Área sem coleta de esgoto nos arredores de Brasília (Evaristo Sa/Getty Images)
Alessandra Azevedo
Publicado em 22 de março de 2022 às 08h00.
Água limpa e esgoto tratado ainda não são uma realidade para milhões de brasileiros, mostra o mais recente Ranking do Saneamento Básico, divulgado nesta terça-feira, 22, Dia Mundial da Água. Apenas metade do esgoto gerado no país é tratada, o que significa que é despejado na natureza, todos os dias, o equivalente a 5,3 mil piscinas olímpicas de esgoto sem tratamento, segundo o relatório feito pelo Instituto Trata Brasil, em parceria com a GO Associados.
O ranking leva em consideração as 100 maiores cidades do Brasil e foi elaborado com base em dados do Sistema Nacional de Informações sobre Saneamento (SNIS) de 2020. No quadro geral, não houve muita evolução em relação à época do último levantamento, publicado em 2021: o país ainda tem 35 milhões de pessoas sem água tratada e 100 milhões sem acesso à coleta de esgoto.
O Brasil está longe de alcançar as metas do Novo Marco Legal do Saneamento Básico, sancionado em 2020. A lei prevê a universalização dos serviços de saneamento básico até 2033, garantindo que 99% da população tenha acesso à água potável e 90%, ao tratamento e à coleta de esgoto. Hoje, 84,13% da população têm acesso à água potável e 54,95%, à coleta de esgoto.
Os índices são melhores nos 100 maiores municípios do país, onde 94,38% da população têm acesso à água potável e 75,69%, à coleta de esgoto. Mas há lugares em péssima situação até mesmo nessa amostra. Em geral, os piores resultados são registrados em cidades da região Norte do país, com alguns casos no Nordeste. Os melhores, no Sudeste e no Sul.
O que mais preocupa é a diferença entre os municípios no topo e na base do ranking. Enquanto 99,07% da população das 20 cidades nas melhores colocações têm redes de água potável, 82,52% da população dos 20 piores municípios têm acesso ao serviço. Em três cidades, menos de 40% dos habitantes têm água potável: Macapá (AP), 37,56%; Ananindeua (PA), 33,80%; e Porto Velho (RO), 32,87%.
A situação é ainda pior quando se olha para coleta de esgoto. Nos 20 melhores municípios, 95,52% da população têm acesso ao serviço, mas o percentual entre os 20 piores é de 31,78%. Apenas duas cidades da amostra têm 100% de coleta de esgoto: Piracicaba (SP) e Bauru (SP). Outras 34 têm índice de coleta de pelo menos 90% e podem ser considerados universalizadas de acordo com a legislação.
Enquanto os cinco municípios melhores colocados na coleta de esgoto estão no Sudeste e no Sul — além de Piracicaba e Bauru, estão na lista Cascavel (PR), com 99,99%, e Curitiba (PR) e Londrina (PR), os dois com 99,98% —, os cinco piores estão, novamente, todos no Norte: Santarém (PA), com 4,14%; Porto Velho (RO), 5,88%; Macapá (AP), 10,78%; Belém (PA), 17,14% e Rio Branco (AC), 21,29%.
Muitos municípios, principalmente da região Norte, estão há vários anos entre os piores no Ranking do Saneamento, sem demonstrar melhoras. É o caso, por exemplo, de Porto Velho (RO), Macapá (AP), Manaus (AM) e Belém (PA), que estão há pelo menos oito anos entre os 20 piores.
Essa diferença de resultados é reflexo do investimento — ou da falta de investimento — em cada local. Nas 20 melhores cidades, o investimento médio anual em saneamento básico entre 2016 e 2020 foi de 135,24 reais por habitante. Nas 20 piores, foi de apenas 48,90 reais per capita. Em Macapá (AP), última cidade do ranking, foi de apenas 11,25 reais por habitante.
“As cidades nas piores colocações, além de não terem bons indicadores, não estão investindo para vencer essa barreira”, aponta a presidente executiva do Instituto Trata Brasil, Luana Siewert Pretto. “Fica evidente uma estagnação dos municípios que sempre estão nas piores posições”, afirma.
Em 2020, o Brasil investiu 13,7 bilhões de reais no setor, valor ainda menor do que em 2019, quando foram aportados cerca de 15 bilhões de reais, e insuficiente para que sejam cumpridas as metas do Novo Marco Legal do Saneamento. O ideal seria um investimento de 40 bilhões de reais por ano para atingir a universalização dos serviços em 2033, aponta Luana.
Desde que o Novo Marco Legal do Saneamento foi sancionado, em 2020, foram feitos alguns leilões, mas ainda é cedo para que os resultados sejam computados no ranking. Gesner Oliveira, sócio da GO Associados, lembra que 2020 também foi o primeiro ano da pandemia de covid-19, “fato que escancarou a lentidão com que avançam os principais indicadores de saneamento básico”.