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Opinião: Senado vai definir o futuro do saneamento básico no Brasil

Estudo do CLP aponta que o decreto presidencial poderia tirar ganhos sociais de R$ 10 bilhões por ano, colocando em risco avanços no setor

(TV Brasil/Reprodução)
Da Redação

Redação Exame

Publicado em 9 de maio de 2023 às 19h34.

Última atualização em 9 de maio de 2023 às 20h08.

Por Tadeu Barros*

O Brasil tem 208 milhões de habitantes, segundo a prévia do Censo 2022. Destes, pelo menos 100 milhões de pessoas não possuem tratamento de esgoto, além de quase 35 milhões de pessoas que vivem em locais sem água tratada. Em outras palavras, um a cada seis brasileiros não tem água encanada e quase metade não tem rede de esgoto. Embora seja uma necessidade primária da população, o acesso ao saneamento básico no país está longe de ser uma realidade para todos.

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O saneamento básico é um direito assegurado pela Constituição e pela Lei nº 11.445, a qual contempla um conjunto de medidas como infraestrutura e instalações operacionais de abastecimento de água, esgotamento sanitário, limpeza urbana, drenagem urbana, manejos de resíduos sólidos e de águas pluviais. No entanto, diversos fatores dificultaram o progresso do saneamento básico no país, sobretudo a falta de planejamento adequado, o volume insuficiente de investimentos e ineficiência das companhias de saneamento.

Levar abastecimento de água potável e coleta e tratamento de esgoto para toda a população brasileira vai além do aspecto social, como garantir qualidade de vida, saúde e preservação ambiental. O saneamento básico também pode trazer benefícios econômicos para o país. Se o Brasil passar a atender a totalidade de sua população ao longo dos próximos 20 anos com saneamento básico, isso pode render ao país mais de R$ 1,4 trilhão em benefícios socioeconômicos.

O novo marco do saneamento e o setor privado

O novo marco legal do saneamento básico, Lei nº 14.026/2020, substituiu a legislação anterior com o objetivo de acelerar a universalização do tratamento de água e esgoto e alavancar investimentos no setor, uma vez que seu pilar é a descentralização da prestação dos serviços, a partir da entrada da iniciativa privada, como um dos caminhos para a solução do problema.

Desde a sua promulgação, já foi gerado mais de R$ 72,2 bilhões em investimentos para o setor, segundo informações do Ministério do Desenvolvimento Regional (MDR). Em menos de dois anos, foram garantidos recursos com a realização de nove leilões de concessão de serviços sob as regras da nova legislação.

Ao todo, 19,3 milhões de pessoas foram beneficiadas em 212 municípios com as licitações, que ocorreram nos estados de Alagoas, Espírito Santo, Mato Grosso do Sul, Amapá, Rio de Janeiro.

Já no âmbito municipal, a Abcon (associação das operadoras privadas do setor) prevê pelo menos 14 licitações em andamento e que podem sair este ano, com previsão de ao menos R$ 740 milhões de novos investimentos.

No mês de abril, entretanto, a modernização do setor foi colocada em xeque após uma canetada presidencial que impôs um freio à participação da iniciativa privada. Um decreto assinado pelo presidente Lula – derrubado dias depois pelo Plenário da Câmara – permitiu que empresas estatais prestem serviços de saneamento sem licitação com os municípios em região metropolitana, aglomeração urbana ou microrregião. Além do retrocesso de se colocar em risco a meta de, até 2033, levar água potável a 99% da população e tratamento de esgoto a 90%, o decreto ultrapassa os limites da legislação aprovada pelo Congresso três anos antes e gera insegurança jurídica, afetando novos projetos de investimento.

Decreto sobre saneamento pode tirar ganhos sociais de R$ 10 bilhões

Um estudo do CLP aponta que o decreto presidencial poderia tirar ganhos sociais de R$ 10 bilhões por ano, colocando em risco avanços no setor e permitindo que empresas estatais permaneçam à frente de operações ineficientes até 2029, mesmo tendo descumprido metas de universalização dos serviços. Os recursos investidos no saneamento já aumentaram de R$ 19 bilhões em 2019 para R$ 24 bilhões esperados em 2023. Com a redução dos investimentos para os níveis de 2019, por exemplo, o ganho social líquido se reduz para R$ 35 bilhões.

Já passou da hora de enxergarmos o saneamento básico como uma janela de oportunidade de combate às desigualdades sociais e geração de investimentos, emprego e renda no Brasil. Por isso é fundamental que o Senado complete o trabalho da Câmara e derrube de vez a canetada presidencial que desfigurou a lei aprovada em 2020. Todos os países desenvolvidos já têm saneamento básico universalizado e mesmo nações como da América Latina como Chile, Colômbia, Argentina e México estão mais desenvolvidas nesse setor.

Convivemos com problemas e desafios do século 18, mas precisamos nos conectar às oportunidades do século 21. Superar o desafio do saneamento básico é um pré-requisito para que possamos avançar juntos, como sociedade, sem deixar ninguém para trás.

* Tadeu Barros é diretor-presidente do Centro de Liderança Pública (CLP), uma organização suprapartidária que busca engajar a sociedade e desenvolver líderes públicos para enfrentar os problemas mais urgentes do Brasil. Anteriormente, foi secretário especial no Governo de Alagoas, assessor especial do presidente do Banco de Desenvolvimento de Minas Gerais (BDMG) e diretor em áreas de gestão do Governo de Minas Gerais. Também atua como docente/palestrante nas áreas de planejamento estratégico, inovação, tecnologia e liderança.

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