Quem ganha e quem perde com a vitória de Temer na Câmara
Sessão que barrou denúncia escancara fraquezas das principais siglas brasileiras e embaralha forças para eleições de 2018
Talita Abrantes
Publicado em 6 de agosto de 2017 às 06h30.
Última atualização em 6 de agosto de 2017 às 09h31.
São Paulo – A sessão da Câmara dos Deputados que enterrou a denúncia contra Michel Temer por corrupção passiva, na última quarta, terminou sem vencedores ou perdedores absolutos. Até o governo que conseguiu quase 100 votos (somados abstenções e ausências) a mais do que o necessário para se livrar do Supremo Tribunal Federal (STF), sai dessa batalha mais exposto e dependente de barganhas do que nunca.
“Em termos de técnica política, retornamos à era Sarney”, afirma o cientista político Roberto Romano, professor emérito da Unicamp, em referência às cenas de fisiologismo explícito que rondaram a sessão do dia 2.
Para os cientistas políticos ouvidos por EXAME.com, a votação do dia 2 inaugura uma provável nova fase para a crise política com um Congresso dividido ( foram apenas 36 votos de diferença ), algumas das principais siglas claramente desordenadas e um maior descompasso entre opinião pública e Legislativo. Uma combinação de fatores que embaralha (ainda mais) o jogo de forças e o clima para as eleições de 2018.
PSDB
Dividido em dois, o PSDB é, provavelmente, a legenda que deixa a votação dessa quarta com a pior crise de identidade. A orientação do líder da sigla na Câmara, deputado Ricardo Trípoli (PSDB), para que a bancada votasse contra o relatório do também tucano Paulo Abi-Ackel bem como seu placar interno são sintomas do racha estrutural que define o partido há algum tempo.
Nesse ponto, afirmam os especialistas, o potencial eleitoral do PSDB para 2018 fica prejudicado. “Vai ser difícil recuperar algum pacto interno para o ano que vem”, diz Romano. Desse processo sobra uma tarefa paradoxal: se explicar para seus eleitores por ter avalizado Temer e para o governo, por ter orientado seus deputados a se oporem a ele.
DEM
Até pouco tempo, o presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ), era visto como quase um emissário do governo na Casa. Mas, ao longo do percurso da denúncia, ele conseguiu se livrar da pecha de traidor do Planalto ao mesmo tempo em que marcou um certo distanciamento de Temer.
Resultado: “Ele adquiriu um certo cacife e, dada a fragilidade do PSDB, pode ser constituir como uma alternativa à centro-direita no Congresso”, afirma Aldo Fornazieri, professor de ciências políticas da FESP-SP. Seu partido, o DEM, se prepara para uma refundação nos próximos meses. Não será surpresa se uma leva de parlamentares migrar para a versão 2.0 dos Democratas.
PT
Em frente às câmeras, os deputados do PT engrossaram o coro da oposição e votaram em peso contra o relator. Mas, nos bastidores, uma ala importante da bancada defendia a manutenção de Temer no poder. “O PT faz um cálculo equivocado que o governo vai sangrando até o fim e de que ele (PT) será o herdeiro desse fracasso de Temer”, diz Fornazieri. O problema dessa lógica é de que não há garantias de que o candidato petista vencerá as eleições. E se for, terá uma herança, de fato, maldita para resolver.
Michel Temer
Há três meses na corda bamba, Temer deu uma clara demonstração de força ao conquistar os 263 votos contrários ao avanço da denúncia. Mas a vitória, todos sabem, custou caro ao Planalto e a perspectiva é uma governabilidade ainda mais dispendiosa daqui para frente.
Com um número talvez não previsto de traições na própria base (foram quase 90 deserções de aliados), Temer deixa a votação dessa quarta mais dependente dos partidos que compõem o centrão. “É um governo que vai ter que fazer concessões até o fim porque o centrão coloca a faca no pescoço do presidente”, afirma Fornazieri, da FESP/SP.
Com apenas 5% de aprovação popular, sob o risco de não cumprir a meta fiscal e diante da sombra de novas denúncias, Temer até pode terminar os próximos 17 meses ainda na Presidência, mas a certeza é de que não serão os mais fáceis.