Mudança do cenário eleitoral é possível? Cientista político responde
"Tem um ventinho soprando a favor de Haddad e contra Bolsonaro. Se vai se acelerar na boca da urna, não sabemos", diz o estudioso
Estadão Conteúdo
Publicado em 28 de outubro de 2018 às 06h57.
Última atualização em 28 de outubro de 2018 às 10h45.
São Paulo - O sociólogo e cientista político Sérgio Abranches considerou que, com o crescimento das intenções de voto no candidato à Presidência da República Fernando Haddad (PT) , Jair Bolsonaro (PSL) ainda é favorito, mas "a tendência mudou". "Tem um ventinho soprando a favor de Haddad e contra Bolsonaro. Se vai se acelerar na boca da urna, não sabemos. Não dá para dizer que não é possível; possível é, mas pouco provável", disse.
Abranches lembrou que movimentos como esse já ocorreram no passado. Nas eleições presidenciais de 1989, o candidato Leonel Brizola estava na segunda posição da disputa no primeiro turno, à frente de Luiz Inácio Lula da Silva, mas Lula conseguiu ir para o segundo turno com Fernando Collor de Mello, recordou o cientista político. Em 2014, Marina Silva e Aécio Neves disputavam uma vaga para ir para o segundo turno com Dilma Rousseff. Marina era a favorita, porém, Aécio ultrapassou a adversária na votação. "Tudo indica que na boca da urna vai ser uma disputa muito mais apertada do que parecia e do que Bolsonaro previa", afirmou.
Independentemente do resultado da votação, Abranches considera que a disputa mais apertada é positivo para a democracia. "É muito diferente, do ponto de vista democrático, um presidente vencer uma eleição com 65%, 70% dos votos, ou ganhar 52%, 53%."
Para o sociólogo, as razões que fizeram Haddad subir nas pesquisas de intenção de voto são diferentes das que levaram Bolsonaro a cair. "Bolsonaro perdeu posições por conta do radicalismo institucional, pelo discurso mais violento na Avenida Paulista (quando disse que iria "varrer os bandidos vermelhos do Brasil...para fora ou para a cadeia"), que assustou o eleitor que não é apoiador fervoroso das ideias dele", disse. Já Haddad, segundo Abranches, se beneficiou porque "desavermelhou" sua campanha. "Se comparar fotos das manifestações dos últimos dias, tem muito pouca bandeira vermelha e mais a cor branca. Ele acertou um discurso mais de união para pegar os que não são petistas, mas são anti Bolsonaro."
O cientista político avaliou, além disso, que caso a Rede Globo tivesse concedido ao candidato do PT o direito de ser entrevistado nesta sexta-feira, em substituição ao debate presidencial (ao qual Jair Bolsonaro decidiu não ir), os resultados das pesquisas eventualmente poderiam ter sido diferentes. "Se o Haddad tivesse ido e sabido aproveitar, teria efeito nas pesquisas, porque é muita exposição. Mas teria de dizer alguma coisa para aquela parcela do eleitorado que cogita votar em você ou quer ver se tem razão em não voltar em você; são esses eleitores que se interessam por esse tipo de participação (em TV) no fim de corrida (eleitoral)", disse Abranches.
Quanto ao apoio do ex-presidente do STF Joaquim Barbosa ao candidato do PT, Abranches considerou que não há evidências de que apoios de última hora deem impulso a candidatos em uma campanha, mas ponderou que a declaração pode ter repercussão sobre o eleitorado. "Tem muita gente que preza o Joaquim Barbosa e quando ele diz que está com medo de votar em um candidato (Bolsonaro), isso pode ter efeito."
Já em relação ao fato de Ciro Gomes (PDT) ter optado por não declarar apoio a Haddad, Abranches minimizou os efeitos. "Minha suspeita é de que quem era de esquerda e votou no Ciro no primeiro turno, logo após o resultado se voltou ao Haddad imediatamente. O mesmo com a Marina", comentou. "O eleitor que o Ciro poderia influenciar é o que não é de esquerda, que talvez possa estar agregado ao Bolsonaro por falta de alternativa e que, se pensar melhor, poderia mudar. Mas são conjecturas", complementou.