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Marcio de Freitas: Brasil, uma grande pista para o skate olímpico

O skate é um esporte praticado onde há barreiras, irregularidades, terreno escorregadio ou sinuoso; viver no Brasil é parecido

Assim como a modalidade park, que acontece num buraco, o Brasil parece insistir em viver também num desvio profundo do solo (Christian Pondella/Getty Images)

Assim como a modalidade park, que acontece num buraco, o Brasil parece insistir em viver também num desvio profundo do solo (Christian Pondella/Getty Images)

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Publicado em 5 de agosto de 2021 às 19h18.

Última atualização em 5 de agosto de 2021 às 19h47.

Por Márcio de Freitas*

A fadinha do skate, Rayssa Leal, mostrou toque mágico ao superar os obstáculos da pista da modalidade de street na Olimpíada e as injustiças sociais do país onde nasceu para conquistar a medalha de prata nos Jogos de Tóquio. E Pedro Barros circulou com velocidade pelo imenso buraco onde se pratica a modalidade park no skate para conquistar o segundo lugar na final olímpica. Mesma posição que Kelvin Hoefler já havia atingido na disputa pelo street masculino.

Na primeira vez que o esporte estreou como modalidade olímpica, o skate conquistou três medalhas de prata. E apresentou ao país uma turma jovem e descolada: misturam classes sociais, falam diferentes sotaques, comemoram as manobras dos adversários e celebram o futuro juntos, numa união que já foi vista em outros esportes coletivos, mas que a politização radical contaminou e dividiu. Rayssa já desembarcou no país e não quis encontros com políticos, que nunca a apoiaram antes da medalha. Deu as costas a quem jamais a olhou de frente.

Assistir aos atletas do skate deu saudade do Brasil. São ilhas do país que funcionam apesar de tudo. Usam praças esburacadas, vielas improvisadas, bancos quebrados, corrimãos enferrujados, calçadas irregulares, degraus onde deveria haver rampas para saltar e superar cada obstáculo. E quem mantém o equilíbrio com talento, habilidade e ousadia, vence.

O skate é um esporte praticado onde há barreiras, irregularidades, terreno escorregadio ou sinuoso. Viver no Brasil é parecido: tem-se um sistema de impostos punitivo, onde se paga muito em tributos e não se tem retorno em serviços condizentes do governo, com falta de saúde, educação e segurança pública de primeiro nível. Assim como a modalidade park acontece num buraco, o Brasil parece insistir em viver também num desvio profundo do solo. Se os skatistas conseguem usar as curvas e ondulações para realizar movimentos aéreos belíssimos, o brasileiro tem de se virar para não ser puxado para o fundo do poço. O buraco do país é mais embaixo... e insistindo em cavar.

A instabilidade política é acentuada. Acrescida de conflitos institucionais se tornarem permanentes. A agenda congressual é irregular e fechada ao debate com a sociedade. Nem o governo exerce o papel de diálogo para estabelecer diretrizes. Em torres de marfim, fiscais da Receita elaboram uma reforma tributária criticada pelo próprio presidente da República. Conselheiro Acácio se cala resignado pelo cansaço de repetir o aviso secular.

O país perde tempo debatendo teses do século 20, ultrapassadas e vencidas como uma moeda de cruzado ou atrasadas em mais de séculos quando comparadas a outras nações. A economia muda de forma relações, mas retomamos a pontos que haviam sido enterrados por mau funcionamento há décadas.

A lentidão dos debates explica por que, da pauta do Congresso, ainda se espera a deliberação sobre o novo Marco Regulatório das Ferrovias, enquanto a China avança numa rede de mais de 35.000 quilômetros em trens de alta velocidade, e já projeta alguns que andam a mais de 600 km/h. Iniciada em 1987 no governo de José Sarney, a Ferrovia Norte-Sul começou a operar por trechos. Ainda há obras por terminar os 4.500 quilômetros de extensão.

É infraestrutura básica para transporte da produção agropecuária de um país líder em exportação mundial de vários itens. Esperar debate sobre educação, com escolas fechadas e dezenas de crianças perdendo continuidade de ensino durante a pandemia, é um luxo fora do lugar.

Falar sobre política para o esporte é outra dificuldade. E mesmo isso após o Brasil conquistar um recorde de medalhas olímpicas neste ano, superando os obstáculos de falta de recursos e investimento — quatro anos após o Rio de Janeiro sediar uma edição dos Jogos.

Ao fim, vê-se que os poderosos no país estão de costas para o povo. É por isso que a jovem skatista Rayssa só retribuiu aos políticos do Maranhão o mesmo tratamento que o povo sempre teve.

*Márcio de Freitas é analista político da FSB Comunicação

 

**Este é um conteúdo da Bússola, parceria entre a FSB Comunicação e a Exame. O texto não reflete necessariamente a opinião da Exame.

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