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Número de professores temporários na USP triplica desde 2014

Temporários são professores com contratos de 12 horas de trabalho semanais e remuneração média de R$ 1,6 mil

USP: número de docentes temporários em 2014 era 65 e hoje são 216 (Cecilia Bastos/Jornal da USP/Divulgação)

USP: número de docentes temporários em 2014 era 65 e hoje são 216 (Cecilia Bastos/Jornal da USP/Divulgação)

EC

Estadão Conteúdo

Publicado em 28 de novembro de 2017 às 08h24.

São Paulo - O número de professores temporários na Universidade de São Paulo (USP) aumentou mais de três vezes nos últimos três anos.

Eram 65 docentes nesse regime de trabalho em 2014 e hoje são 216. Os temporários são professores com contratos de 12 horas de trabalho semanais e remuneração média de R$ 1,6 mil, o que equivale a menos de dois salários mínimos, mesmo com titulação de doutor.

Eles só podem ficar por dois anos na USP e têm a incumbência apenas de dar aulas - não de fazer pesquisa ou atuar na pós-graduação.

Há temporários em todas as grandes unidades, como Escola Politécnica, Faculdade de Medicina e Escola de Comunicações e Artes (ECA). Esses profissionais assumem vagas, em geral, de docentes que se aposentaram.

Os dados foram tabulados pelo jornal O Estado de S. Paulo a partir do Portal da Transparência da USP.

As informações mais antigas disponíveis são de setembro de 2014 e as atuais, de outubro deste ano.

O crescimento dos temporários se deu justamente no período em que a universidade enfrenta sua pior crise financeira dos últimos anos.

Hoje, cerca de 90% do orçamento da USP vai para pagar professores e funcionários; esse índice chegou a 106% em 2014 e 2015. A reitoria, então, proibiu contratação de novos professores efetivos. Docentes da USP não podem ser demitidos e têm aumentos de salário por tempo de serviço.

A mudança no quadro docente é vista com preocupação por grupos da universidade por causa do vínculo fraco com a instituição e por não precisarem fazer pesquisa.

Os artigos escritos por professores - provenientes das pesquisas - são cruciais para qualificar universidades em rankings internacionais, por exemplo.

Este ano, a USP caiu de posição em duas dessas listas, feitas pelo Times Higher Education e pela Quacquarelli Symonds, referências na avaliação de ensino superior.

"Foi o jeito que encontramos para funcionar. Mas já está influenciando negativamente a pós-graduação e a produção científica", diz a diretora da Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas (FFLCH), Maria Arminda Arruda.

A unidade perdeu 11% dos docentes nos últimos anos e tem 13 temporários, um dos números mais altos. "Se não contratasse temporário, não teria como dar a disciplina de História Moderna."

Na USP toda, o total de professores que têm dedicação exclusiva e obrigatoriedade de fazer pesquisa caiu 7% entre 2014 e este ano, mas ainda são a maioria dos docentes (4.970).

Eles ganham cerca de dez vezes mais que os temporários, que representam hoje 3,7% da categoria. Há três anos eram 1%.

Mas há unidades, como a Faculdade de Educação e a Escola de Enfermagem de Ribeirão Preto, em que os temporários já são mais de 13% do total de professores.

O curso de Obstetrícia da USP Leste tem 11 dos seus 43 docentes com contratos temporários, um índice de 25%.

"Nem nos meus melhores sonhos eu imaginaria que seria, tão cedo, colega de autores das bibliografias que eu uso nas minhas aulas", diz Alexandre Barbosa, de 41 anos, doutor em Ciência da Comunicação. Seu contrato de dois anos para dar duas disciplinas no curso de Jornalismo da Escola de Comunicação e Artes (ECA), cujos titulares se aposentaram, acaba em dezembro. Ter a USP no currículo fez aumentar os convites para dar palestras e entrevistas.

Para conseguir se sustentar, porém, trabalha em duas outras instituições privadas. Na USP, suas 12 horas semanais lhe permitem só dar as aulas. "Não posso estar com os alunos mais dias da semana, mas dou meu celular, me coloco à disposição para que não sintam essa precarização. O curso ganharia muito mais se eu fosse um efetivo."

Agilidade

Procurada, a reitoria informou que os temporários existem para "atender com agilidade às necessidades acadêmicas urgentes, como, por exemplo, em casos em que é preciso substituir temporariamente professores afastados por licenças médicas." A instituição informou que autorizou a contratação de 150 professores doutores permanentes em 2017.

Os temporários passam por processo seletivo mais simples que os concursos públicos. Ao serem aprovados, assinam contratos de um ano, que podem ser renovados por mais um. Este ano, a reitoria facilitou esse caminho.

Até então, as unidades precisavam abrir seleção apenas para doutores e, caso não houvesse candidatos, começar uma nova etapa com inscrição de mestres.

Uma resolução de junho permite que o concurso seja feito em uma só fase, ou seja, já chamando candidatos doutores, mestres ou com diploma de ensino superior. Outra resolução também deste ano autorizou contratação de temporários com carga de 8 horas.

"Um professor com fraca dedicação à universidade é ruim, mas isso não é medido pelo dinheiro ou pelo vínculo, vai da postura do professor", diz o ex-ministro da Educação Renato Janine Ribeiro, docente aposentado da USP. Mesmo assim, ele considera preocupante o crescimento de temporários. Para Janine, eles deveriam ser chamados só em casos de licenças.

Thiago Trapé, de 35 anos, é um dos 13 atuais professores temporários da Medicina. Ele é psicólogo, mestre e doutor em Saúde Coletiva. Recebe R$ 1.680 para dar aulas de Política de Saúde para futuros médicos. "Vale a pena. É um processo de crescimento profissional e acadêmico porque faço parte de instituição renomada, com tradição e legitimidade na opinião pública."

Ele acha que o modelo pode ajudar a trazer pessoas de perfis diferentes para a USP, mais jovens, e que não se interessam por um contrato de exclusividade. Trapé também mantém outros dois empregos. "O grande problema é o contrato ser de apenas dois anos. Fico angustiado porque minha mulher está grávida de gêmeos e sei que, em seis meses, vou ter de procurar outra coisa."

Para o presidente da Associação dos Docentes da USP, Rodrigo Ricupero, o movimento é uma precarização da carreira do professor.

"O docente fica um tempinho e vai embora. Ele quer fazer currículo. O próximo começa do zero." As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.

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