Relator da 2ª denúncia diz que dúvidas "devem favorecer réus"
Bonifácio de Andrada terá que emitir um parecer favorável ou não à autorização para que o STF investigue Michel Temer, Eliseu Padilha e Moreira Franco
Agência Brasil
Publicado em 29 de setembro de 2017 às 21h47.
O deputado Bonifácio de Andrada (PSDB-MG), relator escolhido para elaborar o parecer sobre a denúncia apresentada pela Procuradoria-Geral da República (PGR) contra o presidente Michel Temer e dois ministros de seu governo, disse hoje (29) que, em caso de dúvidas sobre o processo, usará o princípio da presunção de inocência e votará a favor dos acusados.
Caberá à Andrada o papel de emitir um parecer favorável ou não à autorização para que o Supremo Tribunal Federal (STF) investigue as acusações de obstrução da justiça e organização criminosa contra Temer e os ministros Eliseu Padilha (Casa Civil) e Moreira Franco (Secretaria-Geral da Presidência).
Seu relatório deverá ser votado na Comissão de Constituição, Justiça e Cidadania (CCJ) da Câmara e, se for aprovado, precisa ser analisado também pelos 513 deputados no Plenário da Casa.
O relator explicou à Agência Brasil que ainda não teve acesso ao material, mas adiantou que, se encontrar brechas no processo, dará parecer favorável à defesa dos denunciados.
"Eu me lembro que o último relator da comissão no primeiro episódio falava muito em dúvidas e dizia que, no caso de dúvidas, ele era contra os réus. É um posicionamento jurídico que eu diria, assim, socialista e marxista. A minha posição, no caso de dúvida, sou a favor do réu, porque é um direito constitucional brasileiro", declarou.
Na tramitação da primeira denúncia, o deputado Sérgio Zveiter (PODE-RJ), responsável pela relatoria do processo anterior, emitiu parecer favorável ao prosseguimento da acusação por corrupção passiva contra o presidente Temer.
À época integrante do PMDB, ele justificou que havia muitas lacunas que deveriam ser respondidas pela Justiça e não pelos parlamentares.
Decisão técnica
O relator da segunda denúncia frisou, no entanto, que ainda vai se debruçar sobre os documentos da peça acusatória e da defesa, e tomará uma decisão técnica sobre o processo, "como requer uma matéria dessa natureza".
O deputado afirmou que considera a segunda denúncia mais complexa por envolver o presidente da República e dois ministros, mas não decidiu ainda se pode emitir pareceres diferentes sobre cada autoridade ou crime. Ele sinalizou que o conceito do crime por organização criminosa pode ser questionado.
"Eles falam em organização criminosa. A organização criminosa é um instituto mais do direito penal, ele não é do direito constitucional nem do direito legislativo. Então, houve a transposição de um conceito do direito penal, que é exatamente o caso dessa denúncia. É uma questão que envolve um debate de ordem interessante sobre organização criminosa e seu conceito (…). Eu sou professor de direito constitucional e é curioso que, nos procedimentos do direito constitucional, a organização criminosa nunca foi posta assim", disse.
Sobre a primeira acusação contra Temer, em que votou favoravelmente ao presidente, o relator disse ter considerado a denúncia "falha".
"Ela se baseava, em resumo, em dois fundamentos. A conversa daquele tal de Joesley [Batista, dono da JBS], que conseguiu invadiu o Palácio, o que é uma coisa grave. Ele foi conversar com o presidente da República com uma intenção criminosa de arrancar determinadas informações de interesse dele. E [outra questão foi] aquela história de que um assessor do PR saiu no meio da rua com uma mala cheia de dinheiro, não ficou provado que essa mala foi levada ao presidente", argumentou.
Convite
Andrada foi escolhido nessa quinta-feira (28) após dificuldades (LINK) do presidente da Comissão de Constituição, Justiça e Cidadania, Rodrigo Pacheco (PMDB-MG), em encontrar um nome para a função. Parlamentares do DEM demonstraram desconforto em aceitar convite porque o presidente da Câmara, Rodrigo Maia (RJ), é membro do partido e o primeiro na linha sucessória caso Temer seja afastado da Presidência.
Após divergências internas na tramitação da primeira denúncia, por corrupção passiva, o PSDB pediu formalmente a Pacheco que não escolhesse um integrante da legenda.
Os deputados Marcos Rogério (DEM-RO) e Evandro Gussi (PV-SP) foram cogitados para a tarefa. De acordo com Pacheco, porém, Bonifácio Andrada tem "todas as condições" de fazer um "trabalho sério" por ser um "bom jurista" e professor de direito constitucional.
"Temos muita convicção de que é um nome que preserva a Comissão de Constituição e Justiça, que dá o tom necessário que nós precisávamos para a necessidade de demonstração de imparcialidade e seriedade para a condução desse trabalho", avaliou, ao anunciar a escolha.
"Isso é generosidade dele, é uma pessoa que está focalizando dessa forma. Agora eu sou um deputado como qualquer outro deputado, devo ter minhas qualidades e meus defeitos como homem público. Mas, da minha parte, há um esforço muito grande para ter uma consciência necessária para enfrentar esse problema com isenção e com espírito de justiça que deve ter", respondeu Andrada à indicação.
Bancada tucana
O líder do PSDB na Câmara, deputado Ricardo Trípoli (PSDB-SP), agendou uma reunião da bancada para a tarde da próxima terça-feira (3) para discutir a posição com relação à denúncia contra Temer e ministros, e a própria escolha do relator. Andrada disse que participará do encontro.
Desde a votação da primeira denúncia, a bancada está dividida sobre a posição com relação a Temer.
Membro do PSDB há 20 anos, Bonifácio Andrada enfrenta resistências dentro do partido, que chegou pedir a Pacheco que não escolhesse nenhum integrante da legenda.
O motivo é a divisão interna gerada durante a tramitação da primeira denúncia. Por pressão dos deputados mais jovens, conhecidos como "cabeças pretas" - que contraposição aos "cabeças brancas", integrantes mais velhos e que comandam a legenda -, a sigla orientou voto contra Temer durante a votação em plenário.
O líder da bancada disse por assessores que só vai falar sobre a questão depois da reunião. Bonifácio, de outro lado, disse que está sob o comando do presidente da CCJ.
"O presidente da CCJ me nomeou [relator] e eu aceitei e estou realmente nessa função. Todavia, estou em função do presidente da comissão, ele a qualquer hora pode me afastar ou pode me manter no cargo, porque o presidente da comissão é quem tem poder sobre os membros da comissão", declarou Andrada.