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Por que Lula demora para mostrar a cara do seu governo?

O presidente eleito está de olho não só em votos no Congresso como também na sucessão em 2026

O presidente eleito, Luiz Inácio Lula da Silva, durante cerimônia de entrega do relatório final da transição de governo e anúncio de novos ministros. (Marcelo Camargo/Agência Brasil)

O presidente eleito, Luiz Inácio Lula da Silva, durante cerimônia de entrega do relatório final da transição de governo e anúncio de novos ministros. (Marcelo Camargo/Agência Brasil)

AO

Agência O Globo

Publicado em 28 de dezembro de 2022 às 17h34.

Última atualização em 28 de dezembro de 2022 às 17h47.

Ao montar a sua primeira equipe ministerial em dezembro de 2002, Luiz Inácio Lula da Silva (PT) disse que descobriu "o que sofre um técnico da seleção". Naquela época, o então presidente eleito encarou durante a transição chiadeiras públicas de aliados logo após fazer as primeiras indicações e tentou, sem sucesso, atrair o MDB. Duas décadas depois e a quatro dias da posse, o futuro mandatário revive o dilema de escalar o seu time do terceiro mandato. Mas por que, afinal, o petista demora tanto para mostrar a cara do seu governo?

Tancredo Neves, que também deixou para a véspera da posse o anúncio do seu time, dizia que durante a composição da Esplanada dos ministérios é preciso "deixar as ondas baterem umas nas outras para estudar a espuma". Sabendo disso, Lula observou os movimentos — e as colisões — dos seus aliados cotados para integrar o novo governo. O petista sabe que, desta vez, está em jogo não só o sucesso biográfico da sua terceira passagem pelo poder, que depende de uma composição política, como também a sucessão presidencial em 2026.

Para chegar ao fim do mandato sem solavancos, Lula precisa sedimentar uma base de apoio e contar votos no Congresso. Em seu primeiro teste no poder, o então presidente manteve em sua órbita legendas minoritárias, concentrou a maior parte da máquina pública nas mãos do comissariado petista, destinou um ministério para cada aliado e ofereceu um naco de poder a ministros não partidários. Após a reeleição, Lula entregou metade da Esplanada aos seus correligionários, embora a sua bancada representasse um quarto da coalizão, e contemplou o MDB com cinco lotes do primeiro escalão do governo, enquanto os demais coligados ficaram com um gabinete cada. Desta vez, o futuro titular do Palácio do Planalto também manterá aglutinado sob a influência do PT postos-chave da administração e barganhou o apoio do MDB, União Brasil e PSD, que representam 28% das cadeiras da Câmara e 38% do Senado, em troca de duas pastas para cada sigla.

Lula entende que a divisão de ministérios terá reflexo no centro do tablado eleitoral de 2026. Não à toa, decidiu ceder aos apelos de correligionários para não entregar de mão beijada à senadora Simone Tebet (MDB-MS) o Desenvolvimento Social, responsável pelo Bolsa Família. A pasta, considerada uma vitrine política, ficou sob o domínio do ex-governador do Piauí Wellington Dias (PT). Essa manobra frustrou a expectativa da parlamentar de ser recompensada pelo apoio a Lula no segundo turno. À congressista foram oferecidas outras opções, mas ela acabou topando ficar com o Planejamento.

Na nova função, Tebet terá de aprender a bater carimbos da máquina pública e contornar divergências com o futuro ministro da Fazenda, Fernando Haddad, que, por sua vez, preferia fazer uma dobradinha com um ex-governador como Renan Filho (Alagoas) e Jorge Viana (Acre). A parlamentar, mais inclinada ao liberalismo econômico, poderá ter os seus primeiros conflitos na Esplanada com o ex-prefeito de São Paulo, afeito ao desenvolvimentismo. Eventuais desavenças, porém, serão arbitradas por Lula, que dará as cartas na Economia e tem uma predileção clara por Haddad como o seu sucessor natural.

Colocado à prova em um discurso para banqueiros, Haddad seguiu à risca o discurso ensaiado com o presidente eleito e, aos poucos, tem buscado dobrar as resistências do mercado. O maior desafio do futuro ministro da Fazenda será, a um só tempo, resistir à pressão do Congresso por mais gastança pública e alavancar a economia em meio à desaceleração da economia mundial. Se tiver sucesso, poderá trilhar um caminho semelhante ao de Fernando Henrique Cardoso — que subiu a rampa do Palácio do Planalto após ganhar projeção com o Plano Real.

Trafegando em outra via, Geraldo Alckmin (PSB) e Rui Costa (PT) foram escolhidos por Lula para comandar postos-chave na Esplanada. O vice-presidente eleito foi escalado para estar à frente do ministério da Indústria e Comércio, enquanto o governador da Bahia irá chefiar a Casa Civil, cadeira ocupada por candidatos a vestir a faixa presidencial. Com perfis semelhantes, os dois gestores públicos podem se tornar nomes fortes para a disputa eleitoral de 2026 — que deverá contar com um especialista em canteiro de obras, o futuro governador de São Paulo, Tarcísio Freitas, ex-ministro da Infraestrutura. Até lá, Lula continuará estudando as espumas em torno de seus aliados.

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