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STF julga "dossiê" do MJ e deve limitar atividades de inteligência

Ministros pretendem utilizar julgamento para fixar diretrizes de atuação de órgãos de inteligência

Plenário do Supremo Tribunal Federal (Carlos Moura/SCO/STF/Divulgação)

Plenário do Supremo Tribunal Federal (Carlos Moura/SCO/STF/Divulgação)

AO

Agência O Globo

Publicado em 19 de agosto de 2020 às 07h41.

Ministros do Supremo Tribunal Federal (STF) apontam que, no julgamento desta quarta-feira sobre o dossiê produzido pelo Ministério da Justiça contra servidores ligados a movimentos antifascistas, serão criados limites para a atuação do serviço de inteligência. Um ministro ouvido reservadamente pelo GLOBO disse que, na opinião dele, só deve ser permitida a produção desse tipo de material se houver justificativa legal, razoável, impessoal, em casos de comprovada relação com a garantia da segurança nacional.

No caso específico do dossiê elaborado pelo Ministério da Justiça, deve haver discordância no plenário. Um ministro considera que o material não atende aos parâmetros legais, porque não foi apresentada justificativa plausível para o monitoramento dos servidores. Para ele, os agentes envolvidos deveriam ser punidos. Outro ministro ouvido pelo GLOBO, no entanto, afirmou que o dossiê segue os requisitos mínimos necessários, porque “refere-se a fatos concretos de defesa de autoridades”.

O grupo de ministros que condenam o dossiê do Ministério da Justiça pode recomendar à Procuradoria-Geral da República que investigue os agentes que participaram da produção do material. Eles poderiam responder por crime de improbidade administrativa ou abuso de poder.

Nesta quarta-feira, será julgada ação da Rede Sustentabilidade que questiona a produção do dossiê pelo Ministério da Justiça. O partido pede ao STF a "imediata suspensão da produção e disseminação de conhecimentos e informações de inteligência estatal produzidos sobre integrantes do ‘movimento antifascismo’ e professores universitários". Em explicações enviadas à Corte, o Ministério da Justiça afirmou que a Secretaria de Operações Integradas (Seopi) não produz dossiês contra nenhum cidadão e não instaura "procedimentos de cunho inquisitorial".

A secretaria foi apontada como autora de um relatório sigiloso sobre quase 600 servidores públicos da área de segurança identificados como integrantes do movimento antifascismo e opositores do governo do presidente Jair Bolsonaro. “A SEOPI reitera que sua área de inteligência atua subordinada à mais estrita legalidade, em consonância com os marcos e limites normativos impostos à atividade de inteligência e, portanto, sem qualquer viés investigativo, punitivo e persecutório”, diz o documento enviada ao Supremo pelo ministério.

Ao pedir informações do governo, Cármen Lúcia, relatora do caso, afirmou que “a gravidade do quadro descrito na peça inicial, que - a se comprovar verdadeiro — escancara comportamento incompatível com os mais basilares princípios democráticos do Estado de direito e que põem em risco a rigorosa e intransponível observância dos preceitos fundamentais da Constituição da República”.

Carmen Lúcia também determinou que o Ministério da Justiça entregasse a cada um dos ministros do STF o dossiê com dados dos servidores público. Na segunda-feira, a pasta informou que enviou o documento aos ministros. Segundo o ministério, o material é o mesmo enviado na semana passada à Comissão Mista de Controle das Atividades de Inteligência do Congresso Nacional.

Limitação para a Abin

Na semana passada, no julgamento de outro processo, o plenário do STF definiu limites para a atuação da Agência Brasileira de Inteligência (Abin). Os ministros decidiram que o órgão pode solicitar informações de outros órgãos de inteligência, desde que o pedido seja acompanhado de justificativa. É preciso explicar que o dado é importante para garantir a segurança nacional e também como a informação será usada.

A discussão antecipou o julgamento desta quarta-feira. Edson Fachin, por exemplo, fez discurso duro contra a produção de dossiês, embora o tema não estivesse em votação diretamente.

— Tem-se um cenário em que a ausência de protocolos claros de proteção e tratamento de dados, somada à possibilidade, narrada na inicial e amplamente divulgada na imprensa, de construção de dossiês investigativos contra servidores públicos e cidadão pertencentes à oposição política, deve gerar preocupações quanto à limitação constitucional do serviço de inteligência — disse Fachin na semana passada.

Luís Roberto Barroso lembrou que a própria Abin já foi investigada internamente porque agentes teriam abusado de suas atribuições. Luiz Fux também demonstrou preocupações com abusos do serviço de inteligência. Cármen Lúcia lembrou que espionagem clandestina é crime.

— Inteligência é atividade sensível do Estado, mas está posta na legislação como sendo necessária. Arapongagem é crime. Praticado pelo Estado, é ilícito gravíssimo. O agente que obtém dados sobre quem quer que seja fora da legalidade comete crime — declarou a ministra.

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