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Claudia Elisa: A transparência radical e as reuniões de conselhos

Transparência máxima, quando inserida de forma respeitosa no diálogo, consegue qualificar exponencialmente a tomada de decisões

Estar aberto a receber críticas construtivas é o caminho para o sucesso (Harbucks/Getty Images)
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Bússola

Publicado em 9 de agosto de 2022 às 10h40.

Por Claudia Elisa Soares*

Imagine você, fundador de uma empresa bilionária, recebendo o seguinte e-mail de um funcionário: "Você merece uma nota 3 por seu desempenho na reunião de hoje (...).  Ficou óbvio para todos que você não estava preparado, porque, se estivesse, não teria se mostrado tão desorganizado quando a conversa começou (...). Hoje foi muito ruim... Não podemos deixar acontecer de novo".

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Em 99% das empresas, dirigir-se à alta liderança de forma tão ousada provavelmente renderia um revés ao colaborador, como a perda do emprego, por exemplo. Mas na Bridgewater, a maior e mais lucrativa empresa de gestão de investimentos do mundo, não.

Adepto da chamada transparência radical, Ray Dalio, o fundador da empresa que recebeu o "desaforado" e-mail, não só não repreendeu o profissional como encaminhou sua mensagem para os outros participantes da reunião, pedindo que também lhe dessem uma nota de 0 a 10. Além disso, copiou todos os funcionários para que acompanhassem a conversa.

Dalio age assim pois entende (utopicamente ou não) que o time inteiro de uma empresa, independentemente do cargo, tempo de casa ou idade, deva se manifestar livremente, desde que seja em prol da melhoria da empresa.

Aliás, mais que isso. Num dos princípios que regem a cultura da companhia, está escrito que "ninguém tem o direito de ter uma opinião crítica sem torná-la pública".

Embora aparentemente bem-sucedida na Bridgewater, não creio que a transparência radical seja passível de adoção global nas empresas, principalmente em uma cultura corporativa acostumada a dourar a pílula, como a latino-americana.

Contudo, seus pontos-chave podem e devem ser adotados em conselhos, já que a transparência é um dos quatro princípios da governança corporativa, junto com equidade, prestação de contas e responsabilidade corporativa.

Acredito que a transparência máxima, quando inserida de forma respeitosa no diálogo, tem o poder de qualificar exponencialmente a tomada de decisões.

Explico: nas reuniões de conselhos, tratamos de pautas com forte viés estratégico e o que for alinhado dentro da sala certamente impactará no futuro da companhia.

Por isso, cada item deve ser analisado com muito critério, responsabilidade e rigor. A fim de chegar à melhor decisão, todos devem colocar seus pontos de vista sobre a mesa, de forma clara, direta e sem receios de ferir suscetibilidades.

Tudo tem que estar bem amarrado, sem pontas soltas ou dubiedades. Cabe ao presidente conduzir o debate com fluidez e equilíbrio, estimulando o aprofundamento do tema até que cada integrante tenha esgotado suas falas.

A partir daí, busca-se o consenso.

Às vezes, dependendo da sensibilidade do tema, é natural haver divergências. O que é bom, pois o contraditório, o paradoxal, exige mais reflexão e capacidade analítica dos integrantes.

Nunca é demais lembrar que os boards são formados por profissionais altamente gabaritados, geralmente ex-C-levels de grandes empresas nacionais e multinacionais.

São pessoas convictas de seus posicionamentos, acostumadas a liderar e a tomar decisões importantes. Assim, tem-se um time propício para um debate rico, pontos discordantes.

No processo de colocar todos os “pingos nos is”, a transparência torna-se ainda mais fundamental, servindo como uma das balizadoras da decisão final, que, no fim, deve ser aquela que trará mais benefícios para a companhia.

Por isso, o conselheiro nunca deve tomar algo como pessoal, principalmente quando uma defesa de tese sua for contrariada. O papel do board é escolher o melhor para o coletivo, e não para o indivíduo.

Particularmente, aprecio muito dinâmicas neste estilo, com a troca madura e franca de ideias em alto nível, pois acaba sendo não apenas um método de trabalho, mas também um exercício de cidadania, democracia e respeito.

*Claudia Elisa Soares é especialista em ESG e transformação de negócios e líderes e conselheira em companhias abertas e familiares — Tupy, Even, Grupo Cassol, Bernoulli Educação e Gouvêa Ecosystem

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