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Números capturados pela polarização

Coluna semanal do analista político Alon Feuerwerker* aprofunda o cenário político e traz os impactos na economia e na sociedade

Análise & Conjuntura: coluna semanal do analista político Alon Feuerwerker (Bússola/Reprodução)

Análise & Conjuntura: coluna semanal do analista político Alon Feuerwerker (Bússola/Reprodução)

Mariana Martucci

Mariana Martucci

Publicado em 17 de agosto de 2020 às 15h57.

Já faz algum tempo as pesquisas mostram a tendência de retorno ao padrão de um país dividido em três pedaços aproximadamente equivalentes na avaliação do governo. O movimento anterior tinha sido um leve sofrimento do “bom e ótimo”, e deslocamento do “regular” em direção ao “ruim e péssimo”. Aparentemente, dizem todas as pesquisas, Jair Bolsonaro volta a mostrar resiliência, a propriedade de reassumir a forma original após uma deformação elástica.

Os números mais recentes do Datafolha trouxeram alguma surpresa, pois vieram logo após a blitz sofrida pelo presidente da República quando a contabilidade das mortes pela Covid-19  bateu na trágica casa dos 100 mil. Mas a própria pesquisa explicou a razão: quase metade da população não responsabiliza nem remotamente Jair Bolsonaro pela contabilidade fatal da pandemia por aqui. E os que o consideram o principal culpado não passam de 11%.

Para compreender melhor o Datafolha, será útil recorrer a um número de outro instituto, o PoderData, do site Poder360. O último levantamento quinzenal dele mostrou empate entre aprovação e reprovação do presidente. Na margem de erro, uma divisão ao meio entre quem  aprova e quem reprova. Aliás é a pergunta certa a fazer para saber a aprovação, pois sempre uma parte do “regular” aprova a administração quando é perguntada sobre isso.

O que está acontecendo? Uma hipótese: quando certo assunto é capturado pela polarização político-partidária, o público tende a distribuir-se, grosso modo, conforme a distribuição das convicções partidárias e eleitorais. Os efeitos da agitação e da propaganda, a favor ou contra, tendem a ficar confinados dentro da respectiva “bolha”.

A política não é principalmente uma disputa de argumentos. É esgrima de interesses e fidelidades em que os argumentos e a propaganda são armas para manter íntegro o próprio exército e tentar dividir o do adversário. Até agora, decorrido um ano e meio de governo, as forças bolsonaristas e antibolsonaristas preservam o tamanho exibido nas eleições. O “bom e ótimo” reproduz o market share do candidato Bolsonaro no primeiro turno, e o “aprova” oscila em torno do desempenho do presidente eleito no segundo turno.

O que seria capaz de alterar substancialmente o quadro? A radical degradação do quadro econômico? Foi evitada pelo auxílio emergencial de 600 reais. Um colapso dos serviços de saúde na pandemia e que pudesse ser debitado na conta do governo federal? Simplesmente não aconteceu. Tudo indica que estados e municípios estão fazendo seu trabalho e, notavelmente, não há queixas significativas de governadores e prefeitos quanto à atuação do Ministério da Saúde.

No mais, o eleitorado possivelmente encara com naturalidade os críticos culparem o presidente pelas mortes e dizerem que a atuação dele é um desastre na pandemia. Estranho seria os críticos não o culparem. O “Caso Queiroz”? É anterior ao mandato. Traz algum prejuízo, mas não atinge o cerne do discurso presidencial sobre a corrupção. Pois não há, por enquanto, acusações relevantes de corrupção ao governo propriamente dito.

*Analista político da FSB Comunicação. Coluna publicada também nos sites Poder360 e Migalhas

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