STF se divide sobre julgamento do pagamento por meio de precatório
Efeitos da tese a ser adotada pelo Supremo pode revolucionar o demorado sistema de precatórios e o regime de prestação de serviços públicos
Bússola
Publicado em 20 de setembro de 2022 às 09h22.
Última atualização em 22 de setembro de 2022 às 09h32.
Por Paulo José Liza Suarez e Otávio Luís*
Encaminha-se para o término o julgamento do Recurso Extraordinário n° 922144, que estava pautado para proclamação do resultado na sessão de 1° de agosto, após o retorno do recesso do Suprema Tribunal Federal, em que se discute a constitucionalidade do pagamento por meio de precatório do depósito complementar da justa indenização em casos de desapropriação por necessidade pública, ou se o depósito deve necessariamente ser efetuado por depósito em dinheiro.
Até o momento, a Corte divide-se em três correntes: a primeira, do Relator Ministro Luís Roberto Barroso, acompanhado dos Ministros Alexandre de Moraes e Ricardo Lewandowski, entende pelo provimento do Recurso, mas com a fixação da tese de que o depósito judicial em dinheiro deve ocorrer quando o Poder Público estiver inadimplente com o pagamento dos precatórios; a segunda corrente, encabeçada pelo Ministro Edson Fachin, acompanhados das Ministras Rosa Weber e Carmen Lúcia, além do Presidente Ministro Luiz Fux, que também é pelo provimento do Recurso Extraordinário, mas no sentido de que as complementações da indenização sempre devem ser por depósito, e nunca por precatórios, e; terceira a corrente do Ministro Gilmar Mendes, corroborada pelos Ministros Dias Toffoli, Nunes Marques e André Mendonça, entende que o pagamento sempre deve ser por meio de precatório, salvo quando a desapropriação é por descumprimento da função social, situações em que o pagamento será por meio de títulos da dívida pública ou agrária.
Ou seja, as teses têm dividido o STF, tamanha a controvérsia sobre o assunto que envolve o choque de dois artigos da Constituição Federal (art. 5°, inciso XXIV e art. 100) e que terá reflexo direto em outras ações expropriatórias, pois o recurso tem repercussão geral.
Numa interpretação mais literal da Constituição, o pagamento por depósito em dinheiro inserido pelo Constituinte de 1988, que se encontra no art. 5° sobre os direitos e garantias constitucionais, deveria prevalecer sobre o pagamento por meio de precatório, que encontra previsão na Emenda Constitucional n° 62, de 2009.
Além disso, com a desapropriação do imóvel, presume-se que o expropriado necessita da complementação do depósito da indenização para adquirir outra moradia em condições e locais semelhantes ao anterior, pois usualmente o Poder Público realiza ofertas iniciais abaixo do real valor da propriedade e de imediato ocorre a imissão provisória na posse do imóvel, de modo que não se poderia aguardar a ordem cronológica de pagamento dos precatórios que leva anos.
Aliás, as ações de desapropriação têm longo trâmite processual, com a citação pessoal de todos os proprietários, avaliação prévia e definitiva do imóvel, impugnação das partes, esclarecimentos periciais, recursos, enfim, a própria morosidade processual até o trânsito em julgado já poderia valer como argumento para que o expropriado não seja compelido a aguardar mais alguns anos na fila dos precatórios.
Soma-se a isso, ainda, a preocupação com a inadimplência do Poder Público e as constantes mudanças nas regras na ordem de preferência dos precatórios, desconfiança essa razoável com a recente PEC dos Precatórios e manifestada na corrente adotada pelo Relator do recurso, Ministro Luís Roberto Barroso.
Por outro lado, a determinação de pagamento por depósito judicial pode refletir negativamente no número de obras e desapropriações por necessidade pública, afetando a prestação de serviços públicos à população ou, então, positivamente, com uma maior lealdade e boa-fé do Poder Público em realizar ofertas iniciais mais condizentes com a realidade dos imóveis expropriados, evitando, assim, valores de juros compensatórios maiores do que até o próprio valor principal indenizatório, preocupação que já foi objeto de atenção da Suprema Corte no julgamento da ADI n° 2332.
Portanto, a votação é incerta e o tema controverso dentro do STF, cujos efeitos da tese a ser adotada pelo Supremo pode revolucionar não só o demorado sistema de precatórios, mas também o regime de prestação de serviços públicos realizado por meio da afetação de bens por desapropriação.
* Paulo José e Otávio Luís são advogados especialistas em Contencioso, Prevenção e Resolução de Conflitos, Energia, Operações e Contencioso Imobiliário do /asbz
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