Renato Krausz: o ESG num mundo com febre
Do começo da pandemia para cá, otimistas e pessimistas não podem discordar que o saldo geral do planeta está longe de se tornar positivo
Bússola
Publicado em 30 de junho de 2022 às 10h49.
Última atualização em 30 de junho de 2022 às 11h33.
Este texto que mal começo a escrever, se não o abandonar pelo caminho, será o 100º que publico nesta Bússola sobre ESG. O primeiro artigo foi num longínquo 4 de julho de 2020 — e era para ser filho único. Mas aí veio outro, depois mais dois, e a partir do quinto a coisa se tornou semanal. Primeiro aos domingos e atualmente às quintas-feiras. Religiosamente.
Nesses dois anos, todo mundo viu, o ESG explodiu. Virou mantra para boa parte — ou para a parte boa — de lideranças empresariais e políticas. Talvez nunca antes um tema tenha sido galgado com tanta rapidez à rotina e às preocupações do mundo corporativo.
E eu vi isso de perto nas empresas e aprendi muito. Li pacas sobre o assunto, conversei com muita gente fera e decidi até mesmo enfrentar o estudante impostor que sempre existiu em mim para voltar aos bancos escolares numa pós-graduação em sustentabilidade. Tudo isso tem sido ótimo.
Pena que o mundo tenha ficado pior.
É certo que estamos saindo de uma pandemia para a qual há dois anos não existia vacina e da qual não sabíamos se a humanidade escaparia. Mas a estamos deixando para trás aos trancos e barrancos, com um rastro de destruição e morte.
Temos a fome que reapareceu com força em países como o Brasil. Fomos premiados com uma guerra, que deve não apenas acirrar o problema da falta de comida como também o do aquecimento global, visto que desencadeou no planeta uma desenfreada corrida pelo petróleo.
Antes que eu me perca na aliteração das desgraças — desigualdade, desmatamento, desilusão... — talvez seja de bom tom buscar um filtro positivo para bater os olhos nesses últimos dois anos. Vamos tentar.
Bem, a vacina veio. O Donald Trump se foi. E o que mais? Há outras coisas. Muitas companhias têm levado o ESG a sério. O tema de DE&I está finalmente ganhando a atenção que sempre deveria ter tido, embora os avanços concretos nesta área sejam difíceis e mais lentos do que deveriam ser.
Não sei se é impressão minha, é provável que o ponteiro da empatia tenha dado uns pulinhos para a frente, enquanto o de coisas idiotas, porém gravíssimas e destrutivas para a convivência humana, como o machismo, o racismo e a homofobia, tenham regredido um pouco. Só um pouco.
Nessa troca de filtros pessimistas e otimistas, o saldo final, pelo menos para este colunista, ainda é negativo. Não se trata de culpar o ESG, de forma nenhuma. Sem ele e sem a pressão que cidadãos, consumidores e investidores temos colocado sobre práticas predatórias que se cometem há anos, nosso buraco estaria ainda mais fundo. Mas vamos combinar que essa pressão deveria ser maior. E vamos torcer por isso.
Vejam, não abandonei o texto. Só não posso terminá-lo sem antes agradecer aos leitores pela companhia nesses dois anos e aos editores pela paciência com esses 100 artigos. Quem sabe um dia, se eu chegar a 200, tenha a chance de entregar um punhado de linhas menos carrancudas que se prestem a celebrar um mundo cuja febre esteja finalmente em vias de baixar.
*Renato Krauszé sócio-diretor da Loures Comunicação
Este é um conteúdo da Bússola, parceria entre a FSB Comunicação e a EXAME. O texto não reflete necessariamente a opinião da EXAME.
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