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Emannuelle Junqueira: você sabe quem faz o que você veste?

É fundamental lembrar que todos somos consumidores e que incentivar as atitudes corretas das empresas é papel de cada um

Tudo o que escolhemos comprar diz algo sobre nós (foto/Reprodução)

Tudo o que escolhemos comprar diz algo sobre nós (foto/Reprodução)

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Publicado em 17 de dezembro de 2021 às 17h16.

Última atualização em 17 de dezembro de 2021 às 17h27.

Por Emannuelle Junqueira*

Recentemente, a Lush, marca de cosméticos do Reino Unido, decidiu limitar seus perfis ao Twitter e YouTube enquanto elabora uma solução de comunicação com seus clientes mais vantajosa para todos, fora de redes sociais como Instagram, Facebook, TikTok e Snapchat. A empresa discorda da forma como as companhias responsáveis por essas redes lidam com as questões relacionadas à saúde mental dos usuários. Jack Constantine, chefe de estratégias digitais da marca, disse ao jornal inglês The Guardian que não parece certo manter contato com os clientes por meio de plataformas que colocam em risco o próprio bem-estar das pessoas.

A Lush anunciou a saída das redes ao lançar o manifesto que chamou de Global Anti-Social Media Policy, onde lista as prioridades que vão guiar a comunicação da empresa nos 48 países onde atua fisicamente — as atividades no Brasil foram encerradas há quase quatro anos, motivadas pelas condições econômicas e políticas no país, segundo a própria marca.

A comunicação se dará, diz um dos pontos, “por meio de plataformas que não utilizem algoritmos para entregar conteúdo negativo, fake news ou pontos de vista extremos com o intuito de aumentar engajamento e outras métricas”.

O posicionamento é firme e deixa claro quais são as opiniões da marca. Quem consome — e são muitas pessoas, especialmente porque é uma marca querida dos ambientalistas, dada sua atuação sustentável —, incentiva e apoia o que a marca prega.

Adquirir algo produzido por uma companhia que se posiciona é, também, adotar um posicionamento. O que dizer de uma pessoa que, entre milhares de opções de cosméticos, escolhe comprar seus produtos em uma marca que tem voz ativa na defesa da sustentabilidade?

Ao escolher um produto escolhemos quem o produziu, direcionamos para o produtor o nosso dinheiro, incentivamos sua produção e o recompensamos pela forma como ele nos forneceu o produto escolhido. Seja um pequeno botão de camisa, seja um apartamento, tudo o que escolhemos comprar diz algo sobre nós.

No contexto do ambiente, nosso posicionamento nunca foi tão importante. Suas escolhas dizem quem você é e quem você afeta no mundo. Já parou para pensar no tamanho dessa responsabilidade?

Infelizmente, o mundo da moda faz parte de uma triste estatística.

Está entre as mais poluidoras do mundo e, o pior, a transparência das informações a respeito das atividades e dos danos causados pelos gigantes varejistas está longe de ser a ideal. Ao passo em que defendemos a conscientização da sociedade na hora de adquirir bens, também é preciso fornecer essas informações de forma limpa, organizada e com fácil acesso. Apesar de índices um pouco melhores, o nível geral de transparência no varejo é insatisfatório em vários aspectos.

Segundo o Instituto Fashion Revolution Brasil, em 2021, o relatório anual que avalia o nível de transparência das 50 maiores varejistas do país, nenhuma das marcas nacionais publica compromissos para o desmatamento zero. Aliada às informações do relatório — esse, produzido pela Stand.Earth — que relacionou o desmatamento da Amazônia a mais de 100 marcas globais, essa informação só nos coloca na mesma esteira que os estrangeiros que tanto acusamos de não dar a atenção necessária ao nosso ambiente.

No Brasil, apenas 22% das grandes varejistas publicam compromissos mensuráveis de descarbonização. O mesmo percentual publica metas, com base científica, a respeito do clima e outros tópicos ambientais. Somente 18% publicam, anualmente, a pegada de carbono da rede de fornecedores e 10% apenas divulgam, anualmente, a pegada de carbono no nível da matéria prima. Essa foi a quarta edição do ITBM e, como é possível constatar, ainda engatinhamos no caminho de uma indústria mais transparente e mais igualitária na divisão de responsabilidades sobre os danos que causam e sua participação nas questões climáticas.

Há inegáveis avanços — por exemplo, o aumento de 7% no indicador da pegada de carbono das próprias instalações — nesta edição, foram 32%, enquanto em 2020, ficou em 25%. Isso significa que o trabalho está começando?

Responsável por 4% do total das emissões globais de gases de efeito estufa, a moda se interliga com diversos outros problemas socioambientais. E, apesar de isso ser uma constatação, é uma indústria que ainda parece completamente descolada dessa realidade.

No quesito justiça social, sempre associado à causa ambiental, o relatório mostra que apenas 12% das marcas analisadas publicam a diferença salarial entre homens e mulheres dentro da empresa.

A transparência é apenas um passo para a transformação real que a indústria precisa. De nada adianta revelar dados e números se eles não vierem acompanhados de uma análise minuciosa, que precisa guiar as mudanças sistêmicas e estruturais nas empresas. Somente assim entenderemos o que precisamos mudar.

Em momentos de crises e incertezas, como nos últimos anos que vivemos, é crucial que o movimento de mudança, baseado no conhecimento que adquirimos, aconteça. Expandir o papel da moda é estar presente de forma ativa nas grandes questões que nossas atividades abrangem. Estar ou não engajado nesse contexto é uma escolha diária. Precisa ser parte da rotina, tal qual um hábito cultivado ao longo dos anos.

Procurar informações sobre quem faz tudo o que consumimos deveria ser um hábito. Antes de comprar um alimento, devemos saber como e por quem ele é produzido. Como esse produtor se posiciona diante das questões que consideramos importantes? Precisamos conhecer para valorizar, reunir informações para fazer as melhores escolhas. É das pequenas escolhas que nascem os grandes hábitos. É das decisões que tomamos a cada momento que se compõe a única forma de contribuirmos e nos posicionamentos em meio ao consumo.

É preciso, sim, ter consciência enquanto produtor. Mas também é fundamental lembrar que todos somos consumidores e que incentivar as atitudes de uma empresa é nosso papel. É preciso ser responsável pela escolha que se faz. Tanto ao abrir um negócio quanto na hora de comprar.

Com o fim de ano batendo à porta, as reflexões se intensificam e por isso, aproveito para pedir alguns minutos do seu tempo nesse assunto. Quem é você como consumidor? O que suas escolhas dizem sobre você? Novos 365 dias de novas possibilidades, escolhas e atitudes vêm aí.

Vamos nos lembrar que é preciso manter os olhos no futuro: ao fim de 12 meses, o que você tem para contar do seu ano? A cada escolha, a cada decisão e a cada passo, você está mais próximo de onde quer chegar. A questão principal, neste caso, é: se você já sabe para onde deve ir, o que vai vestir nesse caminho?

*Emannuelle Junqueira é diretora criativa da marca que leva seu nome, designer, empreendedora e apresentadora do Prova de Noiva no Discovery H&H

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