Fabricio Polido: os principais pontos do marco legal da IA
Professor na UFMG explica a importância do PL 2338/2023
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Publicado em 19 de dezembro de 2024 às 07h00.
Por Fabricio Polido, Sócio de L.O. Baptista e Professor Associado da Faculdade de Direito da UFMG
No dia 10 de dezembro de 2024, o Senado Federal aprovou o Projeto de Lei 2338/2023, que institui o Marco Legal da Inteligência Artificial (IA) no Brasil. A regulamentação proposta coloca o país em sintonia com o movimento global de convergência entre legislações que buscam equilibrar inovação tecnológica com proteção aos direitos fundamentais e princípios éticos para o uso de IA. Inspirada em iniciativas como o AI Act da União Europeia, a proposta brasileira avança na tentativa de estabelecer segurança jurídica e fomentar o desenvolvimento e implementação de aplicações de IA fundadas em parâmetros legais.
Classificação de risco e aplicações proibidas
O PL divide as aplicações de IA em diferentes níveis de risco, tratando com especial atenção às tecnologias de "alto risco", como diagnósticos médicos, veículos autônomos e sistemas de reconhecimento biométrico . Igualmente, o PL prevê proibições expressas para sistemas de “risco excessivo”, como armas autônomas e o uso de técnicas subliminares que possam explorar vulnerabilidades humanas. Essa categorização não apenas confere um grau de proteção maior para a sociedade contra potenciais danos, como também estabelece critérios claros para o uso ético e seguro da IA.
Avaliação de impacto algorítmico
Um dos pontos de maior destaque no texto é também a exigência da Avaliação de Impacto Algorítmico (AIA) para sistemas de alto risco. Essa avaliação envolve a análise dos dados utilizados, impactos potenciais e medidas de mitigação. Trata-se de um mecanismo procedimental essencial para garantir transparência e identificar possíveis vieses discriminatórios, protegendo os direitos dos cidadãos. Embora inspirada no modelo europeu, a proposta brasileira se diferencia ao prever uma avaliação preliminar facultativa para sistemas não generativos e de propósito geral, oferecendo maior flexibilidade ao setor privado.
Proteção aos direitos autorais
Outro aspecto relevante diz respeito à proteção dos direitos de autor. O projeto prevê que obras protegidas podem ser utilizadas no treinamento de sistemas de IA, desde que obtidas de forma legítima e respeitando exceções e limitações como uso educacional ou para fins de pesquisa. A medida busca equilibrar os interesses dos criadores de conteúdo com o avanço tecnológico, garantindo a remuneração justa e a proteção contra usos indevidos, como os deep fakes.
Impacto no mercado de trabalho
No contexto trabalhista, o PL exige supervisão humana em decisões automatizadas que possam afetar trabalhadores, incluindo demissões e sanções disciplinares. Essa medida visa evitar a discriminação e assegurar que os impactos das decisões algorítmicas possam ser revisados. É um avanço importante na busca por um uso ético e justo da IA no ambiente profissional.
Governança e fiscalização
O regime de governança proposto também merece destaque. A Autoridade Nacional de Proteção de Dados (ANPD) foi designada como responsável pela regulamentação e fiscalização. Além disso, o texto cria o Sistema Nacional de Regulação e Governança de IA, que reunirá diferentes autoridades setoriais para assegurar a harmonização e efetividade das normas. As sanções administrativas, que incluem multas de até R$ 50 milhões, demonstram o compromisso do legislador com a aplicação rígida da lei.
Desafios e próximos passos
Contudo, alguns desafios permanecem abertos. A exclusão dos algoritmos de redes sociais da lista de "alto risco" e a limitação da responsabilidade sobre conteúdos gerados por IA são questões que merecem maior discussão e refinamento. Em cenários nos quais desinformação e manipulação são riscos reais, a integridade da informação não pode ser negligenciada, o que parece ser uma brecha perigosa para a futura lei.
De todo modo, a aprovação do PL 2338/2023 representa, sem dúvida, um passo significativo para a regulamentação da IA no Brasil. Ao garantir um ambiente regulatório seguro e alinhado às melhores práticas internacionais, o projeto cria as bases para que o país avance no desenvolvimento tecnológico sem abrir mão da proteção aos direitos fundamentais. Agora, cabe à Câmara dos Deputados assegurar a aprovação final desse texto, consolidando um marco histórico para a inovação e governança de IA no Brasil.
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