Victor Hill e Jefferson Viana, da Associação Cactus: aposta na matemática para melhoria da vida de mais de 220.000 estudantes brasileiros (Divulgação/Divulgação)
Editor de Negócios e Carreira
Publicado em 3 de setembro de 2024 às 16h55.
Última atualização em 3 de setembro de 2024 às 17h09.
Está difícil ser otimista com os rumos da educação brasileira. Após dois anos de salas de aula vazias durante a pandemia, muitos indicadores do ensino seguem estagnados ou, pior, estão piorando.
Um olhar ao Ideb 2023, a maior fonte de dados sobre a educação básica brasileira, traz pistas de caminhos a serem perseguidos. Divulgados em agosto, eles revelam que, apesar dos desafios a nível nacional, há boas notícias em alguns pontos do país.
Eis alguns deles. O município de Vargem Grande, a 140 quilômetros de São Luís, teve um avanço de 29% na nota média de seus alunos em dois anos. Hoje, a nota média dos alunos entre o 5º e o 9º ano do ensino fundamental na cidade é 5,8, acima da meta estabelecida pelo governo federal para os alunos deste ciclo —5,1.
Houve quem conseguisse melhorar o que já estava bom. Em Pires Ferreira, município cearense de 10.200 habitantes a 285 quilômetros de Fortaleza, o Ideb nos anos finais do fundamental foi um impressionante 9,2. É uma das notas mais altas do Brasil e 16,5% acima do registrado na cidade na edição do Ideb 2021.
Em comum às duas cidades estão as boas notas de seus estudantes na prova de matemática, um dos pilares do Ideb. (O outro é o exame de português.) Em Vargem Grande, a nota média foi de 282,73. Em Pires Ferreira, de 390,76. Ambas estão acima da média nacional, de 258,94.
Em comum também às duas cidades está o fato de elas terem sido palco de competições de matemática que serviram como uma espécie de 'esquenta' para a Olimpíada Brasileira de Matemática das Escolas Públicas, a OBMEP.
Organizada desde 2005 pelo IMPA, uma organização do terceiro setor dedicada ao fomento das ciências exatas no país, o evento virou um fenômeno de público. No ano passado, mais de 18,3 milhões de estudantes de 55.300 escolas participaram daquela que já virou a maior olimpíada estudantil do mundo.
Em comum também às duas cidades está o fato de ambas terem sido palco da atuação da Associação Cactus, uma das ONGs de maior destaque na melhoria de indicadores educacionais no país.
O foco da Associação Cactus é o de criar convênios com prefeituras interessadas em preparar os jovens de suas cidades para mandar bem nas provas da Olimpíada de Matemática. E, com consequência, melhorar de modo geral o entendimento das ciências exatas.
A história da Associação Cactus começa com Jefferson Viana e Victor Hill, dois jovens medalhistas de ouro em edições da OBMEP entre 2007 e 2011.
Ambos nasceram no Ceará em famílias de origem humilde que viram na educação uma alavanca para conquistas sociais — não só para eles, mas também para outros jovens com trajetórias semelhantes.
Com bolsas integrais conquistadas graças ao seu desempenho excepcional em competições acadêmicas, Jefferson e Victor ingressaram no Insper, uma das principais escolas de negócios do Brasil, entre 2015 e 2016.
Lá, como estudantes dedicados, eles pensaram num projeto para compartilhar os aprendizados com outros jovens interessados em ganhar medalhas na OBMEP.
A inspiração veio de pesquisas conduzidas no próprio Insper sobre como iniciativas podem promover mudanças positivas na sociedade.
Em suma, são dois conceitos principais. "Um deles é o de role models, ou seja, como esses estudantes podem virar exemplos nas localidades onde moram", diz Victor Hill.
"O outro é o conceito de peer effects, que vem a ser o efeito causado pela presença desses estudantes e dos nossos projetos dentro dessas comunidades."
Em 2017, a Associação Cactus de maneira informal com turmas preparatórias para as olimpíadas científicas em Capistrano, Jericoacoara e outras cidades do Ceará.
O apoio de colegas do Insper que compartilhavam da visão e viraram voluntários impulsionou o projeto. Em 2019, a Associação Cactus foi formalmente estabelecida.
Acompanhando o crescimento da própria Olimpíada de Matemática, o trabalho da Cactus chegou a todas as regiões do Brasil em pouco tempo.
"Em 2023, mais de 220.000 jovens de todas as regiões do Brasil se envolveram ativamente em nossos projetos pedagógicos", diz Hill.
Em 2023, cerca de 187.000 estudantes participaram das 'maratonas tech', promovida pela Cactus país afora. Nelas, estudantes precisam resolver desafios de tecnologia e, assim, entendem na prática as possibilidades abertas com os conhecimentos de ciências exatas.
Um grupo mais seleto, de 34.000 alunos, participa de aulões e competições internas focadas no aprendizado de matemática para ter um bom desempenho na Olimpíada.
O resultado disso pode ser medido no quadro de medalhas da OBMEP. No ano passado, os alunos da Cactus conseguiram 22 medalhas de ouro, 121 de prata e 121 de bronze. Um total de 8.408 estudantes com alguma participação nas atividades da Cactus receberam menção honrosa durante a Olimpíada.
O desafio, agora, é ampliar o impacto do projeto. E, na ponta, conseguir reverter a pasmaceira nos indicadores educacionais do país.
Para financiar as atividades, hoje a Associação Cactus fecha convênios com prefeituras interessadas no projeto. Em paralelo, promove jantares e eventos para arrecadar recursos entre empresários atentos à filantropia.
Nessas conversas, Hill e Viana têm números concretos para comprovar o impacto da Cactus. Em 2021, um estudo do Data Insper mostrou que a presença da Associação num município aumentou a nota dele no Ideb em 6,1%, em média, ao longo de 12 meses.
"Isso representa um aumento da renda anual futura dos estudantes em 2%", diz Hill.