Madri e Rio de Janeiro - João César diz que as arenas da Copa do Mundo no Brasil o impediram de assistir futebol.
César, que recebe R$ 787 (US$ 353) por mês montando estandes temporários para exibições, costumava pagar R$ 5 pelo ingresso para assistir aos jogos do Bahia, em Salvador.
Agora, diz, ele só vai à nova Arena Fonte Nova nos últimos 20 minutos -- quando são abertos os portões para permitir a saída dos torcedores que pagaram pelo menos seis vezes mais.
“Eu dificilmente vejo alguma ação agora”, disse César, 35, enquanto carregava estandes de metal para os patrocinadores da Copa do Mundo, incluindo a Visa Inc., do lado de fora da arena.
A Copa do Mundo começa amanhã com o Brasil enfrentando a Croácia em São Paulo. O país investiu US$ 3,6 bilhões para construir ou expandir 12 estádios espalhados pelo país -- alguns em regiões sem um grande clube.
Embora as estruturas tenham melhores alimentos, assentos numerados e câmeras de segurança para impedir violência entre torcedores, os preços para assistir aos clubes de futebol de uma forma geral triplicaram, na “mais brutal exclusão” dos torcedores mais pobres da história do futebol brasileiro, segundo Flávio de Campos, professor de História da Universidade de São Paulo (USP), que lidera um grupo de pesquisas sobre o futebol.
Os operadores dos estádios estão atraindo mais torcedores ricos, antes afastados pelas condições miseráveis e pela violência entre torcidas, segundo Andrew Hampel, CEO da International Stadia Group, que tem sede em Londres e assessorou as operações no Rio, em Porto Alegre e em Recife sobre como aumentar as receitas.
As novas instalações, algumas inauguradas no ano passado, ajudaram os 20 maiores clubes do Brasil a aumentar as vendas de ingressos em 43 por cento, para R$ 309,6 milhões em 2013, segundo pesquisa de Amir Somoggi, consultor de marketing esportivo de São Paulo.
Nova clientela
Antonio “Toninho” Nascimento, secretário nacional do futebol, disse em uma entrevista que embora ele esteja satisfeito de que os novos estádios estejam atraindo um tipo diferente de cliente, incluindo mais mulheres e crianças, é preocupante que os torcedores mais pobres estejam sendo expulsos pelo fator preço.
“Temos que combater um pouco o elitismo desses novos estádios”, disse Nascimento.
A precificação dos ingressos da arena Fonte Nova se baseia em fatores como manutenção e custos operacionais, segundo Marluce Guimarães, porta-voz do grupo que opera o estádio e que inclui a Odebrecht SA, maior construtora do Brasil.
Os preços populares foram reduzidos em 30 por cento nos últimos 12 meses e os ingressos estão à venda para estudantes e aposentados por apenas R$ 15, desmentindo “qualquer teoria sobre elitismo”, disse Marluce, em uma resposta a questões, enviada por e-mail.
Uma análise da Bloomberg News a respeito dos preços dos ingressos no Maracanã entre julho e setembro passados mostrou que eles custavam pelo menos R$ 60 para torcedores que não eram sócios do Flamengo. O valor representa 8 por cento do salário mínimo mensal, de R$ 724.
“É proibitivo para muitos brasileiros”, disse Campos.
André Pires, porta-voz do grupo do Maracanã, que inclui a Odebrecht e a AEG, disse em um e-mail que o Flamengo estabelece os preços dos ingressos. O Fluminense ofereceu ingressos no mesmo estádio por apenas R$ 10 neste ano, acrescentou Pires.
Em Salvador, César não está se beneficiando com a Copa do Mundo. Ele disse que se acostumará à sua nova rotina após o torneio: escutar a partida pelo rádio, do lado de fora do estádio, e correr com seus amigos para lotar a geral nos minutos finais.
“É melhor do que nada”, disse ele.
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1. Público X Privado
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1/12 (Divulgação/ Consórcio Maracanã 2014)
São Paulo - Faltando nove meses para a abertura da
Copa do Mundo de 2014, já se pode dizer que a conta do evento pesou mesmo é no bolso dos brasileiros, apesar de promessas em contrário: de cada R$ 10 gastos nos
estádios do Mundial
, R$ 6 são dinheiro público. Do orçamento total de R$ 8 bilhões das 12 arenas, R$ 4,8 bilhões saíram dos cofres do governo. Só o de Brasília, Mané Garrincha, custou 1,43 bilhão de reais, tendo como principal companhia outro bilionário, o
Maracanã. Apenas três estádios foram completamente financiados sem recursos dos governos estaduais. O governo federal até que não gastou diretamente, mas ajudou com vários incentivos. Um dele é o programa de financiamento do
BNDES, que liberou R$3,8 bilhões; o outro é Recopa, regime especial que desonerou a contratação de serviços e a compra de equipamentos de impostos federais como IPI, PIS/Pasep, entre outros.
Clique nas fotos para conferir levantamento de EXAME.com feito com a ajuda do Sindicato da Arquitetura e da Engenharia (Sinaenco), que mantém o
Portal 2014.
*Atualizada no dia 13/9 para mudança dos valores da Arena Fonte Nova, que não contou com recursos públicos em sua construção.
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2. Mané Garrincha (Brasília) - R$1,43 bilhão
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2/12 (Mateus Baeta/ Portal da Copa)
Valor total: R$ 1,43 bilhão
Recursos privados: -
Recursos públicos: R$ 1,43 bilhão
Entregue em maio de 2013 A obra foi a única a não solicitar o financiamento do BNDES. A viabilidade financeira ocorreu por meio de recursos da Terracap (agência imobiliária pública controlada pelo Distrito Federal e pela União), oriundos da venda de terrenos de propriedade do governo.
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3. Maracanã (Rio de Janeiro) - R$ 1,19 bilhão
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3/12 (Divulgação/ Consórcio Maracanã 2014)
Valor total: R$ 1,19 bilhão
Recursos privados: -
Recursos públicos: R$ 1,19 bilhão
Entregue em abril de 2013 A obra de reforma do Maracanã foi feita inteiramente com recursos públicos. Os R$ 1,19 bilhões gastos na obra foram viabilizados pelo governo estadual via financiamento do BNDES (R$ 400 milhões) e o restante veio diretamente do caixa do Tesouro Estadual do Rio de Janeiro.
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4. Arena da Amazônia (Manaus) - R$ 605 milhões
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4/12 (REUTERS/Bruno Kelly)
Valor total: R$ 605 milhões (previsto)
Recursos privados: -
Recursos públicos: R$ 605 milhões
Previsão de conclusão: dezembro de 2013 A obra está sendo paga pelo governo do Amazonas, que captou parte do valor - R$ 388,1 milhões - através de financiamento do BNDES.
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5. Arena Pantanal (Cuiabá) - R$ 537,5 milhões
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5/12 (Portal da Copa)
Valor total: R$ 537,5 milhões (previsto)
Recursos privados: -
Recursos públicos: R$ 537,5 milhões
Previsão de conclusão: outubro de 2013 A obra foi inteiramente bancada com recursos do Governo do Mato Grosso, sendo que R$ 337,9 milhões foram captados via financiamento do BNDES.
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6. Castelão (Fortaleza) - R$ 518 milhões
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6/12 (Portal da Copa)
Valor total: R$ 518 milhões
Recursos privados: -
Recursos públicos: R$ 518 milhões
Entregue em dezembro de 2012 O Castelão foi o primeiro estádio da Copa a ser entregue. A obra foi inteiramente financiada pelo governo do Ceará, que conseguiu financiamento do BNDES de R$ 351,5 milhões. Os outros 167 milhões são oriundos do Tesouro Estadual. A operação do estádio é feita pelo Consórcio das empresas Galvão Engenharia e Andrade Mendonça.
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7. Arena da Baixada (Curitiba) - R$ 131 milhões
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7/12 (Portal da Copa)
Valor total: R$ 265 milhões (previsto)
Recursos privados: R$ 134 milhões
Recursos públicos: R$ 131 milhões
Previsão de conclusão: dezembro 2013 Os R$ 131 milhões de recursos públicos foram captados via financiamento do BNDES. O empréstimo foi tomado pelo Fundo de Desenvolvimento Econômico (FDE) administrado pela agência de fomento estatal. O restante foi bancado pelo Clube Atlético Paranaense.
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8. Arena Fonte Nova (Salvador) - sem recursos públicos
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8/12 (Governo Federal/Portal da Copa)
Valor total: R$ 591,7 milhões
Recursos privados: R$ 591,7 milhões
Recursos públicos: -
Entregue em abril de 2013 O Estádio foi construído pela Parceria Público-Privada (PPP) entre o Governo do Estado da Bahia e a Fonte Nova Negócios e Participações (FNP). A FNP financiou R$ 323,6 milhões com o BNDES. Além disso, um empréstimo no valor de R$ 250 milhões também foi feito pela FNP com BNB (Banco do Nordeste do Brasil). O restante foi adquiridoatravés do Desenbahia – Agência de Fomento do Estado da Bahia.
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9. Arena das Dunas (Natal) - sem recursos públicos
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9/12 (Glauber Queiroz/Portal da Copa)
Valor total: R$ 400 milhões (previsto)
Recursos privados: R$ 400 milhões
Recursos públicos: -
Previsão de conclusão: dezembro de 2013 A obra foi quase inteiramente financiada pelo BNDES, que liberou R$ 396,5 milhões ao consórcio OAS Arenas, que será administrador do equipamento por 20 anos. O restante também fica a cargo da OAS.
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10. Beira-Rio (Porto Alegre) - sem recursos públicos
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10/12 (Portal da Copa)
Valor total: R$ 330 milhões (previsto)
Recursos privados: R$ 330 milhões
Recursos públicos: -
Previsão de conclusão: dezembro de 2013 A obra está sendo realizada por uma parceria entre o Clube Internacional e a construtora Andrade-Gutierrez. O investimento O Clube aportou parte dos recursos (R$ 26 milhões) e a construtora conseguiu financiamento de R$ 235 milhões via BNDES. Em contrapartida pelo investimento, durante 20 anos, a Andrade Gutierrez, por meio da Sociedade de Propósito Específico, terá direito a explorar todas as novas áreas criadas no estádio.
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11. Arena Pernambuco (Recife) - sem recursos públicos
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11/12 (Portal da Copa)
Valor total: R$ 529,5 milhões
Recursos privados: R$ 529,5 milhões
Recursos públicos: -
Entregue em abril de 2013 O estádio foi construído através de uma Sociedade de Propósito Específico (SPE) formada pelas empresas Odebrecht Participações e Investimentos (OPI) e Construtora Norberto Odebrecht do Brasil. A SPE foi concebida para construir e operar a Arena Pernambuco em regime de parceria público-privada (PPP) com o governo estadual. A empresa conseguiu financiar R$ 400 milhões através do BNDES.
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12. Agora, veja exemplos de "legados" que o Brasil não terá
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12/12 (Adidas/Facebook.com)