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Rio reduz intervalo da 2ª dose da AstraZeneca de 12 para 8 semanas

Debatida a pedido de prefeituras, mudança tem respaldo jurídico e científico, diz presidente do Conselho dos Secretários municipais de Saúde

Vacina contra covid-19 (Ricardo Moraes/Reuters)

Vacina contra covid-19 (Ricardo Moraes/Reuters)

AO

Agência O Globo

Publicado em 12 de julho de 2021 às 19h06.

Última atualização em 12 de julho de 2021 às 19h09.

O Rio de Janeiro autorizará a antecipação da segunda dose da vacina da AstraZeneca contra a covid-19 para todos os municípios. A informação foi dada ao GLOBO pelo secretário estadual de Saúde, Alexandre Chieppe, no início da noite desta segunda-feira, após uma reunião da pasta com representantes do Ministério da Saúde para tratar do assunto. A mudança deve ser publicada no Diário Oficial na quarta-feira.

Hoje, o intervalo entre as duas injeções previsto no estado é de 12 semanas. Com a nova resolução, o estado passa a permitir que a segunda dose seja ministrada a partir de 8 semanas após a primeira. Embora estados e municípios tenham autonomia para interferir no esquema vacinal da campanha, Chieppe viu necessidade de ouvir o governo federal antes de confirmar a alteração.

— O SUS é tripartite, ou seja, reúne municípios, estados e o governo federal. É importante que todas as esferas do governo estejam minimamente alinhadas — disse.

A ideia vinha sendo pleiteada pelo Conselho dos Secretários municipais de Saúde do Rio de Janeiro, (Cosems), desde a última reunião do grupo, no dia 7.

— Alguns municípios, como Volta Redonda, colocaram esse pedido. No estado, já temos cidades com algumas doses reservadas para a injeção de reforço, elas já estão no estoque dos municípios. Temos agora no cenário uma nova variante, e estudos mostram que a segunda dose faz diferença na eficácia da proteção. Como a bula da AstraZeneca permite que a segunda dose seja feita entre 4 e 12 semanas depois da primeira, a ideia é autorizar a antecipação para todas as cidades — afirma Oliveira.

Segundo ele, após formar parecer favorável, o Cosems procurou a Secretaria Estadual de Saúde (SES), que debateu a proposta com seu comitê científico e a aceitou. A princípio, contudo, a ideia não teve o endosso do Ministério da Saúde, conforme mostrou o “RJ2”, da TV Globo, no sábado.

Mesmo se houvesse uma resposta negativa do Ministério da Saúde, a intenção do Cosems já era publicar nos próximos dias uma deliberação conjunta bipartite (ou seja, assinada por estado e municípios) no Diário Oficial do estado. O texto não vai impor, mas sim permitir que as cidades adotem o novo cronograma, caso queiram. Oliveira salienta que os municípios têm autonomia para alterar o esquema vacinal.

— A legislação assegura a autonomia dos estados e municípios para fazer mudanças nas campanhas de vacinação, o que o STF corroborou no ano passado, no contexto da pandemia. E o mais importante é que há respaldo científico para isso. Estamos num momento agora em que grande parte dos municípios já vacinou pessoas com 40 anos ou mais. Voltar para a população mais vulnerável e antecipar a proteção máxima dela faz sentido. Estamos muito tranquilos tanto do ponto de vista jurídico quanto do científico — diz o secretário.

O assunto está em discussão em todo o Brasil, diante da disseminação da variante Delta do coronavírus. O Distrito Federal e o Acre determinaram uma redução nos mesmos termos. Municípios de outros estados, como Pernambuco, Santa Catarina e Espírito Santo, também aderiram à tendência.

Já o Estado de São Paulo descartou a possibilidade, com o argumento de que um maior intervalo entre as duas doses confere maior imunidade contra a doença. Quanto à capital do Rio, o secretário municipal de Saúde, Daniel Soranz, disse ao GLOBO que o tópico só será debatido após a vacinação de todos os cariocas maiores de idade. Isso porque, ao contrário de outras cidades, o Rio vai usar as doses reservadas para a injeção de reforço para a aplicação da primeira dose, de modo a ampliar a cobertura vacinal da população já alcançada com pelo menos uma dose.

— Isso fará diferença no cenário epidemiológico da cidade. A primeira dose é muito importante e já confere um bom nível de proteção, por isso nossa prioridade é aplicar a injeção inicial em toda a população. Além disso, a bula da vacina da AstraZeneca mostra que a segunda dose tem uma eficácia de 80% a partir de 12 semanas. Esse número cai para cerca de 72% entre nove e 11 semanas, e para 60% entre seis e oito — afirma.

Embora o comitê científico de enfrentamento à Covid-19 da Prefeitura do Rio ainda não tenha se debruçado sobre o assunto, o infectologista Alberto Chebabo, membro da junta de especialistas, não vê mal na antecipação da segunda dose da vacina da AstraZeneca.

— As vacinas todas, inclusive a da AstraZeneca, perdem um pouco de eficácia com a variante Delta. Essa perda é muito pequena com as duas doses, mas muito grande com apenas uma dose. O que vários países têm feito é reduzir o intervalo de 12 para oito semanas. Em se tratando das doses guardadas, não vejo problema em antecipar a distribuição — afirma.

Segundo Chebabo, os estudos existentes sobre a vacina da AstraZeneca apontam um ganho significativo de eficácia com a administração da dose de reforço a partir de dois meses após a primeira. Uma outra pesquisa da Universidade Oxford divulgada no mês passado — que serviu de base à decisão de São Paulo de não antecipar a injeção de reforço — indica um aumento na resposta imune do corpo ao coronavírus com um intervalo de 45 semanas entre as duas doses.

Para o infectologista, os dados precisam ser ponderados num contexto de disseminação da variante Delta, a mais contagiosa das cepas do coronavírus já catalogadas pelas autoridades mundiais de Saúde:

— Você troca uma perda de eficácia lá na frente por proteger mais gente nesse momento, com essa questão da variante Delta. É algo que se deve pesar. Acho que vale a pena, agora, adiantar para até oito semanas. Menos que isso, há perda de eficácia importante. Quem fez a primeira dose em maio, por exemplo, poderia fazer a segunda agora. Em agosto, seria possível vacinar um número grande de pessoas com a segunda dose. A questão é se há estrutura no posto suficiente para vacinar tanta gente, considerando também a distribuição de primeira dose.

Ao GLOBO, a SES reafirma a independência dos municípios na gestão da pandemia. A rigor, segundo a pasta, a mudança só poderia ser barrada pela Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa), caso esta emitisse uma orientação contrária à deliberação dos municípios com base em dados fornecidos pelo fabricante da vacina.

Mas não é o caso. Segundo a Anvisa, o intervalo para a aplicação da segunda dose de uma vacina está definido na bula do produto, e a bula da vacina da AstraZeneca determina que a injeção de reforço pode ser ministrada entre quatro e 12 semanas após a primeira.

Vácuo na cobertura vacinal

Enquanto discute a antecipação da injeção de reforço, o Estado do Rio ainda tem centenas de milhares de pessoas que sequer tomaram a primeira dose. Só na faixa das pessoas com 60 anos ou mais, são 354 mil pessoas. Além disso, 274 mil fluminenses com 60 anos ou mais não retornaram para tomar a segunda dose. Os dados são de um estudo desenvolvido pelos pesquisadores Guilherme Werneck e Lígia Bahia, da Universidade Federal do Rio de Janeiro, e Mário Scheffer, da Universidade de São Paulo, atualizado na última sexta-feira.

Segundo Rodrigo Oliveira, uma das causas desse vácuo é o afã de alguns municípios de acelerar o calendário de vacinação sem assegurar uma cobertura vacinal satisfatória em cada faixa etária contemplada. Enquanto a cidade do Rio vacina o grupo das pessoas com 30 anos ou mais, São Gonçalo já imuniza moradores com 18 anos. Por outro lado, Magé encerra a faixa dos 50 anos na quarta-feira. Ao passo que Maricá ainda vacina pessoas com 41 anos ou mais, a vizinha Niterói já alcança o grupo dos 36 anos.

— Cada município vai ajustar esse processo de acordo com seu estoque, com a gestão do cotidiano. Muito possivelmente Niterói vai aderir à mudança — adiantou Oliveira. — Em toda alteração, a gente vem tentando fazer um processo de permissão e não de imposição, porque a campanha de vacinação já começou bastante confusa. Logo no início, ela acabou gerando várias estratégias municipais, muito por causa da fragilidade da coordenação nacional. Por isso, tanto na resolução do calendário unificado quanto na redução do intervalo da segunda dose, nossa intenção é permitir e não determinar.

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