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Top 6? Brasil pode ter 2,5 mil mortos não notificados por coronavírus

Explosão de mortes por doenças respiratórias e de óbitos registrados em cartórios indicam forte subnotificação, um problema também visto em outros países

Mortes por covid-19: estados lutam contra o tempo para abrir valas comuns e garantir enterro das vítimas (REUTERS/Bruno Kelly/Reuters)

Mortes por covid-19: estados lutam contra o tempo para abrir valas comuns e garantir enterro das vítimas (REUTERS/Bruno Kelly/Reuters)

CC

Clara Cerioni

Publicado em 28 de abril de 2020 às 12h31.

Última atualização em 28 de abril de 2020 às 18h55.

O Brasil atingiu nesta terça-feira, 28, a marca de 5.017 óbitos pelo novo coronavírus e, com esse resultado, entrou para a lista dos dez países que mais registram vítimas da doença, segundo levantamento do site Worldometers. Mas os dados mostram que, com os mais de 2,5 mil casos potencialmente não notificados, o Brasil pode ser o sexto país com mais mortos -- atrás apenas de Estados Unidos, Itália, Espanha, França e Reino Unido.

Assim como faltam testes para pacientes com sintomas, também há em todo o país uma subnotificação daqueles que morrem, mas não têm um diagnóstico positivo ou negativo para a covid-19.

Sem diagnóstico específico, os óbitos são registrados como Síndrome Respiratória Aguda Grave (SRAG), uma classificação que engloba uma série de doenças respiratórias, como influenza A e B e, agora, a SARS-Cov-2, nome científico do novo coronavírus.

Segundo o InfoGripe, plataforma do Ministério da Saúde em parceira com a Fiocruz que reúne dados de doenças respiratórias no país, na primeira semana de março as mortes classificadas como SRAG começaram a crescer exponencialmente em comparação com os cinco anos anteriores.

"Para entrar na classificação de SRAG, o paciente precisa apresentar um conjunto de sintomas bem definido: febre, tosse ou dor de garganta e dificuldade respiratória. A identificação de qual é o vírus respiratório que a levou a óbito é uma segunda etapa", explica Marcelo Gomes, coordenador do InfoGripe.

Os números revelam que, em seis semanas, de 1º de março a 18 de abril (último dado disponível), o Brasil registrou 5.239 óbitos classificados como SRAG. Nos últimos cinco anos, a média para o mesmo período foi de 770 mortes por doenças respiratórias. Nem mesmo o ano de 2016, quando houve o segundo maior surto de H1N1, chega próximo aos dados deste ano.

De acordo com Gomes, há um conjunto de fatores que reforçam a hipótese de que esses 700 óbitos de diferença entre os registros de covid-19 e SRAG podem ser, em grande parte, o novo coronavírus.

"Temos um desafio de capacidade laboratorial para processar os exames, mas as informações são ricas: neste ano, a faixa etária acima dos 60 anos predomina as mortes, enquanto outros vírus costumam atingir mais as crianças. O volume de óbitos também é completamente atípico", diz.

Segundo o Ministério da Saúde, atualmente, além das mortes já confirmadas, há ainda 1.136 óbitos em investigação. Em entrevista técnica nesta segunda-feira, 27, o secretário de Vigilância em Saúde do Ministério da Saúde, Wanderson Oliveira, explicou que diariamente há um acréscimo nos dados de óbitos que ocorreram em momentos distintos, mas só agora estão sendo encerrados.

(Boletim Epidemiológico/Ministério da Saúde/Reprodução)

Outra fonte de dados que reforça a hipótese de subnotificação das vítimas do novo coronavírus é o Registro Civil dos cartórios de atestados de óbitos. De 1º de março a 28 de abril, o número de mortes com suspeita ou confirmação da covid-19 é de 5.049, uma diferença de 500 óbitos dos dados oficiais da pasta da Saúde.

Além disso, entre 26 de fevereiro, data em que o primeiro caso de infecção por coronavírus foi registrado no Brasil, até 17 de abril, os cartórios brasileiros registraram alta de 43% no número de mortes por causa indeterminada notificada.

Segundo dados do do Portal da Transparência do Registro Civil, em 2020, o país teve 1.329 mortes por causa indeterminada no período mencionado. Em 2019, 925 óbitos do tipo foram registrados pelos cartórios no mesmo intervalo. 

"O grande problema de o país não ter o real número de pessoas que morreram pelo novo coronavírus é que não saberemos quando atingimos o pico da pandemia, nem mesmo quantos doentes ainda mais teremos. Estamos fazendo um voo cego em meio a uma tempestade", afirma Gonzalo Vecina, ex-presidente da Anvisa e professor da faculdade de Saúde Pública da USP.

Tendência internacional

O desafio de identificar corretamente o maior número possível das vítimas da covid-19, contudo, não é exclusivo do Brasil. De acordo com um levantamento da revista britânica Financial Times, as mortes pela doença podem ser 60% maiores do que os 200 mil reportados atualmente.

Em uma análise de 14 países, a publicação identificou 122 mil óbitos acima dos níveis normais nas localidades, em comparação com dados dos últimos cinco anos. A estimativa representa um aumento de 50% na mortalidade geral em relação à média histórica dos locais estudados.

"Não há dúvidas de que a covid-19 está causando gravidade em todo o mundo. O vírus da influenza já tem um padrão esperado, não é possível crescer vinte vezes ou mais de um ano para outro", diz Antônio Carlos Bandeira, coordenador da área de infectologia do Hospital Aeroporto, em Salvador, capital da Bahia.

O infectologista reconhece que é desafiador afirmar que há mais mortes da covid-19 do que os números mostram. "Mas então eu pergunto: me prove que não é o novo coronavírus. Ninguém vai conseguir", afirma.

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