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O que seria preciso para ter tarifa zero de ônibus em SP

Para pagar a conta do transporte gratuito, a saída seria aumentar impostos. Uma alternativa de meio termo é diminuir a fatia paga pelo usuário final.

Protesto contra tarifa de ônibus em São Paulo (Midia Ninja/Creative Commons)

Mariana Desidério

Publicado em 14 de janeiro de 2015 às 05h00.

São Paulo – O aumento da passagem do transporte público em diversas cidades brasileiras levantou mais uma vez a discussão sobre a possibilidade de haver tarifa zero no país.

O problema básico, porém, é quem pagaria essa conta. Em São Paulo , se o transporte fosse totalmente gratuito para a população, o poder público precisaria arcar com uma conta de 7,2 bilhões de reais por ano.

De acordo com especialistas ouvidos pela reportagem, a saída seria aumentar impostos para bancar o benefício.

No entanto, esse não é um processo simples. A discussão passa pela disputa política na cidade e provavelmente envolveria questões que afetam todos os municípios, culminando na necessidade de mudar regras da alçada do Congresso Nacional.

Uma alternativa de meio termo é diminuir a fatia paga pelo usuário final. A prefeitura de São Paulo diz que já está caminhando neste sentido.

Como é a conta é paga hoje

Na maior parte das cidades brasileiras, quem paga a conta do transporte é o usuário final, através da tarifa. Em São Paulo, com a passagem a R$ 3,50, a conta é dividida da seguinte forma: 60% é pago pelo usuário, 25% pela prefeitura, 12% pelos empregadores, através do vale-transporte, e cerca de 2% vêm de outras fontes, como publicidade. As informações são da SPTrans.

Para o engenheiro Lúcio Gregori, ex-secretário de Transportes da cidade, essa divisão precisa mudar. Ele foi responsável pela proposta de tarifa zero apresentada pela gestão da prefeita Luiza Erundina.

“Há cidades na França e em outros países da Europa em que o cidadão paga 30% do valor da tarifa. Com esse subsídio, São Paulo teria uma tarifa de R$ 1,60”, calcula.

A SPTrans pondera que a capital paulista tem um dos maiores subsídios do país. “Se comparar com padrões europeus, o usuário de São Paulo paga muito. Mas, se comparar com outras cidades do Brasil, o paulistano é o que tem a menor participação no custeio”, afirma Adauto Farias, diretor de gestão econômico-financeira da SPTrans. Ele admite, no entanto, que ainda assim a passagem é salgada para o bolso do paulistano.

Passagem mais barata, impostos mais elevados

Para Gregori, o caminho é aumentar o subsídio, e isso significa aumentar impostos para grupos sociais com maior renda. “A tarifa zero é o subsídio levado às últimas consequências”, afirma.

Na visão do engenheiro, uma das alternativas é mudar a cobrança do IPVA (Imposto sobre a Propriedade de Veículos Automotores). “Esse imposto poderia incidir também sobre helicópteros, jatinhos, iates”, afirma.

Outra alternativa, segundo o ex-secretário, seria aumentar o IPTU (Imposto Predial e Territorial Urbano) para imóveis de luxo.

Para Luiz Carlos Mantovani Néspoli, superintendente da ANTP (Associação Nacional dos Transporte Públicos), também há espaço para rever o vale transporte pago pelos empregadores.

“Em São Paulo, pelas regras atuais, o investimento do empregador é praticamente zero, e o empregado paga quase tudo”, afirma.

De todas as alternativas em vista, a que recebe mais atenção do poder público é a de aumentar a taxação para o transporte individual, com o objetivo de subsidiar o transporte público.

“O transporte individual é um ator importante nessa questão, que hoje não contribui com nada para o sistema público”, afirma Farias, da SPTrans. E a intenção de resgatar a Cide (Contribuição de Intervenção no Domínio Econômico), imposto sobre combustíveis, seria um caminho.

A discussão sobre resgatar a Cide não é nova. Porém, pouco avançou no Congresso Nacional nos últimos anos. A expectativa é que a volta do tributo aconteça ainda este ano.

Outro ponto é o impacto que o imposto teria na inflação, lembra Néspoli, da ANTP. “O governo federal usa a Cide para controlar a inflação da gasolina. Na atual situação econômica, não há espaço para essa discussão [sobre o uso desse imposto no transporte público]”, argumenta.

Na visão de Lúcio Gregori, para todas essas alternativas, o que falta é vontade política. “O Brasil é lento em certas coisas e rápido em outras, e isso tem a ver com a correlação de forças políticas. Será que mudar a tributação de combustíveis é realmente tão difícil?”, questiona.

Qual seria o impacto da tarifa zero no transporte

Se um dia todas essas mudanças propostas chegarem a subsidiar o custo total do transporte público, o que isso significaria para os cidadãos?

Na visão de Lúcio Gregori haveria uma mudança na relação das pessoas com esse serviço. “O transporte passaria a ser visto como um direito, como é a saúde e a educação. Hoje ele é visto como uma necessidade pela qual é preciso pagar”, diz.

Já na visão de Adauto Farias, da SPTrans, caso um dia haja tarifa zero em São Paulo, isso poderia ter um impacto negativo no sistema.

Ele argumenta que, com transporte gratuito, as pessoas passariam a usar o ônibus para pequenos trajetos, em vez de simplesmente andar a pé. Isso deixaria o sistema mais lento, e por isso menos eficaz.

“Há cidades dos Estados Unidos estão saindo da tarifa zero por conta disso”, afirma.

O que já está sendo feito para aliviar a conta para o usuário

A SPTrans ressalta que, mesmo com o aumento da tarifa em São Paulo, já está fazendo esforços para diminuir o impacto no bolso do usuário.

Uma das medidas é a gratuidade para estudantes de escolas públicas. Outra é o congelamento da tarifa para os bilhetes mensal, semanal e integrado com o metrô.

O engenheiro Lúcio Gregori reconhece as iniciativas. “Existe uma sinalização de que a prefeitura está fazendo aquilo que entende ser possível nesse momento. Não se pode deixar de considerar que isso é o resultado de uma disputa que começou em 2013”, afirma.

São Paulo - O aumento das tarifas de ônibus , trens e metrô em São Paulo passa a valer a partir de hoje. O preço das passagens passou de R$ 3,00 para R$ 3,50, um aumento de 17%. Além da capital paulista, outras 16 cidades tiveram aumento na tarifa do transporte desde o fim de 2014. Boa parte das cidades fez o reajuste entre novembro e janeiro. É o caso de Campo Grande (MS), Belo Horizonte (MG) e Rio Branco (AC). A capital do Acre foi a que teve o maior aumento no período: a tarifa subiu 20,8% e foi de R$ 2,40 para R$ 2,90. Veja nas fotos as cidades em que a tarifa mais aumentou nos últimos meses e quanto custa andar de transporte público em cada uma delas.
  • 2. São Paulo (SP)

    2 /16(César Ogata /SECOM)

  • Veja também

    A partir desta terça-feira, as tarifas de ônibus, trem e metrô passam a valer R$ 3,50 em São Paulo . Um aumento de 16,6%. O aumento das passagens valerá para usuários do bilhete único comum e para quem pagar a tarifa com dinheiro na catraca do coletivo. O reajuste não será aplicado para usuários de bilhete único mensal, semanal ou diário, que hoje custam R$ 140, R$ 38 e R$ 10, respectivamente. A partir do início do ano letivo, em fevereiro, alunos de escolas e universidades públicas, bem como estudantes de baixa renda de instituições privadas de São Paulo, terão direito a um "passe livre" na rede de transportes da capital paulista.
  • 3. Rio de Janeiro (RJ)

    3 /16(Agência Brasil)

  • Desde o dia 3 de janeiro, as tarifas de ônibus da cidade do Rio de Janeiro e do Bilhete Único Carioca subiram para R$ 3,40. Até então, o preço da passagem era de R$ 3. Um aumento de 13,33%. Em maio de 2013, a prefeitura tinha determinado um aumento de 7,27% na tarifa, que subiria para R$ 2,90. Com os protestos em junho, o governo recuou e manteve as passagens de ônibus em R$ 2,74. No início de 2014, a tarifa foi elevada para R$ 3.

    A partir de fevereiro, a tarifa dos trens na cidade terá um aumento de 3,66% e será de R$ 3,30. Já as barcas passam dos atuais R$ 4,80 para R$ 5.  Segundo a assessoria de imprensa da Agência Reguladora de Serviços Públicos Concedidos de Transportes Aquaviários, Ferroviários, Metroviários e de Rodovias do Estado do Rio de Janeiro (Agetransp), o reajuste da tarifa do metrô deve ser feito em abril de 2015.
  • 4. Campo Grande (MS)

    4 /16(Milton Jung Flickr Creative Commons)

    O último aumento na tarifa de ônibus em Campo Grande ocorreu em novembro de 2014, quando a passagem foi de R$ 2,70 para R$ 3,00 (10,7%).
    A tarifa não sofria aumento desde outubro de 2012. Como o reajuste é recente, não há previsão de novos aumentos em 2015. Além do ônibus convencional, a capital do Mato Grosso do Sul conta com ônibus fretados, cuja passagem é R$ 3,60. Os usuários têm direito a pegar mais de um ônibus no período de uma hora. Estudantes, idosos e deficientes não pagam passagem. Segundo a prefeitura, 28% dos usuários usam o transporte de forma gratuita.
  • 5. Belo Horizonte (MG)

    5 /16(Wikicommons)

    A tarifa de ônibus na capital mineira subiu de R$ 2,85 para R$ 3,10 no dia 29 de dezembro de 2014. Esse é o preço nas linhas mais usadas pela população, que são as linhas troncais Move, perimetrais, diametrais e semi-expressas. Como o reajuste é recente, ainda não há previsão para 2015, mas a prefeitura costuma fazer o reajuste anualmente. O metrô de Belo Horizonte, que é operado pelo governo federal, também não tem previsão de ajuste. A passagem para esse tipo de transporte é de R$ 1,80. Na capital mineira, é possível fazer a integração entre ônibus no período de uma hora e meia sem pagar uma nova passagem. Também há integração com o metrô. Idosos e pessoas com deficiência não pagam a tarifa. Estudantes de ensino médio pagam metade, com preferência àqueles vindos de famílias que recebem auxílio de programas sociais e àqueles que moram mais longe do local de estudo.
  • 6. Boa Vista (RR)

    6 /16(Prefeitura de Boa Vista)

    Desde a última sexta-feira (2), as tarifas de ônibus em Boa Vista subiram para R$ 2,80 – um aumento de 7,7%. Com o Boa Vista Card, a tarifa fica em R$ 2,50.
  • 7. Salvador (BA)

    7 /16(Governo da Bahia)

    Janeiro já começou com ônibus mais caros em Salvador . A passagem passou de R$ 2,80 para R$ 3,00. O reajuste de um pouco mais de 7%, segundo a Secretaria Municipal de Urbanismo e Transporte, acompanha o Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA).
  • 8. Natal (RN)

    8 /16(Agência Brasil)

    Em julho de 2014, as tarifas de ônibus em Natal (RN) subiram de R$ 2,20 para R$ 2,35 – um aumento de 6,8%. As informações são do G1. EXAME.com não conseguiu contato com a prefeitura de Natal até a publicação desta reportagem.
  • 9. Curitiba (PR)

    9 /16(SMCS)

    Em Curitiba , os usuários de ônibus pagam R$ 2,85 pela passagem das linhas mais usadas. O valor foi reajustado em novembro de 2014, e há possibilidade de um novo ajuste em 2015. Segundo a URBS, empresa que opera o transporte na cidade, até 2013 a tarifa era ajustada todos os anos. Porém, com os protestos em junho daquele ano, o preço da passagem foi reduzido – passou de R$ 2,85 para R$ 2,70. O aumento que ocorreu em novembro de 2014 elevou a tarifa para o patamar anterior aos protestos. Agora, a prefeitura afirma que vai retomar os reajustes anuais, o que pode ocorrer já em fevereiro deste ano. Segundo a URBS, a tarifa sem o subsídio da prefeitura está em R$ 3,18. A cidade tem uma Rede Integrada de Transporte, na qual é possível utilizar quantos ônibus for necessário com apenas uma passagem. Nas linhas que não fazem parte desta rede, a integração tem prazo de duas horas. Há meia passagem para estudantes de acordo com a renda familiar. Têm direito a passagem gratuita idoso, pessoas com deficiência e aposentados por invalidez.
  • 10. Fortaleza (CE)

    10 /16(SMCS)

    Em Fortaleza , capital do Ceará, não há aumento previsto para os ônibus municipais nem para o metrô que ainda opera em período de testes e com tarifa gratuita. Por lá, a passagem custa R$ 2,20.
  • 11. Porto Alegre (RS)

    11 /16(Prefeitura de Porto Alegre)

    Até fevereiro, a tarifa de ônibus e lotações em Porto Alegre (RS) permanece inalterada. Atualmente, elas custam R$ 2,95 e R$ 4,40 respectivamente e foram elevadas em abril do ano passado.  Ainda não há previsão para o reajuste das tarifas de trem na cidade, que hoje valem R$ 1,70. Na cidade, a integração entre ônibus e trem garante um desconto de 10% no valor final pago pelo usuário. Com isso, a tarifa fica em R$ 4,19 por trecho.
  • 12. Recife (PE)

    12 /16(Prefeitura de Olinda)

    Desde 2012, os usuários de ônibus em Recife pagam R$ 2,15 nas principais linhas da cidade. Há uma discussão sobre reajuste da tarifa em 2015, mas ainda não existem prazos e valores definidos. Os últimos aumentos foram feitos com base no IPCA (Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo). O sistema permite integração, de forma que o usuário pode ir de um extremo a outro da cidade com apenas uma tarifa. Também há integração com o metrô, cuja tarifa é de R$ 1,60. Estudantes pagam meia passagem; idosos e pessoas com deficiência não pagam.
  • 13. Teresina (PI)

    13 /16(Claudio Martins / Creative Commons)

    Na capital do Piauí , a passagem de ônibus custa R$ 2,10 e está sem reajuste há três anos. A prefeitura vai implantar um novo sistema de transportes na cidade, que deve começar a operar em meados de janeiro. A partir daí, a administração deve começar a discutir um reajuste. O sistema permite pegar dois ônibus no período de uma hora usando a mesma tarifa. A integração, porém, ainda não se estende ao metrô, que é pequeno na cidade e custa R$ 0,80. Idosos e pessoas com deficiência não pagam passagem. Estudantes pagam metade.
  • 14. Porto Velho (RO)

    14 /16(Wikicommons)

    Não há previsão para reajuste da tarifa de ônibus em Porto Velho (RO), segundo informações da assessoria de imprensa da prefeitura. Na cidade, o preço da passagem é de R$ 2,60.
  • 15. Palmas (TO)

    15 /16(Wikicommons)

    Em Palmas (TO), o valor da tarifa do transporte público é de R$ 2,50. A Secretaria Municipal de Acessibilidade, Mobilidade, Trânsito e Transporte tem até março para definir o reajuste ou manter o preço atual.
  • 16. Manaus (AM)

    16 /16(Divulgação/Marcopolo)

    Manaus tem a tarifa em R$ 2,75 há quatro anos. A reportagem entrou em contato com a prefeitura para saber sobre possíveis aumentos em 2015, mas não obteve retorno até a publicação deste texto.
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