empresa, não há como exigir que as pessoas não se relacionem”, diz Thais Simão, gerente de recursos humanos da P&G.

Exigir, de fato, soa um tanto antiquado nos dias de hoje, mas é possível — e recomendável — criar algumas regras para o romance corporativo. Ricardo Rabinovich, da consultoria de gestão Crowe Horwath, recomenda manter os casais em departamentos diferentes — e separar de área aqueles que mantêm relação de subordinação. Também é aconselhável que os funcionários sejam transparentes e comuniquem o romance à companhia.

A P&G, por exemplo, exige que seus empregados documentem qualquer tipo de situação passível de conflito de interesse — inclusive namorar alguém da concorrência. A L’Oréal vai mais longe e pede que os funcionários informem não só o relacionamento com os concorrentes mas também com alguém interno ou um fornecedor.

“Há não só um conflito de interesse mas também um cuidado com as informações confidenciais”, diz Rosmari Capra-Sales, diretora de ética da L’Oréal Brasil. Para as duas organizações, assumir o romance pode ser de interesse dos próprios empregados. Assim, no caso de um ser expatriado, a corporação também pode cuidar do remanejamento do outro.

Se em alguns lugares as restrições são maiores, em outros o relacionamento é até incentivado. É o caso da Gol, que, apesar de estabelecer regras para familiares e casais (eles não devem ter relação de subordinação), permite que pilotos e comissárias se envolvam amorosamente.

A companhia aérea, inclusive, tem o programa Escala Casada, por meio do qual todo tripulante casado com outro pode ficar no mesmo quarto em uma viagem. “Esses profissionais passam dias fora de casa e é muito natural que se aproximem e se relacionem entre si”, afirma Jean Carlo Nogueira, diretor de RH da Gol. O Walmart não quis se pronunciar para esta reportagem.

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