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STF decide sobre créditos tributários nesta semana

Especialista em direito tributário e sócia do escritório Vieira Rezende Advogados, Bruna Luppi analisa o caso com exclusividade para a Bússola

Ministros vão decidir sobre a constitucionalidade do fim do voto de qualidade no Carf (Ueslei Marcelino/Reuters)

Ministros vão decidir sobre a constitucionalidade do fim do voto de qualidade no Carf (Ueslei Marcelino/Reuters)

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Publicado em 23 de março de 2022 às 12h39.

Última atualização em 23 de março de 2022 às 12h51.

Está marcado para esta quarta-feira, no Supremo Tribunal Federal, o julgamento de três Ações Diretas de Inconstitucionalidade (ADIs) que interessam a contribuintes com processos no Conselho Administrativo de Recursos Fiscais (Carf) e envolvem créditos tributários. Os ministros vão decidir sobre a constitucionalidade do fim do voto de qualidade no Carf, discussão que foi suspensa em junho do ano passado depois de pedido de vista do ministro Alexandre de Moraes.

As câmaras do Conselho Administrativo de Recursos Fiscais (Carf) são órgãos de julgamento, com metade dos conselheiros indicada pela Receita Federal e a outra metade por entidades de representação dos contribuintes (associações, federações…). Esta composição muitas vezes gera empate nas decisões. O parágrafo 9º do artigo 25 do Decreto nº 70.235/72 previa que o desempate (o voto de qualidade) cabia ao presidente da turma, sempre um representante da Fazenda Nacional, que, na maioria das vezes, acabava sendo favorável ao Fisco.

Em 2020 foi promulgada a Lei nº 13.988/2020, que, entre outras medidas, dispôs que “em caso de empate no julgamento do processo administrativo de determinação e exigência do crédito tributário, não se aplica o voto de qualidade a que se refere o parágrafo 9º, do artigo 25, do Decreto nº 70.235, de 6 de março de 1972, resolvendo-se favoravelmente ao contribuinte”.

No mesmo ano, contudo, o Ministério da Economia publicou a Portaria ME nº 260/2020, disciplinando os julgamentos no âmbito do Carf em casos de empate na votação e estabeleceu que a proclamação de resultado favorável ao contribuinte, no caso de empate, não se aplica a julgamentos de matérias de natureza processual, conversão do julgamento em diligência, embargos de declaração e outras competências do Carf, ressalvadas algumas hipóteses.

O julgamento do STF vai estabelecer exatamente quais são os parâmetros que valem para o desempate. As três ADIs serão julgadas em conjunto. Uma delas foi apresentada pela Procuradoria-Geral da República e defende que a Lei 13.988/20, que acabou com o voto de qualidade, padece de inconstitucionalidade formal, por vício no processo legislativo porque o dispositivo que alterou a lei foi incluído em uma medida provisória que regulamentava transações tributárias no país.

A outra, iniciativa do Partido Socialista Brasileiro (PSB), alega que a medida desequilibra os julgamentos no conselho, porque privilegia o polo privado, fere a soberania do Estado e acaba com a paridade na discussão sobre o controle de legalidade dos atos do Fisco. A última partiu da Associação Nacional dos Auditores Fiscais da Receita Federal do Brasil (Anfip) e sustenta que o fim do voto de qualidade vai provocar perda de arrecadação para os cofres públicos.

O julgamento no STF tem, até agora, os votos do relator, o ministro Marco Aurélio, já aposentado, e o voto divergente do ministro Luís Roberto Barroso. Marco Aurélio defendeu a inconstitucionalidade da mudança legislativa. Segundo a avaliação dele, foram incluídos, durante a fase de conversão da medida provisória em lei, dispositivos tratando de tema sem relação com a proposta original.

O ministro Barroso divergiu, considerando a nova norma constitucional. Ele propôs a seguinte tese: “É constitucional a extinção do voto de qualidade do presidente das turmas julgadoras do Carf, significando o empate decisão favorável ao contribuinte. Nessa hipótese, todavia, poderá a Fazenda Pública ajuizar ação visando a restabelecer o lançamento tributário”.

Especialista em direito tributário, Bruna Luppi, sócia do escritório Vieira Rezende Advogados, considera imprevisível o resultado do julgamento. Em entrevista para Bússola, analisa o caso:

Bússola: A extinção do voto de qualidade tem, até agora, dois votos. O do relator, o ex-ministro Marco Aurélio, pela inconstitucionalidade, continua a valer depois da aposentadoria dele? Ou o STF terá de indicar novo relator e tudo recomeça do zero?

Bruna Luppi: Em princípio poderia se entender que o voto do ministro Marco Aurélio, na condição de relator das ADIs, continuaria a valer mesmo depois de sua aposentadoria. Como o julgamento se iniciou no ano passado de forma virtual, foi suspenso por pedido de vista e, em seguida, transferido para o plenário presencial, é possível defender que teria havido destaque ao caso, o que poderia admitir o reinício do julgamento e a indicação de novo relator, que nesse caso seria o ministro André Mendonça.

Nessa hipótese, o voto do ministro Marco Aurélio não teria mais validade, permitindo às partes a possibilidade de nova sustentação oral para o posterior voto do relator. Tudo vai depender desta sessão de quarta-feira.

É possível prever alguma tendência de resultado com a nova composição do Supremo, com os dois ministros indicados pelo presidente Bolsonaro?

O julgamento ainda está no início e a expectativa é que os debates sejam aprofundados. A discussão, vale pontuar, se refere não apenas a alegados vícios formais no processo legislativo de criação da nova regra [por meio de emenda parlamentar foi inserida em lei matéria de iniciativa reservada e sem pertinência com o texto original da medida provisória], mas também a aspectos materiais quanto à própria extinção do voto de qualidade, com questionamento de violação à soberania, princípio da prevalência do interesse público sobre o privado, segurança jurídica, entre outros aspectos.

Seria, portanto, prematuro prever alguma tendência de resultado, independentemente da nova composição da Corte.

Se o STF considerar constitucional o fim do voto de qualidade, como ficam os casos já julgados com base na lei anterior? E como ficam os casos já julgados, se considerar inconstitucional?

Caso o fim do voto de qualidade seja declarado constitucional pelo STF haverá uma definição quanto à validade do novo critério de desempate, que será resolvido a favor do contribuinte. Assim, a expectativa é que as decisões do Carf desde abril de 2020, que passaram a adotar o novo critério, sejam finalmente confirmadas, trazendo um ambiente de maior segurança jurídica.

Outras questões, contudo, podem se tornar centrais, como a discussão entre o Fisco e os contribuintes em torno da interpretação da Portaria nº 260, de 1º/7/2020, do Ministério da Fazenda, que restringe a extinção do voto de qualidade apenas a julgamento de processo administrativo em que há exigência de crédito tributário por meio de auto de infração ou de notificação de lançamento.

E mantém a exigência em casos de responsabilidade tributária, questões processuais, conversão de julgamento em diligências e embargos de declaração.

Não se descarta, contudo, que a Fazenda Nacional pretenda ver reconhecida a possibilidade de discutir judicialmente as decisões administrativas decididas pelo novo critério de desempate.

Embora seja um completo absurdo admitir tal situação, não podemos esquecer que a possibilidade foi levantada no voto do ministro Luís Roberto Barroso. Nesse caso, haveria uma enxurrada de ações judiciais por parte do Fisco Federal.

No caso de o fim do voto de qualidade ser considerado inconstitucional, a decisão será usada pelo Fisco para questionar a validade de todas as decisões administrativas decididas em favor dos contribuintes desde abril de 2020.  E se houver uma mudança nas decisões administrativas por conta disso, restará aos contribuintes a via do Judiciário.

Vale lembrar que, por razões de segurança jurídica ou de interesse social, o STF pode definir a abrangência da decisão para restringir seus efeitos ou mesmo decidir que tenham eficácia a partir do seu trânsito em julgado ou de outro momento. Para não criar um ambiente ainda maior de insegurança jurídica e de contencioso entre o Fisco e os contribuintes, tal providência seria plenamente plausível, recomendada e adequada do ponto de vista jurídico.

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