As empresas prosperarão ao integrar a tecnologia para garantir a sustentabilidade humana (Freepik/Freepik)
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Publicado em 19 de dezembro de 2025 às 07h00.
O debate sobre a redução da jornada 6x1 expõe uma questão mais profunda no mercado de trabalho brasileiro: a incapacidade das organizações de traduzir consciência em mudança real.
Enquanto 80% das empresas reconhecem a importância de uma cultura de bem-estar, apenas 19% efetivamente constroem esse ambiente – segundo pesquisa do professor Jan-Emmanuel De Neve, de Oxford.
O resultado desse descompasso aparece nos números:
"Vivemos uma pseudoprodutividade: estamos muito ocupados, mas nem sempre trabalhando muito bem", analisa Renata Rivetti, CEO da Reconnect Happiness at Work e especialista em ciência da felicidade.
Para a executiva, o problema não está na falta de diagnóstico – as empresas já sentem na pele o custo do turnover elevado, das licenças médicas e do absenteísmo. O desafio é atuar na causa raiz.
"Não se trata de oferecer programas pontuais de bem-estar, mas de construir culturas genuínas que transformem estruturalmente o ambiente de trabalho", diz.
A primeira é a aceleração tecnológica impulsionada pela inteligência artificial generativa. Segundo a McKinsey, até 2030 apenas um terço das atividades será executado exclusivamente por pessoas – atualmente, 47% das atividades são realizadas por pessoas.
"A tecnologia pode reduzir o operacional e o repetitivo, permitindo que possamos focar no criativo e nas habilidades mais humanas", pontua Rivetti.
O Fórum Econômico Mundial corrobora: 44% das habilidades dos trabalhadores sofrerão mudanças até 2030, sendo que as cinco competências mais demandadas já são humanas – pensamento analítico, influência social, adaptabilidade, resiliência e pensamento criativo.
A segunda transformação diz respeito à flexibilidade – não apenas de local ou horário, mas de modelos de trabalho.
Tendências como a semana de quatro dias e escalas revisadas em setores tradicionalmente rígidos (hotelaria, turismo, comércio) ganham força, especialmente com a discussão recente sobre o fim da jornada 6x1.
Rivetti identifica quatro obstáculos centrais que os profissionais enfrentarão nos próximos anos:
O neurocientista Ian McGilchrist estima que, até 2050, o volume de conhecimento que levava 100 anos para ser assimilado será processado em apenas 5 anos.
A necessidade de aprendizado contínuo, com tendências como o microlearning ganhando espaço nas organizações.
58% dos jovens sentem que não têm propósito na vida, segundo a Harvard Graduate School of Education.
19% dos jovens se sentem sozinhos no mundo, conforme o World Happiness Report.
"A palavra-chave para superar tudo isso é intencionalidade. Não adianta esperar o mundo perfeito. É preciso intenção, estudo, descanso e cultivo das relações sociais", orienta a especialista.
As organizações não podem mais adotar uma postura reativa. Rivetti recomenda que testem modelos mais flexíveis e híbridos, mas alerta:
"Precisam desenhar muito mais do que programas de bem-estar, e sim uma cultura que traga segurança psicológica, pertencimento, inclusão, espaço para escuta ativa e colaboração". Dois desafios são prioritários:
Criar uma cultura genuína de aprendizado contínuo, com formatos ágeis e aplicáveis.
Revisar processos burocráticos, excesso de reuniões, falhas de comunicação e estruturas que drenam energia dos colaboradores.
"As empresas prosperarão ao integrar a tecnologia para garantir a sustentabilidade humana, tendo como diferencial o pensamento crítico, analítico e criativo. Precisamos trazer o diferencial do ser humano", conclui Renata Rivetti.