Carreira

Esqueça o plano B

David Cohen Crise econômica, empresas demitindo, dificuldades de fechar negócios… num ambiente como esses, todo mundo precisa ter um plano B, certo? Talvez não. Uma recente pesquisa aponta que o mero fato de formular alternativas para o trabalho diminui as suas possibilidades de sucesso. As pesquisadoras Jihae Shin, da Universidade de Wisconsin-Madison, e Katherine Milkman, da […]

 (Caixa/Divulgação)

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Da Redação

Publicado em 16 de setembro de 2016 às 13h05.

Última atualização em 22 de junho de 2017 às 18h44.

David Cohen

Crise econômica, empresas demitindo, dificuldades de fechar negócios… num ambiente como esses, todo mundo precisa ter um plano B, certo? Talvez não. Uma recente pesquisa aponta que o mero fato de formular alternativas para o trabalho diminui as suas possibilidades de sucesso.

As pesquisadoras Jihae Shin, da Universidade de Wisconsin-Madison, e Katherine Milkman, da escola de negócios Wharton, da Universidade da Pensilvânia, realizaram uma série de experimentos com estudantes e voluntários online. A ideia geral era realizar uma tarefa (organizar sentenças confusas, por exemplo), pela qual os participantes receberiam um brinde. Para alguns dos participantes, elas pediram que pensassem em outras maneiras de receber um brinde similar, caso não fossem muito bem no teste.

Os que pensaram em alternativas tiveram resultado pior no teste. Segundo as pesquisadoras apuraram em questionários posteriores, isso se deveu pelo menos em parte a uma redução na vontade de ter um bom desempenho. “Criar um plano B”, escreveram a duas, “é construir uma rede de segurança emocional que pode boicotar o seu desejo de sucesso”.

Embora não seja usual no mundo do aconselhamento de carreiras, essa opinião não é exatamente nova. Algo como 2.500 anos atrás, o estrategista militar chinês Sun-Tzu escreveu: “Coloque seus soldados em posições em que não haja como escapar, e eles preferirão morrer a fugir. Se tiverem de enfrentar a morte, não há nada que eles não possam atingir. Oficiais e tropas vão dedicar sua força máxima.”

Para quem não gosta muito de analogias com a guerra, basta pensar no mercado amoroso. Você imagina cortejar alguém já pensando nas opções sentimentais em caso de rejeição? No trabalho, assim como no amor, o valor é criado pela disposição de entrega. Pensar em alternativas é, por definição, entregar-se menos.

O lado bom da morte

Embora a conclusão da pesquisa pareça correta, também não são poucos os motivos para ter um plano B. O principal deles é a instabilidade. Você pode estar muito feliz com o seu trabalho, mas isso não lhe dá garantias.

Indústrias inteiras desaparecem. Empresas podem ir à falência ou sofrer fusões que eliminem postos de trabalho duplicados. O seu chefe pode mudar e todo o bom ambiente ir por água abaixo. Ou você pode mudar de interesses ou de situação na vida.

Quarenta anos atrás, era comum as pessoas terem expectativa de passar a maior parte da vida profissional em um único lugar. Hoje, a expectativa é de cumprir ciclos de três a cinco anos.

Nesse contexto, um plano B é muito parecido com um investimento hedge – uma aposta contrária à original, para não perder tudo em caso de as coisas não saírem como o planejado. É claro que o hedge diminui o seu potencial de lucro, mas a ideia é justamente trocar uma parte dos ganhos por algo similar a uma apólice de seguro.

Mesmo sob essa ótica, porém, é possível relativizar a necessidade do plano B. Como diz Gabrielle Bernstein, uma palestrante motivacional americana que escreveu três livros sobre aconselhamento de carreira para mulheres, “curtir o luto por um trabalho que você amava e perdeu é vital para seguir adiante”.

O conselho de Sun-Tzu pode soar como contra-indicação. Afinal, o que ele diz é que não ter um plano B torna você mais alerta e eficiente porque a outra opção é a morte. Não há nada de errado em não gostar muito de estar nessa posição. Mas o recado de Gabrielle é que a morte no mundo do trabalho não é igual à morte física. Existe o luto, mas a ressurreição é possível. Em geral, depende mais de você do que dos outros.

E vivenciar a perda tem suas vantagens. Uma é que o fracasso é um aprendizado. Segundo um estudo de 2011, publicado na revista Social Psychology, fracassos inesperados podem ser benéficos se levarem as pessoas a novas formas de pensar. Gente que analisa profundamente o que poderia ter feito de diferente costuma ser mais criativa em futuras ocupações.

Outra vantagem é que deixar o plano A correr o seu curso tem o benefício da consciência tranquila. Você pode dizer que fez tudo o que era possível para que seu projeto desse certo.

Em vez de B, A2

Talvez a grande questão não seja se vale a pena, mas sim quando vale a pena traçar um plano B. De acordo com Jihae e Katherine, em situações em que o sucesso depende da sorte ou da habilidade ter um plano B não parece comprometer o desempenho. Mas em situações que requerem esforço é preciso fazer uma análise de custo-benefício. Em empresas, elas sugerem outra solução: em vez de fazer todos pensarem em alternativas, você pode separar um grupo para ser responsável por um plano de contingência.

É a lógica do Skunkwork: separar um time, até fisicamente, para pensar em inovação radical. O grupo não contamina os funcionários preocupados com a eficiência, nem é contaminado pela cultura do “é assim que nós fazemos aqui”. Para indivíduos, porém, essa estratégia levaria à esquizofrenia, não exatamente uma opção recomendável. Consultores de carreira em geral recomendam que você formule um plano B quando sentir a possibilidade de mudanças no horizonte. Quanto maior a possibilidade, mais ênfase no plano B.

No mundo da biologia, isso é conhecido como o instinto “luta ou fuga”. Não é preciso pensar muito para perceber que as duas estratégias são opostas e o simples fato de pensar em uma diminui as chances de ser bem-sucedido na outra.

E, se você se torna um especialista em planos B, pode ficar caracterizado como um profissional de pouca resistência a incômodos e desafios.
Por outro lado, jamais pensar em alternativas é a definição básica da obstinação. Em pelo menos um aspecto, o plano B pode melhorar, e não piorar o seu desempenho: quem tem uma rede de segurança costuma se sentir confortável para assumir mais riscos, uma qualidade fundamental na carreira (e na vida).

O site 80.000 hours, uma organização não lucrativa britânica de aconselhamento de carreira, sugere que você vá além do plano B. Ele defende um plano Z, aquilo que você fará caso tudo o mais dê errado. Além da segurança, investir em um plano B pode trazer aprendizado e conexões, que talvez sejam úteis no plano A.

Ainda assim, resta a contradição básica: investir em B é, pelo menos em alguma medida, desinvestir em A. Por outro lado, especialmente no mundo de hoje, não dá para contar com a estabilidade.

A solução talvez seja investir em A2. Quer dizer: não seja ingênuo a ponto de pensar que o seu projeto atual é eterno, ou que ele lhe dê segurança. Mas ele é o que você tem hoje, e pode ser o melhor caminho para o que você terá amanhã. Mudanças não têm de ser feitas com ligações em paralelo – elas podem ser feitas com ligações em série.

Investir em A2 significa, por exemplo, ampliar as suas capacidades em A, mas também explicitar quais são essas capacidades para quem não pertença ao restrito círculo de pessoas de A. Isso permite explorar e se tornar mais valorizado em mercados adjacentes ao atual.

Contra o conselho usual de buscar ativamente opções no mercado de trabalho – há consultores que recomendam que você “assunte” propostas pelo menos uma vez por trimestre –, gosto da história que um amigo do mercado financeiro me contou, alguns anos atrás. Ele recebeu o telefonema de um headhunter e respondeu que estava muito bem onde estava. A moça lhe respondeu: “eu sei que você está bem aí, é exatamente por isso que eu estou ligando”.

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