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Testemunhas acusam Ustra de sequestro

Três ex-presos políticos afirmaram em audiência que o coronel participou de crimes de sequestro e tortura durante o regime


	O coronel reformado Carlos Alberto Brilhante Ustra: ele alegou problemas de saúde e não compareceu 
 (Wilson Dias/ABr)

O coronel reformado Carlos Alberto Brilhante Ustra: ele alegou problemas de saúde e não compareceu  (Wilson Dias/ABr)

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Da Redação

Publicado em 10 de dezembro de 2013 às 07h37.

São Paulo - No primeiro processo do Brasil em que agentes da ditadura militar são levados ao banco dos réus e confrontados com testemunhas de acusação em uma ação criminal, três ex-presos políticos afirmaram nesta segunda-feira, em audiência no Fórum Criminal de São Paulo, que o coronel reformado Carlos Alberto Brilhante Ustra participou de crimes de sequestro e tortura durante o regime.

A audiência foi realizada para ouvir as testemunhas do desaparecimento de Edgar de Aquino Duarte, que figura desde 1973 nas listas de desaparecidos políticos durante o regime militar (1964-1985). Ele foi detido ilegalmente em 1971 e levado para as dependências do Destacamento de Operações Internas do 2.º Exército (DOI-Codi), chefiado pelo então Major Ustra.

A ação penal ajuizada pelo Ministério Público Federal contra os ex-agentes é de sequestro, já que até hoje Edgar é considerado desaparecido, pois seu corpo nunca foi encontrado.

Brilhante Ustra alegou problemas de saúde e não compareceu - mas lá estavam os outros dois réus da ação penal pelo sequestro de Edgar, os delegados Alcides Singillo e Carlos Alberto Augusto, este conhecido com "Carteira Preta".

Antes do início da audiência, Carlos Augusto bateu boca com ex-presos políticos que estavam presentes no plenário. "Não dá para aguentar estes presos tirando sarro", reclamou ele em voz alta, o que lhe valeu uma repreensão pelo juiz Hélio Egidio Nogueira, que comandava a sessão.

Entre os presentes à audiência estava Ariovaldo Padilha, membro da Comissão Nacional da Verdade e pai do ministro da Saúde, Alexandre Padilha.

Tortura.

Em seu depoimento, José Damião Trindade, que militou na Aliança Libertadora Nacional (ALN), relatou que Ustra estava presente quando ele foi torturado por militares na sede do DOI-Codi.

Ele também confirmou ter convivido com Edgar Duarte na prisão. Outra testemunha, Artur Machado Sciavone, também ex-membro da ALN, afirmou ter sido agredido pelo próprio coronel. "Ustra me deu um tapa de mão fechada na orelha que me provocou problema de audição."

Sciavone relatou, ainda, que Ustra fazia visitas regulares aos presos trajando uniforme e exibindo medalhas militares. O ex-militante também afirmou que Ustra sabia que Edgar estava preso no DOI-Codi. Edgar Duarte era fuzileiro e foi expulso das Forças Armadas por se opor ao golpe militar de 1964.

Era amigo de José Anselmo dos Santos, o Cabo Anselmo, que também foi fuzileiro, se opôs à ditadura, mas acabou sendo cooptado pelo regime e tornou-se agente infiltrado em grupos de esquerda. O Ministério Público Federal suspeita que Edgar foi sequestrado, em 1971, porque poderia pôr em risco o trabalho de espionagem de Cabo Anselmo, com quem chegou a dividir apartamento no centro de São Paulo.

‘Heróis nacionais’.

Na saída da audiência, o delegado Carlos Alberto Augusto afirmou que Brilhante Ustra e o ex-delegado Sérgio Paranhos Fleury são "heróis nacionais". Do lado de fora da audiência, um grupo de militantes simpáticos aos réus empunhava faixas com dizeres:

"Fora Comissão da Mentira" - em referência à Comissão Nacional da Verdade, criada pelo governo federal para apurar crimes da ditadura -, e "Dr. Carlos Alberto, o Brasil agradece sua colaboração". Não havia manifestantes contra a ditadura. As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.

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