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O papel da tecnologia na educação financeira da geração alpha

Em artigo, presidente do Conselho do Instituto Propague fala sobre tecnologia e educação financeira

Mesada: Técnica pode deixar crianças acostumadas com dinheiro garantido, diz autor (Money/Thinkstock)

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Publicado em 30 de outubro de 2023 às 07h00.

Por Carlos Ragazzo*

Desde 2020, o Brasil tem passado por uma grande onda de inclusão financeira, especialmente por meio digital. Com a expansão consistente do Pix e dos cartões, a desbancarização está em uma trajetória significativa de queda. No entanto, a inclusão por si só não é suficiente; precisamos de uma população capaz de compreender produtos financeiros e tomar decisões adequadas. Idealmente, a construção dessa capacidade deve começar na infância.

Um pouco distante da idealização, o Brasil apresenta o 4º pior resultado no PISA (Programa Internacional de Avaliação de Alunos) em relação a temas financeiros. Quando olhamos para a matemática, 68% dos estudantes não alcançam proficiência básica. Embora influências socioeconômicas desempenhem um papel significativo, fenômenos como o alto endividamento das famílias - que atingiu 77,4% em agosto - também estão associados à crescente falta de acesso à educação financeira desde a infância.

Começar a olhar para o tema é fundamental não só para o sistema financeiro, mas para a qualidade de vida das pessoas e a economia de forma geral. Com isso, a tecnologia é mais do que uma aliada no processo: com um sistema financeiro cada vez mais digitalizado e as novas gerações sendo consideradas "nativas digitais", a associação entre tecnologia e educação financeira deixa de ser acessória e passa a ser parte indissociável do processo.

Educação financeira e tecnologia: barreiras educacionais

O debate é complexo e não pode ser conduzido sem a participação da comunidade escolar, em particular dos professores. Infelizmente, não é raro encontrar escolas brasileiras que carecem de banheiros, eletricidade e infraestrutura básica, conforme demonstrado pela pesquisa realizada no Censo Escolar da Educação Básica de 2020. No entanto, uma pesquisa subsequente da mesma instituição, em 2022, revela que 73,8% das escolas de ensino fundamental da rede municipal e 91,5% da rede estadual possuem acesso à internet para fins administrativos, mas somente 48,5% e 77% delas têm acesso à internet para atividades com os alunos..

O país ainda enfrenta diversos problemas relacionados à carreira docente, incluindo baixos salários, escassez de professores em determinadas disciplinas e regiões, e sobrecarga de trabalho para aqueles que estão na rede de ensino. Não é surpreendente, portanto, ouvir questionamentos sobre como abordar temas como educação financeira e tecnologia em um cenário tão desafiador. No entanto, ambas as discussões são importantes e podem ser conduzidas dentro do contexto do reconhecimento dessas limitações.

Ainda, crianças brasileiras, em larga maioria, não sabem o suficiente para serem consideradas sequer alfabetizadas financeiramente pelos critérios da Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE), que inclui saber operações matemáticas simples, juros compostos e o conceito de inflação. Esse tipo de conhecimento não depende de uma disciplina específica nas escolas, nem de uma grande estrutura para ser incorporado a outras disciplinas e sim de uma alfabetização financeira, priorizando garantir o básico antes de almejar objetivos maiores. O papel da tecnologia está diretamente associado a este objetivo.

O papel da tecnologia na educação financeira das crianças:

  • Aumentar o engajamento das crianças com o tema;
  • Facilitar o processo de treinamento dos educadores e gestores responsáveis pelo processo;
  • Abrir espaço para o desenvolvimento de produtos financeiros destinados ao público infanto juvenil.

Começando pelo primeiro ponto, organismos internacionais como a Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE), o Banco Mundial, o G20 (Grupo dos 20, que é composto pelos ministros de finanças e chefes dos bancos centrais das 19 maiores economias do mundo, além da União Africana e União Europeia) e a International Organization of Securities Commissions (IOSCO) publicaram materiais indicando o potencial da digitalização da educação financeira, principalmente para despertar o interesse no tema. Em 2021, a empresa britânica Hargreaves Lansdown revelou que um em cada cinco jovens interessados em assuntos financeiros mencionou o TikTok como fonte de informação. No entanto, um estudo deste ano do Swiss Finance Institute Research identificou que 56% dos conteúdos disponíveis em redes sociais são prejudiciais à saúde financeira. Portanto, há uma oportunidade de direcionar o interesse das crianças para meios digitais desde cedo, desde que sejam usados materiais verdadeiramente educativos e canais oficiais.

A distribuição de vídeos curtos e outros formatos de materiais interativos, é uma forma de facilitar o aprendizado e ainda podem ser disponibilizados prontos para as redes apenas para distribuição, como já é feito com outros materiais didáticos, tirando a carga adicional de trabalho em cenário de escassez.

A tecnologia também desempenha um papel fundamental ao agilizar e ampliar a escala de treinamento de educadores. Essa abordagem já está sendo aplicada no Brasil através do projeto Aprender Valor, uma parceria entre o Banco Central e as Secretarias de Educação. Este projeto já treinou mais de 1,9 mil profissionais durante seu piloto e conta com mais de 60 mil cadastrados no sistema. O programa foi estendido a mais de 10 mil escolas, abrangendo quase um terço dos municípios do país em um período de 3 anos (2019-2021), graças à digitalização do processo. Desde que a qualidade da capacitação seja mantida, a tecnologia apresenta um enorme potencial para aumentar a eficiência da formação continuada.

Por fim, a tecnologia tem permitido o desenvolvimento de produtos financeiros dedicados especificamente às crianças, com funcionalidades adequadas ao público e inclusão de materiais de educação financeira básica nos aplicativos. Basicamente, a ideia tem sido criar uma lógica de "mesada digital" acompanhada de conteúdo educativo que visa antecipar e gamificar o contato das crianças com o universo do sistema financeiro.

Essas são apenas algumas formas pelas quais a digitalização pode beneficiar a educação financeira infantil. Há outras. Apesar da complexidade do tema e das limitações, não é mais possível ignorar os impactos de uma população com baixa capacidade financeira. Se um dia houve a ideia de que o tema era "chato" e "coisa de rico", profissionais como Nath Finanças e outros produtores de conteúdo vêm mostrando como pode ser interessante e fundamental para todo tipo de público e o poder do formato digital para fazê-lo. Estender esse pensamento às nossas crianças, será fundamental para que a modernização do sistema financeiro alcance seu potencial de melhora da qualidade de vida do brasileiro.

Carlos Ragazzo é presidente do Conselho do Instituto Propague

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