Não, Marissa Mayer está errada sobre home office
Existe tecnologia disponível capaz de permitir que um profissional mantenha de casa a comunicação e a colaboração que tem na empresa
Da Redação
Publicado em 28 de maio de 2013 às 18h53.
São Paulo - Há seis anos, Michele Moreira, de 33 anos, gerente de negócios da Ticket , empresa de benefícios, com sede em São Paulo, trabalha no esquema de home office . Ela deixou para trás as quase quatro horas que perdia no trânsito todos os dias para desempenhar suas atividades em casa, num escritório montado pela companhia.
Sua rotina de trabalho só mudou nesse aspecto. Ela continua trabalhando das 9h às 18h, fechando negócios e interagindo com outros profissionais. "Não estar na empresa é apenas um detalhe", diz Michele. A diferença, diz a executiva, é que há mais qualidade de vida , maior concentração e menos estresse.
"No escritório você é tomado por atividades administrativas e há interrupções a todo momento", afirma Michele, que acha que se dedica mais ao trabalho ficando em casa do que indo até a sede da Ticket.
Para entender os impactos do trabalho em casa, pesquisadores da Universidade Stanford, dos Estados Unidos, acompanharam durante nove meses 1.000 funcionários de uma agência de turismo em Xangai, na China, que dividiram o trabalho entre quatro dias em casa e um no escritório.
Segundo o estudo, o desempenho desses profissionais foi 13% maior do que aqueles que realizaram as atividades apenas no escritório. Essa melhora veio de um aumento de 9% no número de minutos trabalhados, decorrentes da menor quantidade de pausas e da redução nos atrasos para começar a trabalhar.
O número de faltas de quem foi diariamente ao trabalho foi maior do que o número de dias em que as pessoas em home office não puderam trabalhar.
De acordo com um dos autores do estudo, Zhichun Jenny Ying, do departamento de economia da universidade, a pesquisa aponta que o trabalho em casa melhora o desempenho, reduz atritos entre colegas, economiza espaço de escritório e tempo de viagem. “Além de mais produtivas, as pessoas que fazem home office são mais felizes”, diz Zhichun.
A premissa usada pelo Yahoo!, de que o desempenho da empresa vai melhorar se todos os empregados estiverem no mesmo lugar, tem alguns pontos fracos. Em primeiro lugar, há tecnologia de qualidade para manter a comunicação entre pessoas distantes do escritório.
Uma chamada por Skype ou qualquer sistema mais profissional de videoconferência propicia contato visual, além da voz. Programas de comunicação instantânea, como Gtalk e Skype, permitem a troca de informações em tempo real com relativa informalidade e até confidencialidade, como os papos que ocorrem na máquina de café do corredor do escritório.
Da mesma forma, a presença física pode até ajudar, mas não garante que a integração entre colegas realmente ocorra. Principalmente quando há problemas no clima da empresa. "Muitas vezes, divide-se o mesmo espaço é não há interação", diz Susana Falchi, presidente da HSD, consultoria de RH de São Paulo.
Outro ponto diz respeito a tarefas em que comunicação e colaboração não são as atitudes mais importantes. Para quem escreve contratos, monta apresentações ou trabalha em uma atividade criativa, há momentos em que ter concentração é muito mais vital do que trocar ideias.
"São tarefas que dependem de conhecimento, serenidade e pesquisa", diz Susana. Nesses momentos, trabalhar de casa pode ser melhor — e talvez a cúpula do Yahoo! nem seja capaz de avaliar se seus funcionários perderam agilidade.
A decisão do Yahoo! também tem aspectos que valem para a realidade dele e não podem ser exemplos para todas as empresas. A companhia baixou a medida de reunir todo mundo porque tinha índices de trabalho maiores que os da maioria das empresas. Mais do que isso, o Yahoo! está em crise.
É um dos pioneiros da internet, mas perdeu público, relevância e identidade nos últimos anos. Companhias nessa situação tomam medidas austeras. Outro componente na questão do home office é o trânsito. Apesar de a região do Vale do Silício ter registrado em 2012 o maior fluxo de carros desde a época da bolha da internet, o trânsito da área é muito inferior ao de grandes cidades, como São Paulo e Rio de Janeiro, cuja média de deslocamento é de 42 minutos a cada trajeto.
Nesses casos, trata-se de tempo desperdiçado, que o profissional poderia usar melhor se ficasse em casa. "Não há outro caminho. As pessoas buscam mais qualidade de vida e trabalhos com esquemas flexíveis", diz Antonio Salvador, vice-presidente de RH da HP, de São Paulo.
Presente, mas não muito
Outro problema é que a cabeça das pessoas nem sempre está no trabalho. Obrigar um funcionário preocupado com um assunto pessoal a marcar presença na empresa só vai assegurar que um corpo ocupe o espaço de uma baia.
"Não adianta ter um esquema que obrigue as pessoas a estarem no escritório mesmo que estejam com algum problema", diz Willian Bull, consultor do Instituto Pieron, em São Paulo. O segredo é o equilíbrio, segundo Irene Azevedo, diretora de desenvolvimento de negócios da LHH|DBM, consultoria de outplacement, de São Paulo.
Trabalhar em casa sem ter nenhuma comunicação com o restante da empresa é ruim, mas políticas corporativas muito rígidas podem prejudicar ainda mais o desempenho.
Daniel Miranda, diretor de segurança corporativa da Bayer Brasil e América Latina, de 36 anos, achou o meio-termo — divide o tempo entre o trabalho no escritório e em casa. "Fico uma vez por semana em casa, no dia em que preciso realizar uma atividade que exige atenção, como elaboração de orçamentos ou desenvolvimento de projetos", diz Daniel.
Para ele, esse modelo permite reunir as vantagens das duas formas de trabalho: em casa consegue ter mais qualidade de vida e desempenhar melhor algumas atividades; na empresa mantém o vínculo com as pessoas e mostra seu desempenho. O caminho rumo à flexibilidade parece inevitável.
Os profissionais podem ganhar em qualidade de vida e satisfação com o trabalho. Mas a distância do escritório pode levar à perda dos vínculos que fortalecem relacionamentos e levam ao reconhecimento dos chefes e às promoções. Qual a medida certa? Cada profissional terá de definir a sua.
São Paulo - Há seis anos, Michele Moreira, de 33 anos, gerente de negócios da Ticket , empresa de benefícios, com sede em São Paulo, trabalha no esquema de home office . Ela deixou para trás as quase quatro horas que perdia no trânsito todos os dias para desempenhar suas atividades em casa, num escritório montado pela companhia.
Sua rotina de trabalho só mudou nesse aspecto. Ela continua trabalhando das 9h às 18h, fechando negócios e interagindo com outros profissionais. "Não estar na empresa é apenas um detalhe", diz Michele. A diferença, diz a executiva, é que há mais qualidade de vida , maior concentração e menos estresse.
"No escritório você é tomado por atividades administrativas e há interrupções a todo momento", afirma Michele, que acha que se dedica mais ao trabalho ficando em casa do que indo até a sede da Ticket.
Para entender os impactos do trabalho em casa, pesquisadores da Universidade Stanford, dos Estados Unidos, acompanharam durante nove meses 1.000 funcionários de uma agência de turismo em Xangai, na China, que dividiram o trabalho entre quatro dias em casa e um no escritório.
Segundo o estudo, o desempenho desses profissionais foi 13% maior do que aqueles que realizaram as atividades apenas no escritório. Essa melhora veio de um aumento de 9% no número de minutos trabalhados, decorrentes da menor quantidade de pausas e da redução nos atrasos para começar a trabalhar.
O número de faltas de quem foi diariamente ao trabalho foi maior do que o número de dias em que as pessoas em home office não puderam trabalhar.
De acordo com um dos autores do estudo, Zhichun Jenny Ying, do departamento de economia da universidade, a pesquisa aponta que o trabalho em casa melhora o desempenho, reduz atritos entre colegas, economiza espaço de escritório e tempo de viagem. “Além de mais produtivas, as pessoas que fazem home office são mais felizes”, diz Zhichun.
A premissa usada pelo Yahoo!, de que o desempenho da empresa vai melhorar se todos os empregados estiverem no mesmo lugar, tem alguns pontos fracos. Em primeiro lugar, há tecnologia de qualidade para manter a comunicação entre pessoas distantes do escritório.
Uma chamada por Skype ou qualquer sistema mais profissional de videoconferência propicia contato visual, além da voz. Programas de comunicação instantânea, como Gtalk e Skype, permitem a troca de informações em tempo real com relativa informalidade e até confidencialidade, como os papos que ocorrem na máquina de café do corredor do escritório.
Da mesma forma, a presença física pode até ajudar, mas não garante que a integração entre colegas realmente ocorra. Principalmente quando há problemas no clima da empresa. "Muitas vezes, divide-se o mesmo espaço é não há interação", diz Susana Falchi, presidente da HSD, consultoria de RH de São Paulo.
Outro ponto diz respeito a tarefas em que comunicação e colaboração não são as atitudes mais importantes. Para quem escreve contratos, monta apresentações ou trabalha em uma atividade criativa, há momentos em que ter concentração é muito mais vital do que trocar ideias.
"São tarefas que dependem de conhecimento, serenidade e pesquisa", diz Susana. Nesses momentos, trabalhar de casa pode ser melhor — e talvez a cúpula do Yahoo! nem seja capaz de avaliar se seus funcionários perderam agilidade.
A decisão do Yahoo! também tem aspectos que valem para a realidade dele e não podem ser exemplos para todas as empresas. A companhia baixou a medida de reunir todo mundo porque tinha índices de trabalho maiores que os da maioria das empresas. Mais do que isso, o Yahoo! está em crise.
É um dos pioneiros da internet, mas perdeu público, relevância e identidade nos últimos anos. Companhias nessa situação tomam medidas austeras. Outro componente na questão do home office é o trânsito. Apesar de a região do Vale do Silício ter registrado em 2012 o maior fluxo de carros desde a época da bolha da internet, o trânsito da área é muito inferior ao de grandes cidades, como São Paulo e Rio de Janeiro, cuja média de deslocamento é de 42 minutos a cada trajeto.
Nesses casos, trata-se de tempo desperdiçado, que o profissional poderia usar melhor se ficasse em casa. "Não há outro caminho. As pessoas buscam mais qualidade de vida e trabalhos com esquemas flexíveis", diz Antonio Salvador, vice-presidente de RH da HP, de São Paulo.
Presente, mas não muito
Outro problema é que a cabeça das pessoas nem sempre está no trabalho. Obrigar um funcionário preocupado com um assunto pessoal a marcar presença na empresa só vai assegurar que um corpo ocupe o espaço de uma baia.
"Não adianta ter um esquema que obrigue as pessoas a estarem no escritório mesmo que estejam com algum problema", diz Willian Bull, consultor do Instituto Pieron, em São Paulo. O segredo é o equilíbrio, segundo Irene Azevedo, diretora de desenvolvimento de negócios da LHH|DBM, consultoria de outplacement, de São Paulo.
Trabalhar em casa sem ter nenhuma comunicação com o restante da empresa é ruim, mas políticas corporativas muito rígidas podem prejudicar ainda mais o desempenho.
Daniel Miranda, diretor de segurança corporativa da Bayer Brasil e América Latina, de 36 anos, achou o meio-termo — divide o tempo entre o trabalho no escritório e em casa. "Fico uma vez por semana em casa, no dia em que preciso realizar uma atividade que exige atenção, como elaboração de orçamentos ou desenvolvimento de projetos", diz Daniel.
Para ele, esse modelo permite reunir as vantagens das duas formas de trabalho: em casa consegue ter mais qualidade de vida e desempenhar melhor algumas atividades; na empresa mantém o vínculo com as pessoas e mostra seu desempenho. O caminho rumo à flexibilidade parece inevitável.
Os profissionais podem ganhar em qualidade de vida e satisfação com o trabalho. Mas a distância do escritório pode levar à perda dos vínculos que fortalecem relacionamentos e levam ao reconhecimento dos chefes e às promoções. Qual a medida certa? Cada profissional terá de definir a sua.