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Temer, interessado em ser candidato, está mesmo inelegível?

Em 2016, Temer foi condenado pelo TRE de São Paulo na Lei da Ficha Limpa. Mas cabe ao TSE homologar ou vetar sua candidatura

TEMER: doação a dois deputados correspondeu a 11,9% de seus rendimentos brutos — e o limite é 10% (Adriano Machado/Reuters)

TEMER: doação a dois deputados correspondeu a 11,9% de seus rendimentos brutos — e o limite é 10% (Adriano Machado/Reuters)

CA

Camila Almeida

Publicado em 22 de fevereiro de 2018 às 16h49.

Última atualização em 22 de fevereiro de 2018 às 17h07.

O MDB, partido de Michel Temer, está pensando em lançar candidatura própria à Presidência da República, nas eleições de 2018. Na quarta-feira, o presidente do partido, o senador Romero Jucá (RR), chegou a afirmar que o nome do próprio Temer é uma opção, caso ele deseje se lançar à reeleição.

A candidatura, tida como impossível há poucas semanas, tem sido defendida nos bastidores por ministros próximos do presidente, como Moreira Franco, da Secretaria Geral da Presidência. A estratégia para lançar Temer ganhou força depois que o governo anunciou a intervenção na segurança pública do Rio de Janeiro, numa ação que incluiu duas reuniões do presidente com seus marqueteiros.

Para ser um candidato minimamente viável, avalia o Planalto, Temer tem que alcançar pelo menos 10% de aprovação nos próximos meses. Outro desafio é viabilizar judicialmente a candidatura. O debate dos últimos dias reacendeu a dúvida se o presidente está ou não inelegível.

Em 2016, Temer foi condenado pelo Tribunal Regional Eleitoral de São Paulo, por doação acima do limite legal para campanha. O crime está previsto na Lei Ficha Limpa (LC nº 64/90, alínea “p”). Não é possível recorrer dessa decisão. Em 2014, ele doou 100.000 reais para a campanha de dois candidatos a deputado federal no estado do Rio Grande do Sul, Alceu Moreira e Darcísio Perondi, ambos do PMDB. O problema é que a doação correspondia a 11,9% de seus rendimentos brutos — e o limite é 10%.

Apesar de Temer estar inelegível, nada o impede de registrar sua candidatura junto ao Tribunal Superior Eleitoral (TSE). O ponto chave é que cabe ao tribunal decidir se é o caso, ou não, de permitir que sua candidatura seja homologada. E, para uma série de outros casos de doações irregulares similares ao de Temer, que se enquadram na mesma alínea “p” da Lei Ficha Limpa, o TSE já decidiu pela liberação. “Existe a jurisprudência. O TSE entendeu, em outros momentos, que o candidato só deveria ser considerado mesmo inelegível se o valor doado tiver feito mesmo a diferença na campanha”, diz o advogado Alberto Rollo, especialista em direito eleitoral.

Caso Temer decida tentar sair candidato, a aprovação de sua candidatura precisará por votação dos sete ministros da Corte. Cientistas políticos ouvidos por EXAME afirmam ser improvável que o tribunal barre a candidatura.

De acordo com a advogada Karina Kufa, especializada em direito público, o caso de Temer — e de tantos outros inseridos na tal alínea “p” — acaba por revelar uma própria incoerência da Lei Ficha Limpa, porque está prevista a mesma sanção de oito anos de inelegibilidade para crimes de naturezas muito distintas.

“É a mesma punição para quem doou um pouco mais de seus rendimentos e para quem foi condenado por crime contra administração pública ou improbidade administrativa”, diz Karina. Ela lembra que, segundo a lei, também se tornam inelegíveis os funcionários que tiverem sido demitidos de cargos públicos após um processo administrativo ou judicial, por exemplo. “O ideal seria ter uma proporcionalidade para cada caso.”

Um partido impopular

Além de Temer, o MDB está levantando outras opções para a disputa, como o ministro da Fazenda, Henrique Meirelles, hoje no PSD; o governador do Espírito Santo, Paulo Hartung; e o presidente da Fiesp, Paulo Skaf. A última vez em que o partido lançou candidatura própria à presidência foi em 1994, quando o PMDB montou uma chapa pura, encabeçada por Orestes Quércia e, como vice, Iris de Araujo. Eles receberam pouco mais de 5,75% dos votos, numa disputa que foi vencida por Fernando Henrique Cardoso, do PSDB.

Até o momento, nada indica que, caso Temer decida sair presidente, o resultado será melhor. Na pesquisa CNI/Ibope divulgada em dezembro, o governo de Michel Temer apareceu com uma aprovação de 6%, índice um pouco melhor do que a aprovação de 3% que o presidente tinha apresentado em setembro — pior índice de aprovação da história apresentado por um governante brasileiro desde o fim da ditadura militar. Os que consideraram o governo Temer ruim ou péssimo somaram 74% dos entrevistados.

Por mais que essa seja a única condenação contra Temer, há outras denúncias contra ele. Em setembro do ano passado, o então procurador-geral Rodrigo Janot acusou Temer de associação criminosa e obstrução da justiça — e, em outubro, a Câmara o livrou de ter a acusação enviada para o Supremo Tribunal Federal.

Em agosto, os deputados livraram o presidente de ser investigado pela denúncia de corrupção em exercício do cargo, a primeira já apresentada contra um presidente em exercício no Brasil. Temer seria o destinatário da mala com 500.000 reais repassados pelos executivos da J&F para o ex-deputado Rodrigo Rocha Loures, seu ex-assessor.

Temer continua sendo investigado por suposto favorecimento à companhia Rodrimar na edição do Decreto do Portos, de 2017, em troca de recebimento de propina. O caso esquentou na semana passada quando o diretor-geral da Polícia Federal, Fernando Segovia, afirmou em entrevista que não há provas contra o presidente.

Sem poder usar a bandeira do combate à corrupção, Temer perdeu também a possibilidade de se vender como o político da responsabilidade fiscal ao abandonar a reforma da Previdência – segundo estimativa do jornal O Estado de S. Paulo, o governo terá que cortar 14 bilhões de reais do Orçamento de 2019 para compensar a desistência. Sobrou a pauta da segurança. Se quiser de fato ser candidato, Temer depende de resultados concretos da intervenção no Rio – e também de um aval do TSE.

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