ESG e racismo: meio ambiente e governança ofuscam responsabilidade social
Para especialista em compliance, enquanto não se alcança a maturidade sobre responsabilidade social, haverá prejuízos financeiros trazidos pela desigualdade
Bússola
Publicado em 18 de julho de 2022 às 14h05.
Por Bússola
Casos recentes de racismo nas empresas mostram que ainda há um longo caminho pela frente quando o assunto é ESG (Environmental, Social and Corporate Governance) no Brasil, onde a discussão sobre meio ambiente e governança corporativa ainda ofusca a da responsabilidade social. A opinião é da advogada especialista em compliance Ana Paula Ávila, doutora em Direito pela UFRGS e especializada em Gerenciamento de Crises pelo MIT (Massachusetts Institute of Technology).
“Uma parte considerável das empresas só entende termos como risco, faturamento, lucro e prejuízo; então, para quem faz pouco caso do impacto social do racismo, pode ser interessante apresentar a conta do racismo para os boards executivos, onde as decisões estratégicas são tomadas”, diz Ana Paula, que também é sócia coordenadora da área de Compliance do escritório Silveiro Advogados.
Segundo ela, o desenvolvimento de estratégias para a promoção dos protocolos ESG nas empresas exige que os programas de compliance priorizem o monitoramento dos riscos que comprometem a questão social, sem prejuízo da urgência da pauta ambiental e da necessidade de avançar em termos de governança.
Em 2021, o Brasil registrou 6.003 casos de racismo, aumento de 31% sobre os 4.565 casos em relação ao ano anterior, segundo o Anuário Brasileiro de Segurança Pública. A pesquisa também revelou a disparidade entre negros e brancos vítimas da letalidade policial: 84,1% das vítimas eram negras.
Racismo institucional
No ambiente empresarial, o racismo se repete, apesar de dados ainda serem escassos no país. Uma pesquisa realizada no ano passado pela plataforma de empregos Indeed, em parceria com o Instituto Guetto, apontou que seis em cada dez profissionais brasileiros sentem discriminação racial no ambiente de trabalho e 47% deles dizem ter presenciado isso.
Recentemente, uma empresa foi condenada pelo TRF-4 (Tribunal Regional Federal da 4.ª Região) a indenizar em R$ 20 mil um funcionário negro que foi submetido a humilhações de conotação racista infligidas por um fornecedor da empresa (um terceiro, portanto). O tribunal considerou que a empresa estava ciente dessas humilhações e teve de responder por sua omissão.
“Existem manifestações diárias e sucessivas de preconceito racial no âmbito das empresas. E são casos com grande impacto social e com repercussão, inclusive, na esfera criminal, tendo todas as credenciais para serem considerados eventos tão danosos à imagem e às finanças da empresa quanto os casos de corrupção”, afirma Ana Paula.
Avanços e soluções
Mas nem todas as empresas ignoram o problema. Em junho do ano passado, 45 companhias de diferentes setores lançaram uma iniciativa para combater o racismo no país, o “Mover - Movimento pela Equidade Racial”. Nomes de peso como Ambev, Coca-Cola, Carrefour e Nestlé integram a iniciativa.
Para Ana Paula, algumas medidas podem auxiliar os empreendimentos nacionais na busca pelo estabelecimento de protocolos ESG que incluam o combate ao racismo. Entre eles, a inclusão e desenvolvimento de lideranças que pertencem a grupos minoritários; a definição de metas de diversidade, após pesquisa para a realização de censo corporativo.
Na opinião da advogada, os grandes players do mercado, que são grandes consumidores de insumos e serviços, podem definir métricas de capital humano aos seus fornecedores, cobrando responsabilidade social e diversidade; as empresas também podem criar programas de responsabilidade social ou aderir a programas existentes em outras instituições governamentais ou não-governamentais, e procurar implementar a cultura de diversidade de forma sistêmica, realizando campanhas de comunicação interna sobre as vantagens da promoção da diversidade para a empresa e para a sociedade.
“A conta da discriminação racial começa a ficar mais visível nas empresas, demonstrando que esse risco deve ser atacado com a mesma determinação dedicada a outros eventos que podem causar danos à reputação e prejuízos financeiros à organização. É importante, também, que o pensamento corporativo evolua para que essas medidas sejam amparadas com base na igualdade e na justiça social, pois elas simplesmente miram no que é o certo”, afirma.
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