Planos de redução de risco em desastres ignoram animais (não deveriam)
Inclusão de animais em políticas públicas tem efeito econômico e psicológico positivo para comunidades afetadas por tragédias, afirma especialista
Vanessa Barbosa
Publicado em 29 de janeiro de 2019 às 17h02.
Última atualização em 29 de janeiro de 2019 às 19h33.
São Paulo - Ainda é incerto o número de animais atingidos pela lama de rejeitos tóxicos do rompimento da barragem do Córrego do Feijão, da Vale, em Brumadinho (MG) . Certo, porém, é o sofrimento a que muitos estão submetidos, presos nas montanhas de detritos em condições de difícil acesso.
Médicos-veterinários da Comissão de Bem-Estar Animal, do Conselho Regional de Medicina Veterinária (CRMV-MG), estão acompanhando os trabalhos de resgate de bois, cachorros, cavalos entre outros animais, que em alguns casos, por estarem atolados em estado de sofrimento e debilidade tiveram de ser abatidos por meio de tiros com o apoio daDefesa Civil de Minas.
Em nota, a Comissão Nacional de Bem-Estar Animal (Cobea) do CFMV, destaca que os médicos-veterinários brasileiros em atividade no local, voluntários ou não, estão buscando minimizar os danos à saúde física e mental dos animais presentes na área do acidente.
As medidas porém fazem parte de esforços isolados, já que o Brasil não possui um plano ou política nacional que inclua os animais em estratégias dereduçãoderiscoemdesastres.
" O fato de os animais não estarem nos planos de contingência muito nos preocupa, pois a recuperação da comunidade afetada é mais lenta e dolorosa. Além da perda humana eles precisam se restabelecer economicamente”, afirma Rosângela Ribeiro, gerente de campanha veterinária da Ong Proteção Animal Mundial, que está com equipe em Brumadinho acompanhando os esforços de resgate dos animais.
Brumadinho é uma cidade rural com muito animais domésticos, como cães e gatos que vivem na localidade. A área também é um local de produção agrícola, composto por pequenos agricultores que criam principalmente gado, vacas leiteiras, galinhas e porcos para atender a demanda de Belo Horizonte.
O Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) estima que cerca de 15 mil bovinos, 3 mil vacas leiteiras e 10 mil suínos são criados na área. Além disso, a parte florestal da região abriga milhares de animais silvestres, como mamíferos, répteis e peixes.
Atualmente, o Brasil não conta com um trabalho estruturado, e são poucos os profissionais capacitados nos órgãos governamentais para manejar animais em situações de desastres naturais. Alguns países, porém, já incluem os animais nos planos de prevenção e redução de riscos em desastres, como a Nova Zelândia e a Costa Rica.
"Esses países entendem que os animais também são afetados pelos desastres naturais e acabam os incluindo nesses planos, principalmente os animais de produção, porque aí há um impacto econômico para aquelas famílias que sobrevivem a custa de pequenos animais rurais que servem como fonte de subsistência", diz Rosângela ao site EXAME.
"No Brasil não temos um exemplo de política ou legislação. Existem manuais de defesa civil que mencionam a questão dos animais, mas ainda não temos uma politica estadual ou nacional que inclua de fato os animais numa política de redução de riscos em desastres", pontua.
Não é apenas o interesse utilitário que está em jogo, mas as relações emocionais e de afeto que cada vez mais pessoas estabelecem com os animais. "Temos que pensar que hoje eles fazem parte da sociedade e da família. Tem mais lares no país com animais de estimação do que com crianças. São 52 milhões de cães domiciliados e 22 milhões de gatos", destaca Rosângela, lembrando que os animais acabam sendo os mais vulneráveis, já que eles não conseguem pedir ajuda sozinhos.
A organização entende que os governos devem construir em conjunto com a sociedade planos para minimizar os impactos causados, ajudando produtores rurais e tutores de animais a protegerem seus bichos em casos de acidentes.
As medidas de prevenção incluem desde ações simples, como rota de evacuação de animais em áreas próximas a rios e áreas de risco de desastres, até equipamentos e estruturas apropriadas, como geradores e alimentos especiais que podem ser estocados.
"Para animais de companhia, que vivem em casa, por exemplo, se você precisa fazer uma evacuação rápida, ter algum tipo de caixa de transporte e guia de fácil acesso ajuda na retirada do animal, que deve ter plaquinha de identificação", explica a especialista.
Vacinas em dia também reduzem os riscos de exposição do animal aos efeitos de um desastre, como o aumento de leptospirose e leishmaniose, prevenindo também problemas em saúde publica com a transmissão dessas doenças.